Eis um fato notável a respeito do aquecimento global: a situação poderia estar duas vezes pior agora se não fosse pelo Protocolo de Montreal, um tratado negociado por um presidente conservador dos EUA.
O seu propósito é proteger a camada de ozônio situada na parte superior da atmosfera, que protege o planeta de níveis cancerígenos de radiação ultravioleta.
O Protocolo de Montreal é amplamente considerado o tratado ambiental mundial de maior sucesso. Ele incorpora princípios pragmáticos e favoráveis às empresas, que lhe permitiram operar sem problemas durante mais de duas décadas, atingindo seus objetivos alguns deles, ao menos com poucas controvérsias. O tratado pode ser ainda mais importante para limitar o aquecimento global do que pensávamos.
Em 1970, dois cientistas que trabalhavam juntos na Califórnia, Mario J. Molina e F. Sherwood Rowland, perceberam que uma série de produtos químicos industriais comumente usados representava um perigo assustador. Os clorofluorcarbonos, usados em geladeiras e aparelhos de ar condicionado e como propelentes em produtos como spray de cabelo, ficavam à deriva na parte superior da atmosfera, decompondo-se de modo a diluir a camada de ozônio.
Molina e Rowland, que mais tarde vieram a receber o prêmio Nobel, tinham descoberto uma emergência ambiental de proporções mundiais. Os produtos químicos ameaçavam a sociedade com um enorme aumento na incidência de câncer de pele, danos à agricultura e muitos outros problemas.
Seguiu-se uma batalha política complicada em torno da questão. Algumas das mesmas pessoas que hoje negam o aquecimento global receberam verba da indústria química para questionar a pesquisa. Mas o impressionante anúncio feito por cientistas britânicos em 1985 de que um verdadeiro buraco na camada de ozônio havia surgido sobre a Antártida mobilizou intensamente a imaginação do público de uma forma como poucas descobertas científicas conseguem fazer, aumentando as demandas de que algo fosse feito.
Talvez fosse de se esperar que Reagan, com seu gosto pela desregulamentação, iria se opor à ideia do tratado. No final, ele o apoiou vigorosamente.
Por quê? Uma das teorias é de que o próprio Reagan teve câncer de pele e deixou que uma preocupação com a saúde pública se sobrepusesse à ideologia. Eli Lehrer, líder de um grupo de pesquisa de Washington, propõe uma teoria mais simples: o ex-presidente realmente amava a natureza. Nada o fazia mais feliz do que montar cavalos e cortar madeira. Talvez o buraco na camada de ozônio simplesmente o preocupasse. Sabemos que ele preocupava Margaret Thatcher, primeira-ministra britânica, que tinha trabalhado anteriormente como pesquisadora na área química.
O Protocolo de Montreal entrou em vigor em 1 de janeiro de 1989 e, nos anos seguintes, foi usado para eliminar progressivamente cerca de 100 gases perigosos.
Eis uma das grandes coincidências do nosso tempo: muitas das substâncias que destroem a camada de ozônio também são gases de efeito estufa potentes.
Se a continuação da produção tivesse sido autorizada conforme mostra uma série de estudos científicos , é provável que o planeta estivesse se aquecendo muito mais rápido do que está. De fato, as evidências sugerem que o protocolo tem feito muito mais para limitar o aquecimento global do que o Protocolo de Kyoto o mais conhecido tratado já adotado com esse objetivo.
Os gases gradualmente eliminados por conta do Protocolo de Montreal estão sendo substituídos por outro conjunto de produtos químicos, os hidrofluorcarbonos, que estimulam significativamente o aquecimento global.
Preocupados com a possibilidade de pequenos países insulares ficarem submersos por conta do aquecimento global, os países ligados ao Protocolo de Montreal estão considerando uma emenda que eliminaria gradualmente os piores produtos químicos desse grupo.
Grandes países em desenvolvimento rejeitaram essa solução, já que têm importantes indústrias ligadas aos hidrofluorcarbonos. Mas a China agora é a favor dela, e o governo Obama está tentando convencer a Índia.
Durwood Zaelke, diretor de um grupo de defesa de Washington, tirou uma lição simples de tudo isso: por mais avassalador que o aquecimento global possa parecer, não somos impotentes diante dele.