Dois anos atrás, Catherine Duff, então com 57 anos, descreveu para um painel do governo em Washington, com emoção, o quanto sofreu com a infecção de Clostridium difficile, bactéria resistente a antibióticos; contou que só se recuperou após tratar a infecção gastrointestinal em casa com as fezes de seu marido, um liquidificador e um enema.
Mark B. Smith, jovem estudante de doutorado em Microbiologia, estava na plateia, quase tão emocionado quanto Catherine. Decidido a ajudar pacientes como ela, ele começou uma organização sem fins lucrativos chamada OpenBiome, o primeiro banco de fezes dos Estados Unidos, que distribui amostras fecais de doadores saudáveis para ajudar a curar pessoas infectadas com C. difficile.
Agora, a OpenBiome simplificou o processo chamado transplante de microbiota fecal. O banco criou uma cápsula contendo micróbios fecais que pode ser tomada como qualquer outra droga; é o cocô em pílula. “É um avanço óbvio”, disse Smith.
Tratamento
O C. difficile existe em meio a trilhões de outras bactérias em seres humanos normais e saudáveis. Quando os antibióticos aniquilam a concorrência, essa bactéria se espalha pelo intestino, produzindo toxinas e causando diarreia persistente. A doença atinge cerca de 450 mil americanos anualmente, matando 15 mil. A maioria contrai a infecção em hospitais e asilos.
Esses micróbios são cada vez mais resistentes aos antibióticos convencionais. Normalmente, o transplante fecal é o último recurso.
As fezes do doador são introduzidas no intestino ou no cólon de um paciente doente através de um enema, de colonoscopia ou sonda nasogástrica ou nasojejunal. As bactérias saudáveis parecem afastar a C. difficile e reestabelecem uma comunidade microbiana normal no intestino.
Mas os transplantes são caros, demorados e invasivos. “A primeira coisa que começamos a pensar foi que tínhamos de nos livrar da colonoscopia”, disse Smith.
Dois estudos mostraram que as cápsulas, congeladas e liofilizadas, eram eficazes no tratamento de C. difficile recorrente; porém, o problema era como produzi-las em grandes quantidades. “Ela precisa se manter viável. Tudo tem que ser feito em temperatura ambiente ou corporal”, disse Smith.
O ingrediente biológico ativo era o principal desafio. As cápsulas são normalmente projetadas para se dissolverem nas fezes; quando esse é seu conteúdo, as pílulas essencialmente se degradam de dentro para fora.
Após mais de um ano e meio, a OpenBiome finalmente desenvolveu invólucros feitos com uma emulsão microbiana que prende gotículas de células bacterianas em uma gordura aquosa. Como resultado, as pílulas se mantêm sólidas à temperatura ambiente e se dissolvem no intestino delgado superior.
Em um estudo piloto apresentado em uma reunião científica na Europa em outubro, os clínicos mostraram que engolir uma dose única de 30 cápsulas curou 70% dos pacientes infectados com C. difficile. Quando os pacientes restantes receberam uma segunda dose do tratamento, o índice de sucesso subiu para 94%.
Em estudos anteriores, por comparação, a microbiota fecal administrada através da colonoscopia provou ser 90% eficaz na cura de infecções do C. difficile; a eficiência dos antibióticos tende a ser menos de 40%.
Atualmente, o novo tratamento com 30 cápsulas custa US$ 635 e é vendido apenas para médicos. Os comprimidos não são aprovados pela FDA, mas a agência preferiu não tomar nenhuma atitude para proibi-lo por causa da falta de alternativas.
Riscos
Apesar da facilidade, engolir cápsulas cheias de fezes humanas pode ser arriscado. Se os micróbios intestinais, potenciais salva-vidas, chegarem aos pulmões, por exemplo, o tratamento pode ser fatal.
Alguns suspeitam que fezes humanas saudáveis possam nem ser necessárias. A empresa de biotecnologia Seres Therapeutics, em Cambridge, Massachusetts, realiza ensaios clínicos com o SER-109, um tratamento com quatro pílulas feitas de bactérias anaeróbicas formadoras de esporos que foram extraídas de fezes humanas doadas e tratadas com etanol.
De acordo com o Dr. Roger Pomerantz, executivo-chefe da Seres, a empresa também tem uma pílula de segunda geração que contém micro-organismos semelhantes cultivados sinteticamente em laboratório. Ele não vê futuro para os comprimidos contendo fezes reais.
“Não sei por que alguém faria isso. Não acredito que o futuro seja enviar fezes para todo o país”, disse ele. No momento, no entanto, essas novas formulações ainda estão em desenvolvimento e não há alternativa.
Smith e seus colegas dizem que as cápsulas ajudarão a expandir a pesquisa. Ensaios clínicos nos EUA e pelo mundo testam transplantes de microbiota fecal não apenas para combater o C. difficile, mas também outras doenças gastrointestinais.
A Dr. Jessica R. Allegretti, médica no Brigham e no Hospital da Mulher em Boston, faz testes com as cápsulas contra a doença de Crohn, a obesidade e a C. difficile primária.
“Elas realmente reduzem o tempo entre a avaliação e o procedimento, e isso, de fato, amplia o número de pessoas que pode receber o tratamento. Então, as cápsulas parecem ser um indício do que veremos no futuro, especialmente para distúrbios que parecem exigir vários tratamentos, ou doses de ‘manutenção’”, disse ela.
E acrescentou: “As cápsulas nos permitem continuar com os estudos e a terapia de manutenção em longo prazo, que é mais prática para esse tipo de doença crônica. Sem elas, não seríamos capazes de fazer este tipo de trabalho”.
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