Para uma das fotos de recordação de suas férias na cidade-balneário, dois turistas limparam o rosto de um amigo bêbado com um panfleto que anunciava drinks à vontade. Então, eles seguraram o corpo do companheiro embriagado entre eles, eternizando o momento com a câmera de um smartphone.
Ninguém prestou muita atenção à cena em Punta Ballena, faixa iluminada a néon com bares, boates, lanchonetes de kebab e lojas com nomes como Sorry Mom Tattoo [Tatuagens Desculpe Mamãe]. O desfile de passantes, no entanto, também não era a plateia desejada. Mais importante era impressionar os conhecidos que veriam a imagem no Facebook, Instagram ou Twitter, talvez transformando-a em uma postagem viral nas redes sociais.
Com fotos nus em Machu Picchu e filmagens de mergulhos arriscados em piscinas de hotéis, viajantes de todo o mundo têm se dedicado ao que as autoridades e especialistas em turismo descrevem como uma epidemia de narcisismo e rebeldia. O objetivo parece ser transformar polos de férias e locais históricos em cenários para vídeos e fotos pessoais.
Nos últimos meses, houve diversos casos em que turistas ofenderam sensibilidades locais —e causaram danos patrimoniais— enquanto tentavam se fotografar em um momento memorável.
O fenômeno levou autoridades de destinos turísticos populares da Espanha à Malásia a reagir e a considerar medidas severas para controlar comportamentos destrutivos. Entre elas, estão multar e prender visitantes rebeldes, limitar a presença de grupos de turistas e até publicar fotos dos malcomportados na tentativa de envergonhá-los em público.
No entanto, a atração dos “paus de selfie” e dos drones que tiram fotos é forte. “Antes bastava tirar fotos da torre Eiffel ou do monte Everest, mas agora não mais”, disse Jesse Fox, professora-assistente de comunicação na Universidade Estadual de Ohio, em Columbus. “Hoje os turistas têm de se colocar na foto. O principal sou ‘eu’, não o lugar visitado.” Esse narcisismo, disse ela, “resulta nesses comportamentos extremos e estúpidos”.
Em março, duas mulheres da Califórnia foram presas em Roma sob acusação de vandalismo, depois que rabiscaram iniciais em uma parede do Coliseu e tiraram uma foto. Em maio, dois turistas em Cremona, Itália, que tinham subido numa escultura em mármore do século 18 de Hércules para tirar uma selfie, acabaram fazendo com que uma coroa da escultura caísse e se quebrasse.
Alguns incidentes vão além do descuido e demonstram falta de respeito pelos costumes locais.
As autoridades da Malásia recentemente prenderam quatro turistas do Canadá, da Holanda e do Reino Unido durante três dias, sob a acusação de indecência em público, depois que eles tiraram fotos de si mesmos nus no monte Kinabalu, em Bornéu.
Neste mês, um vídeo no YouTube que mostra um turista perturbando uma sentinela no castelo de Windsor, perto de Londres, tornou-se viral. Quando o turista o tocou, o soldado virou seu rifle para ele e gritou: “Afaste-se do guarda da rainha!”.
Alguns atos podem ser autodestrutivos, como a proliferação do “balconing” —quando turistas embriagados saltam entre sacadas de hotel ou mergulham delas para a piscina, muitas vezes resultando em ferimentos ou morte.
As visitas de turistas internacionais atingiram o recorde de 1,13 bilhão no ano passado, segundo a Organização Mundial de Turismo. O crescimento foi estimulado em parte pelos voos com descontos promocionais e a crescente classe média em países como Brasil e China.
Os chineses foram os turistas que mais gastaram no ano passado, despendendo US$ 165 bilhões no exterior. No entanto, segundo autoridades, esses gastos deram a alguns viajantes a sensação de direito adquirido. Por isso, o governo chinês tomou a medida incomum neste ano de criar uma lista negra para bloquear os vistos de viagem a seus cidadãos mais ofensivos —entre eles, um passageiro que atirou água quente em uma comissária de bordo em uma discussão sobre assentos.
“Viajar hoje em dia é muito barato, e as pessoas pensam que podem fazer o que quiser em um mundo globalizado”, disse Mark Watson, da Tourism Concern, organização londrina que promove o turismo ético. “As férias não são mais uma ocasião para se envolver com culturas diferentes, e sim uma oportunidade de consumir álcool barato e se embriagar.”
Em Magaluf, onde o “turismo bêbado” saiu de controle, o prefeito quer recrutar policiais do Reino Unido para ajudar a controlar os turistas britânicos.
No ano passado, surgiu nas redes sociais o vídeo de um jogo entre turistas em um clube de Magaluf que dava um coquetel como prêmio por realizar sexo oral. “Foi muito ruim para nossa imagem”, disse Alfonso Rodríguez, prefeito de Calvià, que inclui Magaluf, sobre o clipe.
Nesta temporada, circulou um vídeo, feito na mesma região, de um anão seminu chicoteando um futuro noivo em sua festa de despedida de solteiro.
Ben Newberry, 26, do País de Gales, disse que ficou surpreso quando a polícia o parou por carregar um copo vazio. “Não estávamos causando nenhum problema”, disse Newberry, que passeava por Punta Ballena com um grupo de despedida de solteiro, vestido como uma senhora barbada com rendas e peruca grisalha. “É Magaluf, e Magaluf tem má reputação. Todo mundo só quer se divertir.”
Em Florença, na Itália, o prefeito Dario Nardella publicou uma advertência no Facebook em junho, depois que um visitante quebrou um dedo da escultura “O Rapto de Polyxena”, de Pio Fedi. Ainda assim, desde então, foram relatados casos de turistas que subiram em uma estátua de Dante Alighieri para tirar selfies e que urinaram na cúpula da catedral da cidade.
Nardella quer leis para punir os vândalos com penas de prisão severas. “Quem quer que ataque a cultura”, disse, “ataca o coração da história e a identidade de uma comunidade.”
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