Portão da fronteira de Habur, Turquia Transportar 23 toneladas de frango congelado para o Iraque é um trabalho rotineiro para Turfan Aydin, caminhoneiro turco que trabalha na rota há anos. Mas o comércio transfronteiriço só faltou parar depois da ofensiva rebelde no Iraque e do sequestro de 80 cidadãos turcos.
Anteriormente, essa fronteira ficava escancarada, quando a Turquia permitia o acesso dos líderes rebeldes aos campos de batalha na Síria em uma campanha para derrubar o Presidente Bashar Al-Assad. Mas isso possibilitou o desenvolvimento de um grupo militante sunita que lançou um ataque relâmpago no Iraque em junho, o Estado Islâmico do Iraque e da Síria, ou o ISIS.
"Há três anos, temos visto bandeiras do ISIS na Síria, e isso se deve à Turquia", Aydin declarou, observando os caminhões a caminho do Iraque em uma fila no horizonte. "A Turquia deixou que eles entrassem".
Agora, com a o fortalecimento do ISIS, o governo está pagando o preço pelo caos que ajudou a criar. "A queda de Mossul foi o epítome do fracasso da política estrangeira turca nos últimos quatro anos", afirmou Soli Ozel, professor de relações internacionais da Universidade Kadir Has, em Istanbul. "Não consigo dissociar o que aconteceu em Mossul do que aconteceu na Síria, e a política estrangeira turca em relação à Síria tem sido irrealista, arrogante, ideológica e teimosa".
Há anos, uma política de "problema zero com os vizinhos" ajudou a fazer da Turquia um exemplo admirável da democracia islâmica e do crescimento econômico. Ela se beneficiou com a abertura do mercado iraquiano, exportando 12 bilhões de dólares de mercadorias no ano passado. Esse número podere cair em 25 por cento, ou até mais, caso a luta se espalhe, segundo Atilla Yesilada, analista turco da GlobalSource Partners.
Essas perdas vieram após a guerra civil destruir a capacidade da Síria de comprar os produtos turcos e enviá-los a milhares de refugiados do outro lado da fronteira. A Turquia já gastou um bilhão e meio de dólares cuidado deles, sem nenhuma previsão de encerramento.
O conflito no Iraque é apenas mais um de uma série de percalços na política doméstica e externa do Premiê Recep Tayyip Erdogan e do seu Partido da Justiça e do Desenvolvimento, que está no poder. Atualmente, muitos por aqui culpam o governo por facilitar o surgimento dos extremistas na Síria.
Os líderes turcos expressaram preocupação com o surgimento de jihadistas perto de suas fronteiras, e afirmam que eles intensificaram os esforços para rastrear os extremistas. Porém, disseram pouco em relação ao aumento da militância no Iraque, e um dos porta-vozes do Ministério do Exterior se recusou a comentar sobre como isso afeta a política turca. Ultimamente, no entanto, Ancara tem dado algumas indicações de que está se ajustando às alterações em sua região.
Em junho, a Frente Nusra, afiliada síria da Al-Qaeda, foi classificada como uma organização terrorista. Recentemente, Erdogan solicitou às nações europeias que impedissem os jihadistas de viajar para a Turquia. E as autoridades turcas permaneceram em silêncio em relação à tomada da cidade iraquiana de Kirkuk pelas forças do Governo Regional do Curdistão, uma exibição de assertividade que teria provocado condenação instantânea há alguns anos.
O pior golpe do novo conflito no Iraque, no entanto, atingiu o lado sudoeste da Turquia, que mais ganhava com o comércio expandido e tem mais a perder se ele entrar em colapso.
Essa mudança está clara no Portão da Fronteira de Habur, que há apenas duas semanas enviava mais de 2.000 caminhões de mercadorias turcas para o Iraque por dia. Agora, menos da metade desse número faz a viagem por causa de uma queda na demanda e do risco de transportar mercadorias.
Realçando esse perigo temos o apuro de cerca de 80 cidadãos turcos que foram sequestrados pelo ISIS quando o grupo tomou Mossul. Entre eles, estão o cônsul-geral, três crianças e 31 caminhoneiros. Nenhum foi visto desde então.
Os sequestros horrorizaram as comunidades que dependem do comércio transfronteiriço. Doruklu, uma aldeia de 1.300 pessoas, tem quatro homens entre os prisioneiros. "Falamos disso dia e noite, mas não há muito que possamos fazer", disse Mehmet Turgut, que lidera as orações na mesquita da aldeia.
Os caminhoneiros conseguiram esconder alguns celulares e ocasionalmente ligam para acalmar os parentes, contam os familiares. Eles afirmam que não foram maltratados. As autoridades turcas disseram que trabalham para a libertação dos prisioneiros, porém, também proibiram a imprensa de cobrir o assunto.
O perigo ainda não dissuadiu a maioria dos caminhoneiros de ir para o Iraque. "Se as coisas estivessem funcionando como deveriam, não poderíamos nem mesmo sentar aqui e conversar", declarou Abdul Hafur, caminhoneiro de cabelo grisalho que disse ter levado uma semana fazendo ligações para conseguir uma carga para o Iraque.
Aydin, com sua carga de frango congelado, disse que devia 47.000 dólares por seu caminhão e tinha de pagar 2.700 dólares por mês. Contudo, o comércio havia diminuído tanto que já não tinha certeza de que ganharia o suficiente para o pagamento.
"Temos de ir para o Iraque", ele disse. "Não temos outra escolha".
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