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Análise estudou com ajuda de algoritmos 239 anos de documentos do Tribunal de Justiça de Londres, o Old Bailey | O arquivo nacional, via Tim Hitchcock
Análise estudou com ajuda de algoritmos 239 anos de documentos do Tribunal de Justiça de Londres, o Old Bailey| Foto: O arquivo nacional, via Tim Hitchcock

Em 1765, John Ward foi enforcado por roubar um relógio e um chapéu. Dois anos depois, Elizabeth Brownrigg foi mandada para a forca por torturar uma pequena órfã durante semanas, inclusive açoitando-a até que "o sangue jorrasse em torrentes das feridas", o que acabou por matá-la. Nessa época, a sociedade inglesa e seu sistema de justiça criminal não fazia distinção entre os crimes hediondos e os não violentos. Batedores de carteira e assassinos igualmente mereciam a pena de morte. Isso mudou apenas 60 anos depois. Um assassino podia ser executado ou exilado na Austrália, porém, um batedor de carteira provavelmente pagaria apenas uma multa. Os fundamentos para a pena capital haviam mudado.

Como isso aconteceu? De 1674 até 1913, os escrivões da corte britânica procediam descrições detalhadas de todos os julgamentos realizados no Tribunal Judicial Geral, conhecido como Old Bailey, onde todos os principais casos de crime da Grande Londres eram julgados. O arquivo contém 121 milhões de palavras descrevendo 197.000 julgamentos durante 239 anos. Os pesquisadores afirmam que esse é o registro impresso mais detalhado do discurso real do mundo. Os cientistas agora realizaram uma análise computacional dessas palavras mostrando como o sistema de justiça britânico criou novas práticas para controlar a violência. O estudo da publicação Proceedings of the National Academy of Sciences é uma colaboração de dois cientistas da computação, Simon DeDeo da Universidade de Indiana e Sara Klingenstein do Instituto Santa Fe no Novo México, e um historiador, Tim Hitchcock da Universidade de Sussex na Inglaterra.

Esse estudo demonstra "uma nova e importante maneira de fazer pesquisa histórica", declarou Brett Bobley, diretor de humanidades digitais da Fundação Nacional de Ciências Humanas em Washington. Os historiadores podem estudar as coleções com leituras de itens individuais, mas não conseguem ler uma biblioteca inteira; os computadores, segundo ele, fazem isso com facilidade. O arquivo de Old Bailey foi digitalizado há uma década em um banco de dados pesquisável no qual o nome dos réus está organizado por gênero, crime, local, o nome e o endereço da vítima, a decisão e as penas.

Essas informações, juntamente com as transcrições do julgamento, constituem um acervo tão vasto que ninguém consegue armazená-lo inteiro na mente – um problema clássico dos "megadados". Os computadores podem acessar palavras representadas como objetos matemáticos e submetidos a algoritmos, devolvendo padrões invisíveis ao cérebro humano.

Para encontrar padrões, os cientistas observaram quando e com que frequência certas palavras ocorriam. "Digamos que você entra em um julgamento em 1750 e escolha uma palavra", o dr. DeDeo disse. "Quanto você pode aprender sobre o assunto do julgamento? Se ouvir a palavra ‘chutar’, é possível associá-la com a violência, porém, não dá para ter certeza", ele declarou. "Contudo, por volta de 1850, se você ouvisse a palavra ‘chutar’, saberia muito o que a burocracia ia fazer. Com o passar do tempo, cada palavra carrega mais informações baseadas nos dados cumulativos dos julgamentos. ". Os pesquisadores recorreram à edição de 1911 do Roget’s Thesaurus, que classifica 26 mil palavras inglesas distintas em 1040 categorias numeradas chamadas de conjuntos de sinônimos. Por exemplo, matar é o número 361.

""Para cada palavra, temos um número correspondente a um significado", disse DeDeo, que pode ser modelado matematicamente. Uma descoberta central é a criminalização gradual da violência. Na primeira parte de 1700, a violência era considerada rotina, mas por volta de 1820, o sistema de justiça estava concentrado em conte-la. As transcrições de Old Bailey foram encerradas em 1913.

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