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Uma revolução na família real

O rei Salman, que assumiu o governo da Arábia Saudita em janeiro, está mudando a política do país. Operários se preparam para instalar seu retrato em Riad. | Tomas Munita/The New York Times
O rei Salman, que assumiu o governo da Arábia Saudita em janeiro, está mudando a política do país. Operários se preparam para instalar seu retrato em Riad. (Foto: Tomas Munita/The New York Times)

Durante grande parte da última década, as mudanças ocorreram lentamente nesse reino, se é que ocorreram. Rico em petróleo, foi governado por um monarca doente que se esforçava minimamente para manter o status quo, apoiando ditadores ao redor do Oriente Médio e dependendo do apoio de príncipes envelhecidos em seu território.

Porém, desde a morte de Abdullah, em janeiro, o novo rei, Salman, mais que depressa começou uma reforma nas leis internas e externas, agitando alianças com os EUA e as forças regionais que, durante décadas, foram símbolo da estabilidade do reino, abalando a família real saudita.

Salman, de 79 anos, passou a adotar uma política externa ativista, participando do conflito no Iêmen e reforçando o apoio aos rebeldes na Síria, enquanto posiciona seu país como defensor dos sunitas na região. Em alguns casos, permitiu alianças com os islamitas que convinham à política da nação.

Internamente também promoveu mudanças radicais, promovendo oficiais mais jovens, demitindo os que não mais se adequavam ao cargo e concedendo imensa autoridade ao filho inexperiente, o Príncipe Mohammed bin Salman, de 29 anos. Mostrou também que mantém relações estreitas com os religiosos conservadores, levantando dúvidas sobre o destino das reformas, ainda que limitadas, de seu antecessor.

“Agora, de repente, as mudanças viraram regra. O rei Salman não perdeu tempo em arregaçar as mangas e mostrar que a Arábia Saudita quer assumir o papel de líder da região”, explica Ford M. Fraker, ex-embassador norte-americano no reino.

Salman deveria ter participado de uma reunião de líderes do Golfo Pérsico, realizada recentemente com o presidente Barack Obama em Washington; em vez disso, mandou o príncipe Mohammed bin Nayef. A agência estatal Saudi Press disse que foi porque o encontro coincidia com o cessar-fogo no Iêmen, mas para alguns especialistas, a atitude é um sinal de desagrado pela política dos EUA em relação ao Irã.

As mudanças de Salman representam o esforço de um monarca absolutista para restabelecer a influência de seu país em uma região dividida por guerras civis – e também refletem a ressurgência do modelo de governo pré-Primavera Árabe, que enfatiza a centralização do poder.

O rei, porém, não fez nenhum movimento em relação à liberação social e/ou política.

Seu foco parece ser na segurança, em reação à influência cada vez maior do Irã, inimigo xiita do reino, e à ascensão de grupos radicais como o Estado Islâmico, também conhecido como EIIL. Além dos ataques aéreos no Iêmen, promoveu oficiais preocupados com a segurança, nomeando o sobrinho, Mohammed bin Nayef, de 55 anos – que como Ministro do Interior liderou uma iniciativa antiterrorismo – príncipe herdeiro.

Insuflando a mudança se destaca a frustração com os norte-americanos, há muito considerados seus aliados ocidentais mais próximos e garantidores de sua segurança. Os sauditas acusam o governo Obama de negligenciar seus aliados árabes e priorizar uma reaproximação com o Irã.

Durante os últimos anos de seu reinado, Abdullah, que morreu aos 90 anos, esteve doente, assim como seu ministro do Exterior, o príncipe Saud al-Faisal. Ambos se encontravam em tratamento médico enquanto a guerra na Síria se agravava, o Estado Islâmico se espalhava pela Síria e pelo Iraque e o Irã e seus aliados expandia sua influência. Salman atacou em março, depois que os rebeldes xiitas no Iêmen tomaram a capital e forçaram o presidente ao exílio, formando uma coalizão militar árabe para atacar os rebeldes, conhecidos como houthis.

“O povo vê essa atitude como algo positivo, pois há tempos queria um líder mais decidido”, afirma Awadh al-Badi, acadêmico e membro do Centro Rei Faisal para Pesquisas e Estudos Islâmicos, em Riad.

Analistas e diplomatas ocidentais, porém, dizem que há grandes riscos à intervenção. Os houthis parecem não ter intenção nenhuma de se retirar, as agências internacionais já alertam para uma crise humanitária e a facção da al-Qaeda no Iêmen vem ganhando terreno.

Outra mudança fundamental é que Salman parece ignorar a rejeição de seu antecessor a islamitas políticos como a Irmandade Muçulmana, considerada grande ameaça à ordem regional.

O que mais gera curiosidade, porém, é o tremendo poder que o rei concedeu ao filho, o príncipe Mohammed bin Salman. Entre suas funções, está a de Ministro da Defesa, chefe do Conselho Econômico e de Desenvolvimento, composto dos principais ministros, e chefe do Conselho Supremo da Saudi Aramco, a gigante estatal do petróleo.

“O que temos aí é um homem de 29 anos inexperiente, cujas qualidades como líder ainda não foram testadas e que é conhecido por sua impulsividade na tomada de decisões”, revela um diplomata que concordou em falar somente sob condição de anonimato.

Há quem especule que tamanha centralização do poder possa causar incômodo nos membros da família real que foram deixados de fora; outros afirmam que esses príncipes só têm a perder se a dinastia que os mantêm ricos lhes faltar.

“Eles têm o poder, eu tenho bilhões no banco. É mais interessante deixar tudo como está”, afirma o assessor de um dos príncipes, resumindo a posição da família.

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