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Tailleur rosa foi guardado com marcas de sangue de Kennedy morto em 1963 | Cecil Stoughton/Biblioteca e Museu Presidencial John F. Kennedy, Boston
Tailleur rosa foi guardado com marcas de sangue de Kennedy morto em 1963| Foto: Cecil Stoughton/Biblioteca e Museu Presidencial John F. Kennedy, Boston

No avião que a levava de volta a Washington, ainda usando o tailleur rosa manchado com o sangue do marido, Jackie Kennedy ignorou os pedidos e conselhos dos assessores para que se trocasse. E disse apenas: "Que eles vejam o que fizeram".

No entanto, durante os 50 anos desde o assassinato de John F. Kennedy em Dallas, em 22 de novembro de 1963, o símbolo mais famoso da tragédia, uma das roupas mais marcantes da história moderna, não foi visto por praticamente ninguém. Guardado numa sala com temperatura controlada no Arquivo Nacional, em Washington, teve sua exibição proibida pela família Kennedy — e não será visto por pelo menos mais 90 anos.

Se há um único objeto que simbolize a dor e a violência ocorridas naquele dia — e o glamour e as alegorias que as precederam — é o terninho rosa manchado de sangue de Jackie Kennedy, uma viúva famosa e sofisticada, além de seu fascínio e sua determinação, das coisas que sabemos sobre ela e daquelas com que nem sonhamos.

O fato de Jackie estar tão intimamente ligada a uma peça de roupa não é surpresa. Em seus quase três anos como primeira-dama, ela ganhou fama mundial graças ao seu estilo jovial. Politicamente, isso se traduziu em verdadeiras multidões toda vez que aparecia ao lado do presidente. A ironia é que, por se sentir vulnerável, usava a moda para se isolar do olhar inquiridor do público. Era sua armadura.

Por isso, mesmo naquele dia, antes do horror que se seguiu, quem olhava para Jackie era imediatamente atraído pelo tailleur rosa, cópia idêntica do Chanel clássico, em estilo cardigã, de lapela azul marinho. Ele foi feito pelo Chez Ninon, ateliê de Nova York que produziu grande parte de seu guarda-roupa, respeitando seu gosto pela simplicidade. Ela já o tinha usado pelo menos em outras seis ocasiões, incluindo uma visita a Londres, em 1962, e a recepção do primeiro-ministro da Argélia no mesmo ano.

Há 50 anos, sob o sol forte de Dallas, Clint Hill, agente do Serviço Secreto designado para protegê-la, achou que a roupa parecia fluorescente em contraste com o azul escuro do carro que levava o primeiro-casal.

"Ela se destacava demais no carro por causa da cor da roupa", ele comentou.

Hoje guardados no cofre, o tailleur rosa e os acessórios — incluindo a meia-calça também suja de sangue, dobrada numa toalha branca, o sapato, a bolsa e a blusa marinho — permanecem intactos desde aquele dia fatídico. Só ficaram faltando o chapéu da mesma cor e as luvas brancas, perdidos no caos.

Embora o Arquivo Nacional mantenha o traje desde 1964, ele pertence a Caroline Kennedy, sua herdeira legal. Assim, um termo de doação foi assinado em 2003, com a condição de que fosse exibido ao público somente em 2103. Martha Murphy, responsável pelo Acesso Especial do Arquivo, disse que as roupas de Jackie são os únicos itens na coleção do assassinato aos quais foram impostas restrições.

Ela informa também que a família nunca pediu que a roupa fosse lavada, embora a prática padrão evite a remoção de manchas de qualquer tipo, inclusive de sangue, para fins de preservação. E acrescenta que, com exceção desse detalhe, o conjunto parece novo.

Dada a visibilidade de Jackie, é compreensível que o tailleur permaneça escondido do público.

"Sem dúvida, ela compreendia o conceito de invisibilidade muito bem, assim como o da manutenção das aparências", explica o crítico cultural Wayne Koestenbaum, autor do livro "Jackie Under My Skin: Interpreting an Icon", "e por isso a roupa escondida é um detalhe ainda mais comovente, um símbolo incontestável de sua contradição".

Os curadores em geral não conseguem pensar em outra roupa histórica mais carregada de significados e, no entanto, suscetível demais para ser exibida. Entre as peças com peso semelhante estão o casaco usado por Napoleão quando foi morto, um sapato perdido de Maria Antonieta a caminho da guilhotina e o terno e a capa que Abraham Lincoln usava quando foi assassinado.

Para a maioria dos especialistas, exibi-lo hoje seria problemático. "Poderia gerar histeria se levado a público", avalia Phyllis Magidson, curadora de trajes e tecidos do Museu da Cidade de Nova York.

"The Death of a President", livro de William Manchester, conta que o presidente Kennedy mostrou um interesse incomum no que a mulher pretendia usar na viagem ao Texas, coisa que nunca tinha feito durante o casamento. De acordo com o escritor, ele disse a ela: "Use algo simples para mostrar aos texanos o que é bom gosto de verdade".

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