No início do ano passado o caçador australiano de cometas Robert H. McNaught viu algo fora de comum desde seu posto no Observatório Siding Spring.

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Como membro de uma equipe patrocinada pela Nasa, a agência espacial dos Estados Unidos, que vasculha os céus em busca de asteroides e cometas potencialmente perigosos, McNaught geralmente se concentra em objetos que orbitam o Sol no mesmo plano que os planetas. Mas, aproximando-se desde abaixo desse plano, estava um cometa que aparentemente se originou na nuvem de Oort, uma região primordial vasta que cerca o sistema solar.

O cometa já tinha passado bastante de Júpiter quando McNaught o avistou, mas ele e outros chamados modeladores de cometas puderam prever sua trajetória: ele parecia estar dirigido diretamente a Marte —e a alguns de seus equipamentos mais preciosos.

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As trajetórias de cometas são notoriamente mutáveis, e projeções mais recentes sugerem que o cometa, batizado de Siding Spring, tem pouca probabilidade de chocar-se com o planeta ou causar grande dano às duas sondas da Nasa que estão sobre sua superfície ou, ainda, aos cinco satélites de pesquisa que orbitam o planeta.

Em 19 de outubro, o cometa está previsto para passar a 130 mil quilômetros de distância de Marte —muito mais perto de Marte que qualquer cometa já chegou da Terra na história registrada.

A poeira, o vapor d’água e os gases expelidos por um cometa podem espalhar-se por dezenas de milhares de quilômetros; assim, o que se prevê é que a parte superior da atmosfera marciana receba uma chuva de dejetos do Siding Spring. Ondas de choque podem abalar a atmosfera.

As partículas de poeira podem ser minúsculas, mas, deslocando-se a 200 mil km/h, poderiam penetrar o casco de qualquer satélite.

"Essencialmente, atuariam como balas no espaço", disse Richard Zurek, do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa.

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Para ele, existe uma possibilidade pequena de o cometa se fragmentar quando se aproximar de Marte. As órbitas dos satélites foram modificadas para que estejam do outro lado do planeta quando chegar a ameaça maior da poeira.

Mas, de modo geral, os receios originais deram lugar a um clima de entusiasmo com as oportunidades científicas.

"Vamos poder acompanhar as reações do planeta à poeira, à água e ao choque", explicou James Green, da Nasa. "Os cometas exercem um papel enorme na transformação de planetas."

O cometa Siding Spring se formou durante os primórdios do sistema solar, de modo que é um cometa de "período longo", com órbita de milhões de anos. Acredita-se que seja o que especialistas em cometas chamam de cometa virgem —um que nunca chegou ao sistema solar interno. Com isso, seu núcleo gelado (a "bola de neve suja" no núcleo de um cometa) nunca se descongelou e foi reformado.

O Siding Spring vai passar perto de Marte um mês apenas após a chegada do orbitador mais recente da Nasa, o Maven, que possui instrumentos criados para estudar a atmosfera marciana e a liberação de vapor d’água e gases para o espaço.

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As implicações disso para os conhecimentos científicos sobre Marte são substanciais. A sonda Curiosity ampliou descobertas anteriores de que Marte foi mais quente e muito mais úmido muito tempo atrás. Mas a questão de como e quando o planeta perdeu essas condições potencialmente possibilitadoras de vida ainda continua em grande medida sem resposta.

Como as câmeras que orbitam Marte foram criadas para focalizar o planeta, não se espera que produzam as melhores imagens dos dejetos que vão voar ao seu lado. Esse papel provavelmente será desempenhado pelo Telescópio Espacial Hubble e por observatórios na Terra.

Mas uma câmera em órbita, a HiRise, tem uma chance de captar aquela que é vista como a parte mais importante e interessante do cometa: seu núcleo. Depois de modificar-se pouco ao longo de bilhões de anos, a bola de pó e gelo se aquece ao penetrar no sistema solar interno e emite uma imensa nuvem de material circundante conhecida como coma, seguida pela cauda comprida.

O que interessa especialmente aos cientistas é saber quais compostos orgânicos à base de carbono poderão ser detectados. A missão Stardust, da Nasa, até o cometa Wild 2 coletou amostras em 2006. Em laboratórios, cientistas encontraram na poeira interestelar não apenas compostos orgânicos, mas também quantidades pequenas de aminoácidos evoluídos.

O astrobiólogo Daniel P. Glavin, do Centro Goddard de Voos Espaciais, da Nasa, fez parte da equipe que encontrou os aminoácidos no Wild 2 e agora faz parte da equipe científica do Curiosity.

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"Não sabemos como a vida começa, mas sabemos que compostos orgânicos são necessários", ele disse. "E como eles aparecem? Talvez sejam formados na superfície de um planeta como a Terra ou talvez cheguem através de cometas como o Siding Spring."