O vídeo era inegavelmente bobo: um falso documentário de 20 minutos sobre uma escola de artes marciais fictícia de Dubai onde o grande mestre Saloom Snake treina os combatentes para atirar sandálias, atacar com a corda que ajuda a prender o turbante e pedir auxílio no Twitter para lutas que não acontecem.
Porém, as autoridades dos Emirados Árabes Unidos não se divertiram tanto assim.
Em abril, a polícia prendeu cinco homens que participaram do vídeo, incluindo um cidadão norte-americano, Shezanne Cassim, 29 anos, e os atirou na cadeia. O caso deixou perplexas as famílias dos réus, que dizem que o vídeo apenas tira sarro da juventude dos Emirados que imita filmes estrangeiros e videoclipes de rap.
Grupos de defesa dos direitos afirmam que o caso é um exemplo da extrema sensibilidade das monarquias do Golfo Pérsico ao poder da mídia social enquanto fórum do discurso crítico.
Provavelmente o caso vai envergonhar os Emirados Árabes Unidos num instante em que o país se anuncia como destino internacional da cultura.
No mês passado, Dubai foi escolhida sede da Feira Mundial de 2020. O xeique Mohammed bin Rashid al-Maktoum, soberano de Dubai, disse pelo Twitter que o evento "traria vida nova ao antigo papel do Oriente Médio como cadinho de culturas e da criatividade".
"O modelo de negócios de Dubai depende de sua capacidade de projetar uma imagem progressista e de estabilidade, e organizar exposições e festivais de cinema cabe direitinho nisso", disse Nicholas McGeehan, pesquisador para o Golfo Pérsico da Human Rights Watch. "Entretanto, casos do gênero enfraquecem seriamente essa imagem e a denunciam como nada mais que um artifício de relações públicas."
O caso somente veio a público há pouco tempo, depois que os familiares de Cassim decidiram que suas tentativas de circular pelo sistema judiciário do país tinham dado poucos resultados. Shervon, irmão de Cassim, passou praticamente três meses nos Emirados tentando assegurar a libertação do irmão.
Shervon Cassim afirmou que os pais emigraram de Sri Lanka para Dubai em 1976 porque ali era uma terra de oportunidades "onde se poderia ganhar uma fortuna".
A família se mudou para os Estados Unidos no começo deste século e se naturalizou. Contudo, Shezanne Cassim voltou a Dubai depois de se formar na Universidade de Minnesota, em 2006, informou o irmão. Três semanas antes da prisão, ele havia começado a trabalhar como consultor da PricewaterhouseCoopers.
Nas horas vagas, Cassim e os amigos faziam vídeos zombando da vida em Dubai. Eles mostram o irmão fazendo coisas que ele garante não serem feitas em Dubai, como mudar de pista para deixar motoristas apressados passarem e limpar a mesa no McDonalds.
Em outubro de 2012, o falso documentário sobre artes marciais foi publicado na internet. Em abril, a polícia deteve Cassim e mais quatro pessoas. Mais tarde eles foram julgados por violarem a segurança nacional.
Comentaristas dos Emirados, nenhum dos quais quis ter o nome citado, afirmaram que as autoridades não devem ter gostado do vídeo por apresentar um estereótipo da nação ou por terem pensado que o vídeo deixava a entender que o país tinha gangues. Um deles sugeriu que a polícia foi dura para impedir vídeos semelhantes.
O veredito do caso de Cassim era esperado em setembro, mas foi adiado várias vezes. Segundo a família, ele é mantido numa prisão no deserto nos arredores de Abu Dhabi e não teve autorização para um encontro a sós com o advogado.
"Nós ficamos felizes em ver o boom de Dubai e temos muito afeto pela cidade e seu povo, e mesmo assim as autoridades tratam meu irmão desse jeito", declarou Shervon Cassim.
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