A Assembleia Nacional da Nicarágua, o Parlamento do país controlado pelo regime sandinista, aprovou nesta sexta-feira (22) uma extensa reforma constitucional que reforça o controle do ditador Daniel Ortega e de sua esposa, Rosario Murillo, sobre os poderes do Estado.
A medida foi aprovada por unanimidade, no entanto, para entrar em vigor, ainda precisa passar por uma segunda aprovação em janeiro de 2025, quando a inicia a nova legislatura. Segundo a Constituição da Nicarágua, qualquer mudança na Carta Magna exige aprovação em duas legislaturas consecutivas. A primeira legislatura, que termina em dezembro deste ano, já aprovou a reforma.
A reforma amplia o “mandato presidencial” de cinco para seis anos, cria os cargos de copresidente, elimina a separação entre os poderes e estabelece a subordinação do Legislativo, Judiciário e órgãos eleitorais ao Executivo.
“A Presidência da República exerce a chefia de Estado e de Governo, coordenando todos os órgãos do poder”, descreve o texto aprovado.
Poder concentrado e sucessão dinástica
A reforma institui oficialmente o modelo de governo conjunto entre Ortega e Murillo, que passam a ser “copresidentes”, com poder de nomear vice-presidentes sem necessidade de eleição popular. Ela também impede a candidatura de pessoas consideradas "traidoras da pátria", termo utilizado pelo regime para desqualificar opositores que tiveram suas nacionalidades retiradas.
Em mais uma demonstração do controle exercido pelo regime, a bandeira do partido de Ortega, o Frente Sandinista de Liberação Nacional (FSLN), será, de acordo com a reforma, um símbolo nacional da Nicarágua.
Regulação de mídias e combate às "fake news"
Outra mudança é a inclusão de leis contra às “fake news" na Constituição. Desde 2020, o país aplica penas de até dez anos de prisão para quem for considerado culpado de propagar "notícias falsas" sob a chamada Lei de Ciberdelitos. No entanto, a reforma constitucional estabelece agora que “os meios de comunicação deverão garantir que não estejam submetidos a interesses estrangeiros e que não divulguem fake news”.
O regime também formalizou na reforma a criação da “Polícia Voluntária”, grupo paramilitar composto por militantes do sandinismo, que foi amplamente utilizado na repressão aos protestos populares de 2018, que deixaram mais de 300 mortos.
Críticas internas e internacionais
A reforma constitucional tem gerado forte repúdio de opositores exilados e da comunidade internacional. A Organização dos Estados Americanos (OEA) denunciou recentemente a medida como uma tentativa de "perpetuar o controle absoluto de Ortega sobre o Estado". Segundo a entidade, as alterações reforçam a centralização do poder e limitam ainda mais os direitos dos cidadãos nicaraguenses.
“O documento de ‘reforma’ é ilegítimo em forma e conteúdo, constitui apenas uma maneira aberrante de institucionalização da ditadura matrimonial no país centro-americano e é um ataque definitivo ao Estado democrático de direito”, disse a OEA em um comunicado divulgado na quarta-feira (20).
Por outro lado, exilados classificaram a reforma como um passo definitivo para institucionalizar a ditadura e impedir qualquer possibilidade de alternância de poder.
Daniel Ortega, de 79 anos, está no poder na Nicarágua desde 2007 e tem consolidado nos últimos anos seu regime autoritário, utilizando leis e reformas para perseguir e torturar adversários e silenciar a imprensa. A nova reforma constitucional simboliza a completa eliminação de freios e contrapesos, permitindo que Ortega e Murillo mantenham o controle irrestrito sobre o país.