De um lado, uma ditadura atrás de lucro fácil e alternativas para aliviar a situação econômica caótica que ela mesma criou. Do outro, outra ditadura, faminta por recursos que o outro lado pode e quer oferecer.
Aliados, os regimes autoritários da Nicarágua e da China estão intensificando uma nova frente de parceria: as concessões de mineração.
No final de maio, o jornal Confidencial publicou um relatório que apontou que em um intervalo de apenas seis meses, entre outubro de 2023 e abril deste ano, três empresas chinesas foram contempladas com 13 concessões de mineração no país centro-americano.
Esses lotes equivalem a quase 12% da área total concedida para esse tipo de exploração em território nicaraguense.
Evidenciando o clima de camaradagem, essas concessões – todas com vigência de 25 anos – foram aprovadas em ritmo acelerado, entre apenas dois e oito meses após serem solicitadas, e empresas chinesas ainda aguardam resposta para outros três pedidos para explorar áreas para mineração.
Além de render dinheiro para o bolso da ditadura de Daniel Ortega, essa parceria também ajuda a Nicarágua a driblar sanções internacionais.
A Zhong Fu Development assumiu uma concessão da nicaraguense Compañía Minera Internacional (Comintsa), pouco antes desta se tornar alvo em maio de sanções do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, que a acusou de ser “afiliada” ao regime sandinista e estar envolvida em “operações corruptas”.
Em entrevista ao Confidencial, o presidente da ONG Fundación del Río, Amaru Ruíz, disse que a atuação chinesa pode aumentar ainda mais a degradação ambiental e social em áreas mineiras da Nicarágua.
“No caso da China, é historicamente conhecido que os seus padrões ambientais e trabalhistas são muito baixos. Isso aumenta a preocupação sobre o impacto que podem causar ao meio ambiente e também às pessoas que participam destes empreendimentos”, alertou Ruiz.
Durante audiência pública realizada em novembro do ano passado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), a Fundación del Río denunciou que 23% do território da Nicarágua estava ocupado por concessões de mineração, muitas delas com operações ilegais.
Na ocasião, Ruíz disse que a ditadura sandinista promoveu uma verdadeira onda de concessões desde que Daniel Ortega voltou ao poder, em 2007: desse ano até a data da audiência, haviam sido 114 concessões.
Ruíz relatou que 79 delas estavam localizadas em Bosawás, a segunda maior floresta tropical das Américas, atrás apenas da Amazônia.
Na Reserva Florestal Indio Maíz, localizada no sudeste do país e a segunda maior da Nicarágua, também há locais de mineração, “apesar de a extração de metais ser proibida em ambas as reservas”, disse o presidente da Fundación del Río. Ruíz relatou que 30% do ouro nicaraguense era extraído ilegalmente.
A China tem aumentado de forma agressiva suas reservas do metal, com os objetivos prováveis de reduzir a exposição ao dólar e de se precaver contra prováveis sanções do Ocidente quando invadir Taiwan.
Entre 2019 e 2023, as exportações totais de ouro da Nicarágua cresceram 226,5%, segundo dados do Banco Central. A julgar pela gula chinesa, a chuva de dinheiro nos cofres de Ortega não deve parar tão cedo.
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