O encerramento das negociações para o acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia, no final de junho, foi um ponto para o presidente da Argentina, Mauricio Macri, que está em plena campanha para as eleições presidenciais em outubro. O pacto comercial com o bloco europeu tem sido uma obsessão de sua política externa desde sua eleição em 2015.
O tratado, que abrange bens, serviços, investimentos e compras governamentais, vinha sendo discutido havia duas décadas por europeus e sul-americanos e ainda precisa ser ratificado pelo Parlamento Europeu.
O fechamento do acordo deve impactar a corrida presidencial no país vizinho. Para Vinícius Vieira, professor de Relações Internacionais da USP, o esforço de Brasil e Argentina, as principais economias do Mercosul, indica a estratégia dos dois governos. "Os governos do Brasil e da Argentina veem o acordo como uma estratégia possível para sinalizar aos eleitores mais liberais que esses governos estão mais comprometidos em integrar ainda mais essas economias que estiveram fechadas no período mais à esquerda", disse Vieira à Gazeta do Povo.
Dessa forma, com o acordo, Macri entrega algo concreto em uma área em que prometeu mais ênfase: a liberalização da economia. "Nada melhor para exportadores do que conquistar acesso ao maior mercado do mundo - pelo menos do mundo capitalista", disse Vieira.
Para Pia Riggirozzi, professora de Política Global na Universidade de Southampton (Reino Unido), o acordo destaca a perspectiva diplomática de Macri: “inserção em mercados globais, cooperação regional baseada em comércio, atrair investidores, retomar relacionamento com instituições financeiras multilaterais”.
Riggirozzi acredita, no entanto, que o sucesso do acordo econômico não deve garantir a vitória da chapa de Macri. “Nesse contexto, qualquer sucesso que se alcance na política externa não resolverá os principais problemas econômicos que deterioram variáveis socioeconômicas: desemprego, pobreza, inflação. Esse inédito acordo inter-regional bilateral não fornecerá capital político suficiente para derrotar a fórmula Fernández-Fernández. A política econômica do dia a dia acontece em La Matanza, e não em Bruxelas”, disse ela à Gazeta do Povo.
Quando foi eleito em 2015, Macri prometia recuperar a economia da Argentina, mas vê a inflação disparar, o crescimento estagnar e enfrenta protestos da população.
A disputa na Argentina será acirrada entre os principais pré-candidatos: além da chapa de Maurício Macri com o peronista Miguel Ángel Pichetto, o candidato Alberto Fernández, que tem em sua chapa a ex-presidente Cristina Kirchner como candidata à vice.
A escolha de Pichetto como companheiro na chapa de Macri indica a estratégia do atual presidente de se aproximar do peronismo moderado. "Os peronistas, via de regra, são mais centristas do ponto de vista do comércio, e talvez mais céticos em relação a esse acordo".
Ao mesmo tempo em que o novo acordo satisfaz a base rural agrícola, as pessoas ligadas ao agronegócio, ele também satisfaz habitantes de áreas urbanas que não estão ligados diretamente a esse setor, mas que veem a possibilidade de acesso a bens melhores, produzidos na Europa. "Satisfazer o consumo da classe média costuma ser uma estratégia que leva políticos da esquerda e da direita a ter sucesso nas urnas", disse Vieira. Mas, para ele, o acordo não deve atrair os segmentos peronistas, "principalmente a base kirchnerista, que é protecionista e vê isso como entreguismo - como a esquerda latino-americana em geral, inclusive a esquerda brasileira".