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Estados Unidos

O “caso Cho” e a cultura da violência

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Nova Iorque – Depois que as imagens enviadas por Cho Seung-hui à rede NBC levaram o professor Paul Harris, da Virginia Tech, a alertar a polícia sobre a possibilidade de o assassino ter se inspirado no filme sul-coreano "Old Boy", de Chan-woo Park, uma nova linha de interpretação começou a ser debatida pela mídia americana. Familiares das vítimas protestaram contra a exaustiva exibição de imagens do assassino e levaram emissoras a discutir a influência da cultura da violência sobre a mente de jovens com distúrbios de comportamento e potencial para desenvolver uma perigosa mistura de narcisismo, paranóia, misoginia e homofobia – que poderia levar a episódios como o massacre de Virginia Tech.

O assassinato em massa é tema cada vez mais comum no cinema, na ficção ou no documentário, sobretudo em Hollywood. A matança em Columbine foi assunto do cineasta Michael Moore, que tenta encontrar as razões do massacre na cultura do medo nos EUA e de "Elefante", de Gus Van Sant, que deixa propositadamente a tragédia sem explicação.

Mas será que o destaque na mídia e no cinema transforma assassinos em heróis para mentes já perturbadas, numa sociedade altamente competitiva? A psicóloga Susan Lipkins, especialista em violência escolar, acha que é preciso separar o que é doença mental do que é um dramático problema social americano.

"Cho tinha perdido o contato com a realidade, transtornado pela esquizofrenia paranóica. O massacre foi friamente planejado. Fica claro que ele precisava de intervenção psiquiátrica imediata. Mas isto não pode nos levar a marginalizar qualquer estudante solitário ou discriminar doentes mentais. Temos a oportunidade de discutir temas como a cultura da violência nos EUA. A explosiva mistura de humilhação e concorrência transforma as escolas num inferno para muitos estudantes ", diz.

O protagonista de "Elefante", aliás, ficou famoso por dizer: "A escola é um inferno. Todos os dias você acorda e vai para o inferno." Joseph Gasper, professor de sociologia da Universidade Johns Hopkins, acha que reduzir o debate ao distúrbio mental de Cho torna difícil saber como prevenir novos assassinatos em massa nas escolas americanas.

"Focar apenas na doença mental de um indivíduo é evitar discutir os muitos fatores sociais em jogo neste tipo de crime nos EUA", diz Gasper. "Fatores como a marginalização dos imigrantes, a glorificação da violência, sobretudo na mídia, o acesso fácil a armas e provas de masculinidade como ritos de passagem precisam ser examinados", acrescenta.

A socióloga Peggy Giordano, responsável por uma pesquisa sobre violência no ensino médio e superior nos EUA, diz que o sistema educacional americano tem "mais fatores sociais de risco".

"A cultura americana é profundamente individualista e, entre os estudantes, os ritos de passagem para provar masculinidade são muito cruéis. Tornar-se homem nos EUA é diferente de provar coragem e força noutras sociedades. Para os americanos, a competição é fundamental e as falhas têm um peso muito maior, são publicamente humilhantes", afirma Peggy.

Ela acha que o sentimento de humilhação é a chave para compreender por que os personagens de filmes violentos são alvo de uma tremenda admiração e identificação entre estudantes. Mas o fato de se transformarem em mártires em mentes perturbadas como a de Cho Seung-hui é um passo muito além do que é capaz a extensa maioria dos espectadores.

"Para a maioria dos espectadores, a violência no cinema pode levar à crítica e ao distanciamento daquele universo, mas em mentes perturbadas como a de Cho se transformam em heróis martirizados. O problema é: não se pode cair na defesa da censura no cinema por causa de três ou quatro psicopatas. Temos de ser capazes de encarar o horror, debater e encontrar saídas."

Cineastas americanos já começaram a protestar contra aqueles que querem pôr a culpa dos atos de Cho no cinema. O diretor americano Bob Cesca escreveu ao Huffington Post, um dos mais populares blogs nos EUA, para dizer que a conexão entre Cho e "Old Boy" era a "hipótese mais ridícula já aventada para explicar o massacre".

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