Planejamento familiar
Política de filho único encoraja abusos
A política de planejamento familiar da China, uma das mais severas do mundo, proíbe o confisco de crianças de pais que excederam as cotas de nascimento e os abusos vistos em Shaoyang agora já são bem menos comuns. Ainda assim, os críticos argumentam que os poderes concedidos aos agentes locais sob as normas do planejamento familiar continuam excessivos e propícios à exploração.
"O grande problema é que a política do filho único é radical e encorajou os agentes locais a agirem de forma desumana", disse Wang Feng, membro da Brookings Institution que dirige o Centro de Políticas Públicas Brookings- Tsinghua, em Pequim.
O escândalo também deu fôlego às dúvidas sobre se as crianças chinesas adotadas por americanos e outros estrangeiros eram falsamente descritas como abandonadas ou órfãs. Pelo menos uma agência de adoção americana organizava adoções do orfanato controlado pelo governo em Shaoyang.
US$ 5,4 mil
Lillian Zhang, diretora da China Adoption With Love, sediada em Boston, disse por telefone em julho que a agência encontrou pais adotivos em 2006 para seis crianças de Shaoyang todas meninas e rebatizadas Shao, por causa da cidade. De acordo com ela, as autoridades chinesas certificaram em todos os casos que a criança estava qualificada para adoção e sua agência não pode investigar de forma independente sem um pedido específico baseado em provas. Pais estrangeiros que adotam uma criança devem doar cerca de US$ 5,4 mil ao orfanato.
Relatos de agentes de planejamento familiar roubando crianças, batendo em pais, esterilizando mulheres à força e destruindo casas de famílias espalharam um terror silencioso em partes do condado de Longhui na primeira metade da década passada. As vítimas daquele terror permanecem cheias de mágoa e raiva anos depois.
Pequim - Muitos pais e avós da região montanhosa de arroz em terraços e plantações de batata-doce da China já estão acostumados a agarrar os bebês e escondê-los num local seguro sempre que surgem os agentes de planejamento familiar. Segundo eles, muitas crianças foram roubadas pelos funcionários e nunca mais vistas.
Mas Yuan Xinquan foi pego de surpresa numa manhã de dezembro de 2005. Então um jovem pai de 19 anos, ele estava segurando a filha de 52 dias num ponto de ônibus quando meia dúzia de homens desceu de um furgão branco do governo exigindo sua certidão de casamento.
Yuan não tinha, mas ele e a mãe de sua filha ainda não haviam atingido a idade legal para casarem.
Ele também não tinha os 6 mil yuans, então cerca de US$ 745, exigidos dele se quisesse ficar com a filha. O pai foi deixado com uma sacola plástica segurando as roupas do bebê e leite em pó.
"Eles são piratas", Yuan disse durante uma entrevista em julho na sua casa, a meia hora de caminhada por um caminho estreito na montanha entre arrozais em terraços.
Quase seis anos depois, ele afirmou ainda querer entregar uma mensagem à filha: "Por favor, volte logo para casa".
Sua filha estava entre as pelo menos 16 crianças tomadas por agentes do programa de planejamento familiar entre 1999 e fins de 2006 no condado de Longhui, uma zona rural empobrecida em Hunan, província no sul da China, segundo acusações de pais, avós e outros moradores entrevistados em julho.
O sequestro de crianças continua sendo um problema na China, onde uma antiga preferência por meninos junto ao controle severo do número de nascimentos ajudou a criar um lucrativo mercado negro de crianças.
Há pouco tempo, a polícia anunciou ter resgatado 89 bebês de traficantes de crianças e o subdiretor do Ministério de Segurança Pública atacou a prática de "comprar e vender crianças neste país".
Porém, os pais de Longhui dizem que no caso deles, autoridades do governo local tratavam os bebês como fonte de renda, rotineiramente impondo multas de US$ 1 mil ou mais cinco vezes ou mais a renda familiar anual na região.
Se os pais não pudessem pagar as multas, os bebês eram ilegalmente tomados das famílias e geralmente oferecidos para a adoção por estrangeiros, outra grande fonte de renda.
De acordo com os pais, a prática em Longhui chegou ao fim em 2006 somente depois que um menino de oito meses caiu da sacada do segundo andar da casa de um agente local de planejamento familiar enquanto os funcionários tentavam arrancá-lo dos braços da mãe.
Apesar de alguns novos relatos fora da China continental sobre sequestros aprovados pelo governo em Longhui e outras regiões, a imprensa chinesa, controlada pelo estado, ignorou ou suprimiu as notícias até maio quando a Caixin, intrépida revista conhecida por investigações corajosas, noticiou os sequestros e pediu um inquérito oficial.
Encobrir
Zeng Dingbao, que chefia a Agência de Inspeção em Shaoyang, cidade que administra o condado de Longhui, prometeu uma investigação diligente, mas os sinais apontam para uma tentativa de encobrir os fatos. Em junho, ele declarou à versão on-line do Diário do Povo, órgão oficial do Partido Comunista, que a situação "não é bem como a imprensa noticiou, com crianças sendo vendidas e compradas".
Segundo os pais, em vez de ajudar a localizar e recuperar as crianças roubadas, as autoridades punem quem falar. Dois dos pais que mais se manifestaram ficaram detidos por 15 dias em Shaoyang, acusados de solicitar prostitutas num bordel. Soltos em julho, os dois homens, Yang Libing, 47 anos, e Zhou Yinghe, 34 anos, disseram que foi uma cilada.
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