A violência provocada pelo crime organizado tem incendiado diferentes países da América Latina nos últimos anos, com destaque recente para o Equador, que enfrenta uma grave crise na Segurança Pública, iniciada após a fuga de um líder de facção de um presídio, no final de semana.
Não muito tempo atrás, o país era considerado um dos mais seguros das Américas, com uma taxa de homicídios de apenas 5 por 100.000 habitantes, segundo dados oficiais de 2017. Esse índice disparou em 2022, chegando a 25,5 assassinatos por 100 mil habitantes, e no ano passado, a 44,9 por 100 mil habitantes.
O mesmo cenário era visto há poucos anos em El Salvador, uma pequena nação localizada na América Central dominada pelo tráfico de drogas e ações de criminosos, que em 2015 era classificado como o país mais perigoso do mundo, com uma taxa de homicídio que chegava a 106,3 homicídios para cada 100 mil habitantes. Essa realidade mudou drasticamente após a chegada do presidente Nayib Bukele, em 2019, que decretou estado de emergência nacional e iniciou uma luta ferrenha contra as gangues.
As medidas emplacadas por Bukele envolvem, principalmente, mudanças na legislação federal e maior liberdade de atuação da forças militares. A primeira grande ação de seu governo contra o crime organizado surgiu em 2022, após um massacre liderado por uma organização criminosa, que resultou na morte de 87 pessoas. Com isso, o líder salvadorenho decretou um estado de exceção, suspendendo direitos constitucionais dos cidadãos, medida esta que segue em vigor e tem previsão de durar, no mínimo, até março deste ano.
O índice de homicídio desabou para 7,8 homicídios por 100 mil habitantes, no mesmo ano. Já em 2023, essa taxa chegou a apenas 1,7 homicídio por 100 mil, segundo estatísticas oficiais.
A principal medida elaborada pelo chefe de Estado foi a construção do maior presídio do continente americano, com capacidade para receber até 40 mil detentos: o Centro de Confinamento do Terrorismo (Cecot). De acordo com informações do Ministério da Infraestrutura de El Salvador, a prisão é destinada a líderes de facções criminosas como a Barrio 18 e Mara Salvatrucha (MS-13), as maiores que atuam no país.
No ano passado, quando o centro prisional completou seis meses, o ministro Gustavo Villatoro afirmou que o objetivo da megaprisão não era apenas receber membros dessas organizações ilegais, mas mantê-los confinados para que não retornassem ao convívio externo e colocassem a segurança da população em risco.
Desde então, o pequeno país restringiu diversos direitos constitucionais, entre eles os de defesa e liberdade de associação e circulação, iniciando uma série de operações policiais que prenderam milhares de criminosos em todo o território nacional. Estima-se que a polícia de El Salvador já encarcerou cerca de 70 mil pessoas durante o estado de exceção. Os últimos números divulgados pelo governo dão conta de 68.294 presos.
Com a mudança de perspectiva, a nação salvadorenha atraiu grandes investidores estrangeiros, como a JPMorgan, que criaram interesse por títulos do país; também deu uma guinada no turismo, que em 2023 registrou mais de 30% de crescimento, em comparação ao ano anterior, com um total de 3,2 milhões de visitantes; e transformou sua capital, São Salvador, e outras regiões antes tomadas pelo crime, em locais seguros para a população.
Essa nova realidade observada no país centro-americano elevou a confiança da população no governo e serviu de inspiração para outros governos na América Latina, que sofrem as mesmas consequências do domínio do crime organizado, como é o caso do Equador, o mais recente país em crise de Segurança Pública.
Daniel Noboa, o novo presidente equatoriano, que venceu as eleições gerais do país em novembro do ano passado, é um desses líderes que se espelham em Bukele. Ele foi eleito sob a promessa de adotar medidas mais duras para enfrentar a violência e as facções criminosas que afundam o país.
Seu plano Fênix, defendido desde a campanha eleitoral, visa promover a construção de novas prisões de segurança máxima, parecidas com o Cecot. A proposta de edificação dos centros prisionais contam, inclusive, com o planejamento da mesma empresa que trabalhou no país centro-americano durante 2022.
Mais além, Noboa defende a militarização das fronteiras com países reconhecidamente controlados pelo crime organizado, como a Colômbia, que no primeiro semestre do ano passado registrou um recorde de 52 massacres envolvendo organizações ligadas ao narcotráfico, segundo apontou um relatório da ONU.
Um de seus projetos envolve a criação de um serviço de inteligência de forma conjunta entre as Forças Armadas e a Polícia, com investimentos que ultrapassam os US$ 800 milhões (R$ 3,8 bilhões) para vigilância de fronteiras, região portuária, proteção de bairros e controle de estradas.
O novo governo do Equador também idealizou a criação de prisões flutuantes, destinadas a manter presos ligados a facções criminosas do país a cerca de 130 quilômetros da costa. Noboa afirmou em um de seus pronunciamentos que já adquiriu três embarcações para colocar em marcha essa nova política.
No início do mês, antes da onda de violência, Noboa chegou a anunciar um referendo que já está em posse do Tribunal Constitucional, em busca de apoio da população para desenvolver medidas como a ampliação de penas de prisão por delitos graves, como homicídio e o tráfico de armas, e a permissão para que o Exército erradique do país os grupos criminosos internacionais que aterrorizam as cidades e as instituições.
“Esta consulta [o referendo] tem três claros objetivos: a intervenção das Forças Armadas na luta contra o crime, o apoio do sistema de justiça para que os condenados do crime organizado tenham penas mais altas e a promoção do emprego através de novas contratações e de novas atividades econômicas”, disse o mandatário em entrevista para uma rádio local.
Agora, com a fuga de lideranças das facções dos presídios e os ataques que estão fazendo vítimas nas ruas de todo o país, o governo decretou um estado de exceção e "conflito interno armado" no país, que autoriza a ação conjunta das Forças Armadas e da polícia contra a criminalidade e no controle dos presídios.
Deixe sua opinião