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Entrevista

O Mercosul não é sequer uma área de livre comércio

O pesquisador do Programa de Estudos de América Latina e Caribe da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Proealc/UERJ), Lier Pires Ferreira, considera que o Mercosul não está funcionando e aponta as principais razões. Ele conversou com a reportagem da Gazeta do Povo por telefone. Ferreira também é doutor em Direito Internacional pela UERJ.

Você acha que o Mercosul está atingindo os objetivos propostos quando foi criado?

O Mercosul quer ser uma mercado comum, pressupõe a livre circulação de bens, produtos e serviços, uma tarifa externa comum e a livre circulação de fatores de produção, entre os quais, pessoas que circulem livremente para trabalhar nos países membros do Mercosul. Nós não conseguimos nem sequer uma área de livre comércio, porque as listas de exceção somam mais de 2 mil produtos. Não conseguimos ter uma tarifa externa comum porque essa tarifa oscila com várias alíquotas diferentes. Os países internos do Mercosul brigam o tempo todo porque um está se beneficiando mais do comércio recíproco que o outro, e impõem barreiras unilaterais para compensar essas supostas perdas, sejam elas reais ou tenham caráter político retórico. Temos, na verdade, uma esquizofrenia. O Mercosul pressuporia instâncias supranacionais de poder, mas a estrutura organizacional do acordo, baseada no Conselho do Mercado Comum, estipula apenas a existência de organismos intergovernamentais; por isso que o Mercosul, na sua essência, não funciona.

A criação da Comunidade dos Estados Latinoamericanos e Caribenhos (Celac) pode substituir o Mercosul de alguma maneira?

Sou muito cético em relação ao conjunto amplo de organizações que vão sendo criadas. Uma das questões fundamentais é a gente se perguntar: Pra que serve esse amplo conjunto de blocos e organizações regionais? A Celac me parece uma figura muito mais de retórica, é um bloco que está em aberto, em processo de formação. Não tenho nenhuma convicção prática de que vai ser capaz de promover uma agenda política e econômica efetiva, capaz mesmo de integrar os países da região, em particular as duas grandes economias latino-americanas, que são Brasil, no eixo Sul, e México, no eixo Norte.

Quais serão as consequências da provável entrada da Venezuela no Mercosul?

É um problema pelo fato de Hugo Chávez ser altamente polêmico. Esse caráter personalista e populista dele causa certo temor e desconforto em outros países da região, inclusive no Brasil. Outra questão é que, em função do discurso antiamericano, Chávez seria um elemento desagregador da política latino-americana com relação aos EUA e a outros países do mundo. Mas a gente não pode esquecer que a Venezuela é um dos grandes produtores de petróleo do mundo. Do ponto de vista estratégico, os países do Mercosul teriam acesso privilegiado a uma "inesgotável" fonte de energia. E do ponto de vista econômico, a relação bilateral de Brasil e Venezuela é muito boa. Como os venezuelanos têm grande riqueza petrolífera, quase não produzem internamente bens, produtos e serviços. O Brasil é o segundo maior parceiro comercial da Venezuela depois dos EUA.

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