Quando os resultados começaram a ser anunciados nos 650 distritos eleitorais britânicos nas eleições de quinta-feira, houve um momento de espetacular simbolismo. O líder trabalhista Jeremy Corbyn estava conversando com seus apoiadores em Londres, culpando a todos menos a si próprio pela derrota esmagadora de seu lado, enquanto as telas de televisão revelavam que seu partido havia perdido outro assento nas áreas industriais do norte. Em Sedgefield, que no passado foi a base de Tony Blair, cuja mensagem centrista triunfou três vezes na virada do século.
Esse momento mostrou a escala sísmica do abalo eleitoral. Sedgefield, uma antiga área de mineração de carvão no Condado de Durham, votou fielmente nos trabalhistas em todas as eleições desde antes da Segunda Guerra Mundial. Mas apoiou a saída da União Europeia no referendo do Brexit há três anos, como muitas comunidades que passavam por dificuldades - um claro sinal de indignação contra a classe política que, segundo eles, ignorava seus problemas. Portanto, esse tijolo no "muro vermelho" dos redutos eleitorais do Partido Trabalhista foi um alvo dos conservadores, liderados pelo primeiro-ministro Boris Johnson.
Esses resultados são extraordinários. Eles devem ser examinados cuidadosamente pelos democratas antes das eleições de 2020 nos Estados Unidos. Corbyn, um veterano esquerdista como o americano Bernie Sanders, ofereceu ao eleitorado uma forma requentada de socialismo. Ele se proclamou o herói dos trabalhadores oprimidos e contestou o capitalismo, abraçou as políticas de identidade e apresentou uma plataforma de incontinência fiscal sem precedentes. No entanto, ele foi firmemente rejeitado pelos eleitores, que apoiaram um conservador da elite visto por muitos como um bufão não confiável.
Uma consequência da incompetência de Corbyn é que o Reino Unido agora deixará a União Europeia no início do próximo ano. Isso pode ter consequências negativas para muitas comunidades que passam por dificuldades em regiões no centro e no norte da Inglaterra e que se voltaram para os conservadores. Mas o mantra de Johnson "Get Brexit Done" (Façamos o Brexit) tocou os eleitores que estavam cansados de um debate que se arrasta desde 2016, dividindo a nação e paralisando a política. Os conservadores uniram os votos do Leave, o lado que quer a saída da UE. Mas a tentativa atrapalhada de Corbyn de caminhar pelos dois lados deu terrivelmente errado.
O nacionalismo reformulou a política britânica. Johnson, o líder entre os defensores do Brexit que se tornou primeiro-ministro há cinco meses, expulsou moderados de alto nível que se opunham ao seu plano para o Brexit. Os nacionalistas escoceses venceram esmagadoramente ao norte da fronteira, sob a liderança decidida de Nicola Sturgeon. Na Irlanda do Norte, os unionistas são minoria pela primeira vez. No entanto, para os trabalhistas, esse resultado vai além de sua mensagem confusa sobre o Brexit, a questão central enfrenta pelo país. O futuro do próprio partido está em crise.
Blair é o único líder trabalhista que venceu eleições gerais há quase meio século. Nos governos dos seus três sucessores, o partido perdeu o controle de sua coalizão histórica de eleitores progressistas de classe média metropolitana com apoiadores da classe trabalhadora - e agora essa coalizão foi destruída. O Brexit foi a ferramenta dos conservadores, mas Corbyn foi a causa.
Johnson levou seu partido de um governo de minoria para uma maioria de 80 assentos, apesar de ter aumentado apenas 1% no número de votos. O Trabalhista, manchado pelo antissemitismo dos extremistas de esquerda e comandado por um líder considerado tóxico por muitos eleitores, perdeu 2,5 milhões de apoiadores. Muitos cabos eleitorais disseram que ouviam a mesma coisa nas portas das casas: Corbyn não era confiável para liderar sua nação. "Todas as portas em que bati - e minha equipe e eu conversamos com 11 mil pessoas - mencionaram Corbyn", disse Ian Murray, o único parlamentar trabalhista remanescente na Escócia. "E não o Brexit."
Surpreendentemente, parece que o maior indicador de apoio aos conservadores nos distritos não era a posição dos eleitores sobre o Brexit, mas se eles tinham uma alta proporção de eleitores da classe trabalhadora. O primeiro resultado chocante da noite veio de Blyth Valley, em Northumberland, onde cerca de 1 em cada 4 crianças vive na pobreza. No entanto, eleitores mudaram para o partido que conduziu grandes cortes nos gastos públicos desde que conquistou o poder em 2010.
O Partido Trabalhista teve seu pior resultado desde 1935. "São as nossas comunidades que sofrerão", disse Alan Johnson, ex-carteiro de origem pobre que se tornou líder sindical e importante ministro de Blair. Ele estava visivelmente irritado quando confrontou o diretor do grupo de extrema esquerda Momentum, que controla o partido, em um estúdio de televisão da BBC. "Corbyn foi um desastre", disse ele. "Todo mundo sabia que ele não conseguiria liderar a classe trabalhadora".
Os Conservadores enfrentam o desafio de realizar o Brexit dentro do cronograma prometido, lidar com quaisquer consequências turbulentas e manter unida sua nova coalizão de nortistas socialmente conservadores, suburbanos de classe média e comunidades rurais. Mas os trabalhistas estão enfrentando questões de sobrevivência como uma força séria para desafiar o poder. O partido deve abandonar Corbyn rapidamente, em vez de dar tempo para a "reflexão" (como ele sugeriu) e não instalar outro candidato sem apelo. E em seguida, deve encontrar um líder que possa aproveitar a energia do exército de jovens apoiadores de Corbyn e lidar com as preocupações sobre populismo enquanto se reconecta com cidadãos mais moderados, em preparação para qualquer tropeço dos rivais do Partido Trabalhista. Trata-se de tanto de tom e confiança, quanto de política e posicionamento.
O desafio para os trabalhistas é enorme. Exige honestidade. No entanto, na manhã de sexta-feira, Corbyn atacava a imprensa enquanto seus camaradas, com típica miopia marxista, ainda insistiam que suas políticas eram populares. O que esses esquerdistas iludidos fizeram foi levar comunidades tradicionais de operários aos braços dos conservadores - e lançar seu país para longe da UE.
*Ian Birrell trabalhou como redator para o ex-primeiro-ministro David Cameron e atualmente é editor colaborador do jornal britânico Mail on Sunday.
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