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A China, em seu esforço contínuo para tentar disputar e liderar o desenvolvimento da inteligência artificial (IA), lançou no final do mês de maio o seu novo chatbot, chamado pelo jornal britânico Financial Times de “Chat Xi PT", isto porque essa IA se distingue das demais, uma vez que, segundo o jornal, ela foi desenvolvida e treinada sob a doutrina política do ditador chinês Xi Jinping, conhecida como "Pensamento de Xi Jinping sobre o Socialismo com Características Chinesas para uma Nova Era".
O "Pensamento de Xi Jinping" é composto por mais de 10 princípios considerados “fundamentais”. Entre esses princípios estão a garantia do poder absoluto do Partido Comunista Chinês (PCCh) sobre os indivíduos, o fortalecimento da segurança nacional e dos “valores socialistas”, além de supostas propostas para a “melhoria das condições de vida e do bem-estar da população”.
A doutrina do líder comunista orienta as decisões políticas e econômicas que são tomadas no país, o que serve para consolidar ainda mais seu controle sobre o Estado e a sociedade.
O “Chat Xi PT”, uma expressão jocosa utilizada pelo jornal britânico para misturar o nome do Chat GPT, a avançada IA da Open AI, com o nome do ditador Xi Jinping, é visto como parte de uma estratégia mais ampla do regime comunista chinês para tentar promover os chamados “valores socialistas” do país e reforçar ainda mais o seu controle ideológico sobre a tecnologia.
O desenvolvimento da nova IA, que ainda não tem nome oficial, foi conduzido diretamente pela Administração do Ciberespaço da China, órgão que regulamenta a internet do país e que também é responsável pelo “Grande Firewall”, um sistema que controla o que é visto e falado nas redes.
O chatbot foi projetado, segundo a Financial Times, para responder a perguntas sobre tecnologia de rede, gerar relatórios sobre o estado atual do desenvolvimento de IA e descrever as diferenças entre o crescimento econômico impulsionado pela tecnologia e outros métodos tradicionais.
A IA, que tem em seu banco de dados apenas conteúdos aprovados diretamente pelo Estado, dará respostas tanto em chinês quanto em inglês, uma forma de facilitar o acesso à informação para um público mais amplo. Neste momento, ela está sendo apenas utilizada em um centro de pesquisa da China e ainda não foi confirmado quando ela estará disponível de forma aberta para todo o público.
China quer competir sem abandonar ideologia
A China vem tentando nos últimos anos promover uma agenda própria para incentivar instituições de ensino e empresas a investirem seu dinheiro e conhecimento no desenvolvimento de IA, com o objetivo de se tornar uma potência dominante nesse setor – que atualmente conta com os EUA, através da Open AI e da Microsoft, na liderança – até 2030.
Apesar do sonho ambicioso, as empresas chinesas que entram neste mercado têm enfrentado desafios significativos, que incluem as restrições de exportação de chips dos Estados Unidos e a necessidade de sempre aderir estritamente ao pensamento político do regime chinês, sob pena de encerrar suas atividades.
Tais restrições tem impactado, segundo analistas, a capacidade do treinamento dos modelos de IA, já que estes ficam limitados apenas as fontes de dados disponíveis de uma lista pré-aprovada pelo órgão regulador do ciberespaço chinês, que também monitora atentamente cada passo dado para garantir que os chatbots não abordem temas politicamente sensíveis ao regime de Pequim, conforme noticiou o Financial Times.
A Administração do Ciberespaço da China tem trabalhado ativamente para garantir que os desenvolvedores de IA do país incorporem em seus modelos os ditos “valores socialistas” defendidos pelo ditador.
O órgão também tem exigido que o conteúdo gerado pelos modelos esteja sempre em conformidade com as normas de discurso do país asiático. Por causa disso, gigantes da tecnologia da china, como a Baidu e a Alibaba, têm ajustado seus modelos de IA para que estes evitem temas politicamente sensíveis ao sistema comunista, sempre treinando-os para que reiniciem as conversas quando sejam pressionados por usuários para gerar conteúdos sobre esses tópicos.
Helen Toner, diretora de estratégia do Centro de Segurança e Tecnologia Emergente da Universidade de Georgetown, nos EUA, destacou ao jornal The Washington Post no ano passado que as restrições impostas pela China para o desenvolvimento de IA estão afetando de forma significativa os desenvolvedores menores, que claramente enfrentam grandes dificuldades para criar e treinar seus modelos de IA.
"Essas responsabilidades [restrições impostas pela China] são bastante significativas e dificultarão que empresas menores, sem um aparato existente de conformidade e censura, ofereçam serviços", afirmou Toner.