As questões raciais, a ação policial e a violência observada em tumultos em várias cidades americanas ganharam relevância na disputa presidencial dos Estados Unidos neste ano e aprofundaram uma polarização que já era evidente na sociedade americana.
Quando os protestos antirracismo iniciaram, logo após a morte de George Floyd, os democratas se posicionaram em favor do movimento Black Lives Matter, enquanto o presidente Donald Trump e os republicanos passaram a caracterizar as mobilizações como multidões violentas. Cenas de saques, incêndios, conflitos entre manifestantes e a polícia e as várias mortes que ocorreram em meio a este caos - direta e indiretamente - parecem ter dado força à narrativa dos republicanos. Também ajuda a estratégia de campanha de reeleição do presidente o fato de que essa violência geralmente tem ocorrido em cidades comandadas por prefeitos democratas, embora não haja uma relação de causalidade comprovada entre esses dois fatores.
Neste momento em que assassinatos em Portland (Oregon) e em Kenosha (Wisconsin) estão dominando o noticiário americano - mais do que a pandemia de Covid-19 -, Trump parece estar melhorando nas pesquisas de opinião, apesar de ainda estar atrás do candidato Joe Biden.
Em Wisconsin, por exemplo, a vantagem do democrata caiu de 6,4 pontos percentuais para 3,5 de julho a agosto, segundo média de pesquisas calculada pelo site RealClearPolitics. Biden também parece ter perdido apoio em Michigan e na Pensilvânia – os três são estados tradicionalmente democratas, mas que em 2016 elegeram Trump. Em nível nacional, Biden aparece com 6,9 pontos de vantagem, mas já chegou a ter 10,2 em junho, quando os casos de Covid-19 voltaram a aumentar nos EUA.
A diferença também pode ser resultado da convenção republicana realizada na semana passada, mas também pode ser um indicativo de que, para os republicanos, é melhor que a eleição seja vista como uma escolha entre Trump e Biden do que como um referendo sobre a presidência do republicano.
Os democratas, por sua vez, defendem que o caos visto nas ruas das cidades americanas é consequência direta do governo divisivo de Donald Trump. “O fogo está queimando e temos um presidente que atiça as chamas em vez de lutar contra as chamas. Mas não devemos queimar. Temos que construir”, disse Biden neste domingo (30), ao comentar sobre o fato de Trump ter saudado como “grandes patriotas” os participantes da caravana de direita que passou por Portland no fim de semana.
O que aconteceu em Portland, Oregon?
Um homem foi baleado no peito e morreu na noite de sábado (29), em meio a conflitos violentos entre ativistas do Black Lives Matter (BLM) e uma caravana de apoiadores do presidente Donald Trump. Os tiros foram disparados por volta das 21h, quando a maioria dos apoiadores de Trump já havia saído do centro da cidade e poucas pessoas circulavam na rua onde ocorreu o tiroteio. Um vídeo flagrou o momento do incidente. A polícia investiga o caso e pediu para que nenhuma conclusão precipitada seja feita antes da conclusão da investigação.
Segundo relatos da imprensa local, porém, o homem que supostamente está sendo investigado é Michael Forest Reinoehl, 48, que nas redes sociais se descreve como antifascista e posta fotos de vários protestos dos quais participa em Portland desde maio, quando começaram as manifestações. Em uma postagem de 16 de junho, Reinoehl escreveu sobre a participação em protestos e disse que é “100% ANTIFA de todo o modo”.
Várias pessoas foram presas antes do tiroteio. As tensões escalaram quando os manifestantes do Black Lives Matter tentaram impedir a passagem dos cerca de mil apoiadores de Trump que dirigiram até a cidade em cerca de 600 veículos. De acordo com a BBC, algumas dessas pessoas foram vistas jogando spray de pimenta nos ativistas antirracismo.
Manifestações contra a polícia e o racismo e tumultos estão ocorrendo em Portland desde a morte do afro-americano George Floyd por um policial branco, em 25 de maio. Nas últimas duas semanas, manifestantes da direita têm saído às ruas para contraprotestar. Em 22 de agosto, uma manifestação em frente ao tribunal federal de Portland terminou em confronto entre os dois grupos. De acordo com o New York Times, objetos foram lançados, tiros de paintball foram disparados e houve ainda empurrões e socos.
Quais são os últimos acontecimentos em Kenosha, Wisconsin?
Mais de 170 pessoas foram detidas em uma semana de protestos e tumultos na cidade onde Jacob Blake levou sete tiros nas costas ao desobedecer ordens policiais. A maioria dessas pessoas não mora lá e foi acusada de violar o toque de recolher imposto pela polícia local. Outras foram presas por roubo, porte ilegal de drogas e por carregar arma escondida sem permissão – mais de 20 armas foram apreendidas.
No fim de semana, o sindicato dos policiais de Kenosha divulgou a sua versão sobre a ação policial que deixou o afro-americano Blake parcialmente paralítico. A instituição disse que Blake estava armado com uma faca e que os policiais pediram repetidamente para ele largar o objeto e que ele não teria obedecido. A versão do sindicato indica também que o carro prata visto no vídeo do incidente não seria de Blake e sim da pessoa que teria ligado para a polícia acusando-o de tentar levar as chaves do veículo; que Blake teria lutado com os policiais, usando um golpe “mata-leão” contra um deles; e que uma arma de choque não conseguiu contê-lo.
Já a família de Blake alega que ele não estava armado e que quando os policiais chegaram ao local da ocorrência ele estava tentando separar uma briga entre duas mulheres. O Departamento de Justiça de Wisconsin está investigando o caso e não confirmou nem negou a versão do sindicato policial.
Nos protestos que tomaram conta da cidade desde então, dois manifestantes morreram e um ficou ferido após serem baleados por um adolescente de 17 anos identificado como Kyle Rittenhouse, apoiador das forças policiais. Ele está sob custódia da polícia e a promotoria o acusa de homicídio culposo, homicídio doloso qualificado, tentativa de homicídio doloso qualificado usando arma mortal. Rittenhouse também foi acusado de portar arma perigosa mesmo sendo menor de idade. As vítimas eram Joseph Rosenbaum, 36, e Anthony Huber, 26. A defesa de Rittenhouse alega que ele agiu em legítima defesa depois que uma multidão começou a persegui-lo por ele estar ajudando a proteger propriedades privadas de ataques e incêndios durante os protestos.
Tumultos continuam ocorrendo em Kenosha e o presidente Donald Trump prometeu fazer uma visita à cidade nesta terça-feira (1°).
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