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América do sul

O que um salário mínimo pode comprar na Venezuela. E o que não pode

Homem conta notas de bolívar para trocar por dólares | FEDERICO PARRA/AFP
Homem conta notas de bolívar para trocar por dólares (Foto: FEDERICO PARRA/AFP)

O salário mínimo da Venezuela aumentou quatro vezes só neste ano. Passou de 797,5 mil bolívares, em janeiro, para 5,2 milhões em junho, uma alta de mais de seis vezes e meia  - levando-se em consideração também o abono alimentação. Mesmo assim o valor é insuficiente para o sustento das famílias que o recebem. 

A hiperinflação que assola o país é mais veloz do que a capacidade do governo venezuelano em reajustar os valores. Considerando dados da consultoria Econoalítica divulgados nesta quarta-feira (1), o montante equivale a menos de US$ 1,47 (ou R$ 5,50) no câmbio paralelo. 

“O poder de compra do venezuelano foi duramente atingido, assim como ocorre com a oferta global de bens e serviços”, afirma Henkel García, instrutor financeiro e professor da Universidade Católica Andrés Bello, da Venezuela. 

Segundo os compreços de uma rede de supermercados que atua na região metropolitana de Caracas, capital venezuelana, um salário mínimo compraria duas dúzias de ovos, dois litros de leite desnatado, dois sabonetes, um mix de vegetais congelado de 500 gramas ou dois cremes dentais. Extrapolam esse valor itens básicos como um quilo de carne moída, amaciante, sabão líquido, pote de sorvete, achocolatado e caderno de 80 folhas. 

O governo oferece subsídio em alimentação e remédios importados pelo estado àqueles que possuem o carnê da pátria, mecanismo de controle social do regime usado até mesmo como método de controle para saber quem votou nas eleições presidenciais de 2018 – em outras palavras, uma nova versão do voto de cabresto. Mas o benefício é uma ilusão já que as cotas de compra são insuficientes para a sobrevivência ou, em muitos casos, não há produtos disponíveis nas prateleiras. 

Neste cenário é inimaginável que mercadorias de maior valor agregado caibam no orçamento das famílias que ganham a renda mínima, como eletrônicos e roupas. 

“Esses itens escapam das pessoas que ganham renda mínima, na verdade ousaria dizer que está além do alcance da grande maioria dos venezuelanos que ganham mais do que o mínimo”, comenta o economista, acrescentando que o salário médio no país é 12 vezes maior do que o mínimo, chegando a 60 milhões de bolívares, o que representa, em poder de compra, cerca de US$ 17 (ou R$ 64). 

A Ecoanalítica, uma consultoria venezuelana, estima que o valor de compra da população venezuelana tenha caído 97,2% nos últimos doze meses, enquanto a cesta básica aumentou 30.663,7%. 

 A corrida em busca do dólar 

Cada vez mais, a linha entre sobrevivência e fome é determinada não por ter um emprego ou estudo, mas algo mais: acesso a dólares americanos. Há muito tempo condenado como símbolo do imperialismo pelo presidente Nicolás Maduro, a moeda dos EUA ganhou mais relevância à medida que o bolívar se tornou praticamente inútil. Na semana passada, o governo anunciou que flexibilizaria as regras que proíbem os venezuelanos de comprar moeda estrangeira. Elas foram implantadas por Hugo Chávez, em 2003.

Na semana passada, por exemplo, o preço de uma dúzia de ovos chegou a 2,6 milhões de bolívares - equivalente a duas semanas de pagamento do salário mínimo. Mas para um venezuelano que pode trocar dólares à taxa do mercado negro, esses mesmos ovos são uma barganha relativa, custando apenas US$ 0,60. 

A população está cada vez mais separada em duas classes: os que têm dólares e os que não têm. 

Asdrubal Oliveros, diretor da consultoria Ecoanalítica, de Caracas, estima que quase um terço dos venezuelanos tenha acesso regular à moeda estrangeira, principalmente por meio de remessas, economias ou salários pagos em dólares. 

A maioria das famílias que tem acesso a remessas provenientes de parentes que trabalham em outros países recebe entre US$ 70 e US$ 100 por mês. "Aqueles que recebem dólares têm acesso a dinheiro que permanece estável em valor, mas aqueles que dependem de bolívares viram seu poder de compra reduzido em quase 90% no ano passado", disse Oliveros. "Eles estão condenados a um empobrecimento agressivo e devastador".

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