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Entrevista

“O verdadeiro Brasil é sua população”, diz cônsul dos Estados Unidos no país

Ricardo Zuniga esteve em Curitiba na última semana durante “tour” pelo Brasil | Hugo Harada / Gazeta do Povo
Ricardo Zuniga esteve em Curitiba na última semana durante “tour” pelo Brasil (Foto: Hugo Harada / Gazeta do Povo)

Membro do Serviço Diplomático dos Estados Unidos desde 1993, Ricardo Zuniga foi peça fundamental em um dos processos de reabertura política mais importantes desse século: a retomada do diálogo entre EUA e Cuba após 54 anos de embargo. Como assessor especial do presidente Barack Obama, foi ele quem capitaneou as negociações com representantes de Cuba.

Agora, Zuniga assume o posto de cônsul-geral do Consulado Geral dos Estados Unidos em São Paulo. Nas últimas semanas, ele realizou uma espécie de tour de reconhecimento pela região. Em Curitiba, conversou com autoridades e empresários paranaenses. O objetivo do novo cônsul é fortalecer as relações comerciais entre os dois países.

O Brasil que ganha o noticiário internacional é, com frequência, um país de metrópoles violentas, marcado por desigualdades sociais e politicamente imaturo. Como é o Brasil que o senhor conhece?

Um país não é o território, mas sua população. O verdadeiro Brasil é a sociedade brasileira. Eu vejo na população uma preocupação com a justiça; o desejo de melhorar de vida e ter um governo mais aberto; a vontade de construir uma sociedade em que governo e instituições atendam às necessidades da população. É um país de mais de 200 milhões de habitantes com problemas sociais como todos os outros. Mas acreditamos que as instituições brasileiras são fortes e estão mostrando força. Temos confiança de que os brasileiros vão encontrar soluções para seus problemas.

Quais são as diferenças entre uma democracia relativamente jovem, como a do Brasil, e uma democracia centenária como a dos Estados Unidos?

Para mim, a democracia e o sistema de governo de qualquer país têm que ser orgânicos; tem que ser do país, não pode ser um modelo importado. Nós não damos instrução para países sobre como devem manter e desenvolver sua própria sociedade. Toda democracia, seja ela de 200 ou de cinco anos, está em constante desenvolvimento. Nos EUA também temos desafios históricos e estruturais importantes, além de econômicos.

Quais são os desafios da democracia americana?

Temos questões de raça, desigualdade, desemprego, pobreza. Fazemos esforço constante para criar empregos que fortaleçam a classe média. Temos o desafio da saúde – a vitória de uma política para garantir assistência para toda a população é um começo para solucionar outro desafio social do país: o custo da saúde, que é muito elevado. Também somos uma sociedade de imigrantes, tempos que incorporá-los de forma justa e, ao mesmo tempo, manter o estado de lei e direito. Os desafios são muitos e o esforço é contínuo.

Qual foi o momento-chave do trabalho que o senhor desenvolveu como assessor especial do governo de Barack Obama?

Ajudar o presidente no esforço de aproximação com Cuba me deu muita satisfação e representou o compromisso do presidente Obama com a modernização da política dos EUA em relação às Américas. Sempre tivemos interesse em promover a transição de uma política fracassada para uma política com maior capacidade de transformar a situação do país, de modo a auxiliar o processo de reforças necessário para Cuba. EUA e Cuba não concordam em muitas coisas, há tensões de 50 anos entre os países, mas sabíamos que retomar o diálogo e mudar essa relação era importante.

Um dos últimos trabalhos que fiz na Casa Branca, sem dúvida importante, foi promover o encontro entre o presidente Obama e a presidente Dilma Rousseff. Acredito que a relação entre Brasil e EUA seja uma das relações globais mais importantes do século XXI.

O senhor vai atuar junto aos interesses dos americanos que estão aqui no Brasil. Quais serão as prioridades da sua administração?

Temos três objetivos principais. O primeiro é consular: o Consulado Geral em São Paulo é um dos mais importantes pontos de emissão de vistos para os Estados Unidos do mundo e atender esse fluxo de brasileiros que viaja para fazer turismo, trabalhar ou estudar continua sendo um importante. O segundo é promover o intercâmbio cultural e reforçar esse vínculo entre os dois países. Finalmente, o terceiro objetivo é fomentar as relações comerciais e econômicas entre Brasil e EUA, o que requer compromisso não apenas dos governos, mas também do setor privado. Para mim, a criação de empregos em ambos os países é o trabalho mais importante que fazemos no consulado.

Quem são os americanos que vivem no Brasil?

A maioria dos norte-americanos que vivem no Brasil estão aqui há décadas, são pessoas que dedicaram a vida ao país e ao trabalho aqui. É uma comunidade muito forte. Também temos uma comunidade consolidada de brasileiros nos Estados Unidos. Muitos cidadãos americanos são filhos de brasileiros que foram construir suas vidas no país. E há também empresas brasileiras indo para os EUA, como a Embraer, a Gerdau e a Ambev. O importante disso é que a presença dessas pessoas e empresas transforma ambos os países, estimula o crescimento e a criação de empregos.

Em junho, a presidente Dilma encontrou com Obama para negociar uma nova agenda nas relações bilaterais. Entre os assuntos abordados estava a redução da burocracia para brasileiros viajarem para os EUA. Há avanços nessas negociações?

Os dois países agora empreendem esforços para solucionar as questões técnicas envolvidas. Não é tão simples porque afeta a regulamentação e legislação de ambos os países. O consulado quer tornar o processo de obtenção do visto o mais simplificado possível.

Quais são as possibilidades para estrangeiros que querem viver nos EUA?

O sistema imigratório dos EUA é consolidado há muitos anos e a base da lei de imigração é a reunificação familiar. Mas também temos vistos de estudo e de trabalho. É possível estabelecer-se profissionalmente, principalmente no setor de informática, uma indústria que absorve muitos estrangeiros. Não é um processo fácil, mas é possível.

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