Carolina Isabel Iraheta abraça seus filhos após encontrá-los no aeroporto de Washington| Foto: Evelyn Hockstein/Washington Post

Carolina Isabel Iraheta passou oito semanas tentando liberar seus filhos de um abrigo para crianças imigrantes que é financiado pelo governo americano. Ela já tinha deixado claro que era a mãe dos adolescentes e queria que eles ficassem com ela no Norte da Virgínia (Leste dos EUA). 

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A assistente social que acompanhava o caso dos adolescentes solicitou reiteradamente documentos que Carolina já havia fornecido, citou um grande número de casos como motivo da demora e se negou a falar com os advogados dela sobre como acelerar o processo, disse a mãe, que é salvadorenha e chegou nos Estados Unidos há cinco anos e está em busca de asilo. 

Apesar de o governo Trump admitir que algumas das ações da assistente social podem não estar de acordo com a política oficial, ele defende a investigação sobre casos como o de Carolina como uma parte essencial de cuidar de dezenas de milhares de menores não acompanhados que cruzam a fronteira sul do país a cada ano. 

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O governo vem reforçando os procedimentos de investigação, preocupado com o tráfico de pessoas e com a possibilidade de os adolescentes estarem envolvidos em gangues e possam representar uma ameaça pública. 

"Trata-se da liberação segura das crianças", disse Mark Weber, porta-voz do Departamento de Saúde e Serviços Humanos (HHS, na sigla em inglês), que financia e supervisiona os operadores de abrigos. 

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A ampliação das investigações tem aumentado a duração das estadias nos abrigos e o custo para os contribuintes, segundo as autoridades. Várias organizações legais que representam crianças migrantes estão processando o governo federal dizem que essas investigações privam os menores e seus familiares de direitos legais e contribuem, equivocadamente, para atrasar sua reunião. 

“À medida que enfrentam um obstáculo, outro simplesmente aparece magicamente", disse Neha Desai, advogada do Centro Nacional para a Legislação da Juventude. "É um processo opaco em que apenas o governo pode participar e que não tem supervisão." 

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O esforço de semanas de Carolina para exigir o retorno de seus filhos mostra um aspecto do programa de abrigos do governo que não recebeu ampla atenção pública: frequentemente não é um juiz que controla se uma criança imigrante sob custódia federal irá se reunir com seus familiares. 

Diferentemente de casos típicos de custódia nos tribunais americanos não há audiências. Pelo contrário, um assistente social empregado pelo abrigo - no caso de Carolina, uma entidade com fins lucrativos - tem ampla autoridade sobre o processo, e um funcionário do HHS tem a palavra final. 

Menores desacompanhados

Quando menores desacompanhados provenientes do México são detidos na fronteira, as autoridades costumam devolvê-los ao país. Mas as crianças de outros países, principalmente Guatemala, El Salvador e Honduras, são entregues ao HHS. 

Em 2011, o departamento recebeu 6.600 crianças desacompanhadas, que, em média, passaram 72 dias sob custódia antes de serem entregues aos pais ou responsáveis, aponta um relatório de 2016 do Governement Accountability Office. 

Três anos depois, o número de crianças chegou a mais de 57 mil, com mais menores fugindo da pobreza, da violência de gangues e de outras ameaças. 

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Para gerenciar o fluxo crescente, o HHS simplificou as análises para a devolução das crianças, permitindo fotocópias em vez de certidões de nascimento originais, por exemplo. O tempo médio que os menores permaneceram em custódia caiu para 34 dias. 

Mas, em 2014, as autoridades descobriram que o HHS liberou oito crianças guatemaltecas para traficantes de pessoas que os forçaram a trabalhar em uma fazenda de ovos. O departamento recebeu críticas pesadas que foram enfatizadas neste mês durante uma audiência de um subcomitê do Senado. 

"Em resposta a isso, reforçamos o processo de análise de liberação das crianças e a investigação de seus responsáveis. Isto definitivamente acrescentou mais tempo", disse Weber. 

As crianças migrantes passaram uma média de 41 dias sob custódia do HHS no ano passado, apontam autoridades. Neste ano, com o governo lutando para reunir centenas de crianças separadas de seus pais como parte da política de "tolerância zero" do presidente Donald Trump, a permanência média é de 59 dias. 

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Há mais de 12 mil menores atualmente em abrigos, incluindo cerca de 500 que foram separadas de seus pais na fronteira. A grande maioria, como os filhos de Carolina, atravessou a fronteira sozinha, na maioria dos casos, na esperança de se juntar a parentes ou outros responsáveis que já estavam nos Estados Unidos. 

O departamento exige que todos os adultos que moram na casa de alguém que pede a liberação de crianças dos abrigos enviem as impressões digitais. Segundo um acordo feito em abril, elas são compartilhadas com o Departamento de Segurança Interna. O acordo tem sido amplamente criticado pelos defensores dos imigrantes, que dizem que aqueles sem status legal podem relutar em fornecer impressões digitais, prolongando o tempo de permanência dos menores nos abrigos. 

O HHS também tem estado sob pressão, uma vez que Trump adverte reiteradamente para os perigos, que segundo ele, representam os integrantes da gangue MS-13: uma pequena fração dos menores não acompanhados que chegam à fronteira. Assistentes sociais devem investigar as crianças em busca de vínculos com gangues para assegurar-se que a sua liberação não cria uma ameaça pública. 

A ação movida por vários grupos em nome de menores desacompanhados diz que o processo oferece "pouca ou nenhuma proteção processual contra a detenção prolongada". Alega que o governo, em muitos casos, não está fazendo "esforços imediatos e contínuos" para o reagrupamento familiar, como exigido por um acordo de acordo judicial de 

Fuga 

Carolina fugiu de El Salvador há anos atrás para morar no México, onde foi espancada por membros da família de seu marido durante uma disputa em 2012. Ela tem autorização para viver e trabalhar nos Estados Unidos, enquanto seu caso de imigração se arrasta pelo sistema. 

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Seus filhos, Diego e Saul Hernandez, cruzaram a fronteira no segundo trimestre e foram capturados por patrulheiros na fronteira e encaminhados ao HHS, que os instalou em abrigo temporário com 1.350 leitos em Homestead, na Flórida. 

Essas instalações custam ao governo cerca de US $ 750 por criança por dia, disse Weber. É três vezes mais do que o preço dos abrigos permanentes que fundos do HHS, geralmente por meio de doações para organizações sem fins lucrativos, financiam. 

O abrigo Homestead, administrado pela Comprehensive Health Services (CHS), ganhou as manchetes em junho, quando parlamentares democratas tentaram realizaram uma visita de surpresa. Jornalistas autorizados a visitar a instalação descreveram a existência de campos de futebol, prédios com dormitórios e grandes tendas com ar condicionado, onde os menores assistem às aulas e veem filmes. 

A assistente social dos meninos, Monica Vega, que é empregada pela CHS, recusou os pedidos da mãe para visitá-los, sob a justificativa de que isto não era permitido, disse Carolina. Vega também se recusou a falar com Thomas Woodward, um advogado da empresa que representa a Carolina, ou respondeu a seus repetidos e-mails, disse ele. 

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O advogado afirmou que a assistente social informava várias exigências a Iraheta que considerava sem razão. "Mas elas só eram comunicadas por telefone", disse ele. "Não há documentos." 

Carolina disse que Monica - que não atendeu aos pedidos de entrevista - questionou sua situação social, sugerindo que o quarto em um apartamento que dividia com outra família não era suficiente para acomodar seus filhos. Quando suas colegas de apartamento se recusaram a fornecer suas impressões digitais, Carolina alugou seu próprio apartamento em Arlington, Virgínia, esgotando suas poupanças e tentando esticar a renda que ganha trabalhando em um restaurante. 

Semana a semana, Carolina e Woodward encaminhavam documentos para Monica acreditando que os filhos estavam perto de serem liberados, só para que Monica ligasse novamente a Carolina pedisse mais documentos. 

Em um e-mail em julho, Carolina implorou à assistente social para que liberasse Saul, 17, e Diego, 15. "Sou forte, mas, na realidade, estou desmoronando ao ouvir meus garotos clamando para serem liberados", escreveu ela em espanhol. 

Monica pediu paciência. "Falei com eles e estão mais tranquilos agora", escreveu. "Eles são meninos muito bons e entendem a quantidade de trabalho que eu tenho". 

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Tratamento não representativo 

 Weber disse que o departamento e o CHS revisaram o tratamento dado por Monica ao caso e descobriram que ele "não é representativo do trabalho realizado em nossa rede de 100 abrigos". 

A CHS tomou "uma ação apropriada", disse Weber, e enviou um memorando lembrando a todos os assistentes sociais que eles devem falar com os advogados dos responsáveis pelos menores durante o processo de reunificação. "Sempre queremos assegurar que estamos sendo diligentes e articulamos com precisão as informações de que eles precisarão para ajudar os pais com a liberação segura e oportuna das crianças", disse o documento. 

Weber disse que funcionários do HHS têm autoridade questões relacionadas à liberação das crianças. Outro porta-voz do HHS, Kenneth Wolfe, disse anteriormente que os assistentes sociais exercem considerável discrição para determinar se os cuidados e a moradia oferecidos pelos pais são adequados. 

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"Perguntamos aos potenciais responsáveis sobre as condições em que a família dorme", disse Wolfe. "Em outras palavras, quantos quartos? Quantos membros da família por quarto? A idade das pessoas que dormem no quarto, se há janelas ou não." 

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Os responsáveis pelo caso também perguntam se os detectores de fumaça estão em funcionamento. "Pode não ser um problema, mas certamente haveria complicações", disse Wolfe. 

Em julho, depois que a investigação sobre Carolina foi concluída, os filhos voaram até Washington para encontrá-la. Quando ela os viu no terminal, começou a correr. Os três compartilharam um longo abraço. "Agradeço a Deus", disse a uma equipe de televisão de língua espanhola.