Palestinos choram sobre os corpos de crianças no funeral realizado na Faixa de Gaza| Foto: Mohammed Salem / Reuters

Pequenos corpos repousam lado a lado enrolados em mortalhas. A face angelical de uma criança em idade pré-escolar aparece dentre os destroços de uma casa. Um homem carrega um menino ferido em meio à caótica sala de emergência de um hospital depois de Israel ter atacado uma escola da Organização das Nações Unidas (ONU).

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Crianças, que compõem mais da metade da população de 1,5 milhão de pessoas da Faixa de Gaza, são as vítimas mais indefesas da guerra entre Israel e o Hamas. O Exército de Israel vem usando força sem precedente em sua campanha contra os militantes do Hamas, que por sua vez têm buscado abrigo entre civis.

A fotografia que mostra a cabeça ensanguentada da menina Kaukab Al Dayah, de 4 anos, em meio aos escombros de sua casa, apareceu nas primeiras páginas de jornais dos países árabes nesta quarta-feira (7). "Isto é Israel", lia-se na capa do jornal egípcio Al-Masry Al-Youm. A menina foi morta na manhã de terça-feira quando um F-16 atacou a casa de quatro andares de sua família na Cidade de Gaza. Quatro adultos também morreram.

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Pelo menos 257 crianças foram mortas e 1.080 ficaram feridas - um terço da vítimas registradas desde 27 de dezembro - segundo dados divulgados pela ONU nesta quinta-feira (8).

O pior para as crianças é a noção de que nenhum lugar é seguro e que os adultos não podem protegê-las, disse Iyad Sarraj, um psicólogo que agacha-se em seu apartamento na Cidade de Gaza com seus quatro enteados, com idades entre 3 e 17 anos. Adam, de 10 anos, fica apavorado durante os ataques com bombas e desenvolveu ataques de asma, diz Sarraj.

Israel afirma que seu objetivo é responder aos repetidos ataques de foguetes do Hamas no sul israelense e que está fazendo o máximo para evitar mortes de civis. Mas agências de ajuda humanitária estrangeiras lembram que os civis não podem escapar da sitiada Faixa de Gaza e que os bombardeios em áreas densamente povoadas inevitavelmente levam a vítimas civis. O Exército de Israel tem usado tanques e bombas de artilharia, bem como grandes bombas aéreas.

No campo de refugiados de Shati, no Mediterrâneo, dez meninos estavam jogando futebol num beco na quinta-feira quando uma bomba de artilharia disparada por um barco israelense atingiu uma prisão do Hamas nas proximidades.

Com o som da explosão, um dos meninos mais velhos interrompeu o jogo. Vários dos garotos abrigaram-se contra uma parede. Depois de um minuto ou dois, o jogo foi retomado.

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Samih Hilal, de 14 anos, escapou da casa de seu avô, contra as ordens de seu pai. A casa estava cheia de parentes que haviam fugido de áreas mais perigosas, disse ele, que afirmou que não podia aguentar ficar preso dentro de casa por tantas horas.

"Você acha que não estamos assustados? Sim, estamos. Mas não temos nada a fazer a não ser jogar", disse Samih.

Outro garoto de 13 anos, Yasser, acenou em direção ao avião não tripulado em vez de procurar abrigo durante um bombardeio. "Não há nada que possamos fazer. Mesmo se corrermos para cá ou para lá, as bombas são mais rápidas do que nós", disse ele.

Na verdade, toda Faixa de Gaza tornou-se terreno perigoso.

Crianças foram mortas em ataques dentro de suas casa, quando estavam dentro de carros com seus pais, quando jogavam nas ruas, a caminho do mercado e mesmo no abrigo da ONU.

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Sayed, Mohammed e Raida Abu Aisheh, de 12, 8 e 7 anos, estavam em casa com seus pais quando todos foram mortos durante um ataque israelense antes do amanhecer de segunda-feira. A família tinha permanecido no primeiro andar do prédio de três andares, enquanto o restante dos familiares buscou refúgio no porão, protegendo-se dos fortes bombardeios contra as instalações do Hamas, nas proximidades.

Os que ficaram no subsolo sobreviveram. O tio das crianças, Saber Abu Aisheh, de 49 anos, procurava objetos na quinta-feira em meio ao entulho, uma pilha de blocos de cimento, colchões, móveis queimados e aparelhos de televisão destruídos.

Ele disse que Israel não deu qualquer alerta, ao contrário do que aconteceu dois anos antes quando recebeu repetidas ligações telefônicas de militares israelenses, até mesmo em seu celular, que uma casa nas proximidades seria atingida e ele deveria deixar o local.

"O que está acontecendo não é uma guerra, é um assassinato em massa", disse Abu Aisheh, ainda usando o suéter cor de oliva, sujo de sangue, que vestia na noite do ataque aéreo.

O Exército israelense não fez comentários quando perguntado sobre a razão pela qual a casa de Abu Aisheh foi alvo de ataques

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No bairro de Zeitoun, na Cidade de Gaza, médicos encontraram quatro crianças pequenas perto dos cadáveres de suas mães no interior de uma casa, segundo informações do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, sediado em Genebra. "Elas estavam muito fracas para ficarem em pé sozinhas", afirmou um comunicado da instituição.

A Cruz Vermelha não disse o que aconteceu com as crianças, mas lembrou que as forças israelenses recusaram-se a conceder permissão a equipes de resgate para que chegassem ao bairro por quatro dias. Israel disse que o atraso foi causado pelos conflitos.

O médico Mohammed Azayzeh disse que resgatou os corpos de um homem e seus dois filhos pequenos da região central de Gaza na quarta-feira. Um dos meninos, de um ano de idade, estava nos braços de seu pai.

No campo de refugiados de Jebaliya, cinco irmãs da família Balousha, com idades de 4, 8, 11,14 e 17 anos foram enterradas juntas numa mortalha branca no dia 29 de dezembro. Um ataque israelense contra uma mesquita, supostamente um alvo contra o Hamas, destruiu a casa da família, contígua ao prédio. Apenas seus pais e um bebê sobreviveram.

Israel acusa o Hamas de cinicamente aproveitar-se dos civis de Gaza e de usá-los como escudos humanos. Os militares divulgaram imagens que mostram os militantes atirando morteiros dos telhados de casas e mesquitas.

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"Israel não quer atingir as crianças de Gaza", disse o porta-voz do governo israelense, Mark Regev. "Pelo contrário, nós gostaríamos de ver suas crianças e as nossas crescendo sem o temor da violência. Até agora, o Hamas tem deliberadamente impedido que isso se torne realidade."

Os ataques de foguetes a partir de Gaza tem provocado distúrbios na vida dos israelense que vivem nas comunidades na fronteira e, com a intensificação dos ataques, centenas de milhares de israelenses estão sob o alcance desses foguetes. As escolas estão fechadas e assustadas crianças israelenses correm para abrigos de bombas ao som das sirenes que indicam um ataque.

Na caótica situação de Gaza é difícil conseguir números exatos sobre mortos e feridos. Desde 27 de dezembro, pelo menos 750 palestinos morreram, segundo o funcionário do Ministério da Saúde de Gaza doutor Moawiya Hassanain.

Desses, pelo menos 169 tinham 17 anos ou menos, de acordo com o Centro Palestino para os Direitos Humanos. O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) disse que pelo menos 100 menores foram mortos nos primeiros dez dias de ataque.

"Nós estamos falando sobre guerra urbana", disse Abdel-Rahman Ghandour, porta-voz do Unicef no Oriente Médio e Norte da África "A densidade da população é tão grande que atinge as crianças.. Este é um conflito único no qual não há lugar para fugir."

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Sucessivas gerações de crianças em Gaza têm crescido com o clima de violência, parte do acelerado conflito com Israel. No final dos anos 1980, muitos jogavam pedras nos soldados israelenses para protestar conta a ocupação. No segundo levante, iniciado em 2000, alguns desses jovens foram recrutados pelo Hamas como suicidas.

Sarraj, o psicólogo, disse que teme por esta geração: tendo passado por traumas e presenciado o desamparo de seus pais, eles podem ser mais vulneráveis ao recrutamento de militantes radiais

Em seu apartamento na Cidade de Gaza, Sarraj tenta tranquilizar suas próprias crianças. A enteada de 14 anos teve a escola na qual estudava, a Escola Americana Internacional, destruída num recente ataque e uma amiga foi morta em outra ofensiva. A família vive no bairro de classe média Rimal e ainda tem combustível para alimentar um gerador durante a noite, o que permite que as crianças leiam. Ainda assim, quando os bombardeios começam, ele não consegue distraí-las. "Elas ficam desesperadas", disse ele. "Elas correm para encontrar o lugar mais seguro, no saguão, longe das janelas". As informações são da Associated Press.