A Corte Internacional de Justiça (CIJ) da ONU, que funciona em Haia, inocentou na segunda-feira o Estado sérvio por responsabilidade direta pelo genocídio ocorrido na guerra da Bósnia (1992-95), mas afirmou que o país negligenciou sua responsabilidade de evitar as atrocidades.
A ação contra a Sérvia havia sido proposta pela Bósnia e representava a primeira vez que um país é julgado por genocídio, num dos principais casos do tribunal em seus 60 anos de história. Se a sentença fosse favorável a Sarajevo, os bósnios poderiam pedir bilhões de dólares em indenizações de Belgrado.
A presidente da CIJ, Rosalyn Higgins, disse que o tribunal concluiu que o massacre de Srebrenica constituiu um genocídio, mas que isso não vale para a morte em massa de outros muçulmanos.
A juíza anunciou, porém, que o Estado sérvio não poderia ser diretamente responsabilizado pelo genocídio, de modo que o pagamento de indenizações à Bósnia seria inadequado, embora a Sérvia nada tenha feito para evitar o genocídio e punir seus autores.
- A corte conclui por 13 votos a 2 que a Sérvia não cometeu genocídio - disse ela. - A corte conclui que a Sérvia violou a obrigação de evitar o genocídio, a respeito do genocídio ocorrido em Srebrenica - acrescentou.
Cerca de 8.000 muçulmanos de Srebrenica e aldeias vizinhas do leste da Bósnia foram mortos em julho de 1995. Aproximadamente metade dos corpos foram achados em mais de 80 valas comuns da região.
O líder político da população sérvia da Bósnia na época da guerra, Radovan Karadzic, e seu comandante militar, Ratko Mladic, ambos acusados de genocídio em Srebrenica, permanecem foragidos.
Antes de proferir a sentença, a juíza Higgins informou ainda que o tribunal havia concluído que a Sérvia "estava disponibilizando um considerável apoio militar e financeiro'' aos sérvios da Bósnia, mas que não se conhecia qualquer intento genocida nisso.
A Sérvia alegava que uma sentença contrária seria injusta e estigmatizante, já que em 2000 o país derrubou o governo que apoiou a guerra, do ditador Slobodan Milosevic, que morreu em 2006, meses antes de receber o veredicto da corte especial de Haia em 66 acusações de genocídio e crimes de guerra.
O tribunal de crimes de guerra da ONU já condenou outros indivíduos pelo massacre de Srebrenica, que serviu de base também para as acusações do governo bósnio contra o Estado sérvio.
A Bósnia, ainda hoje dividida entre uma federação muçulmano-croata e uma república sérvia, continua com uma forte separação entre seus grupos étnicos-religiosos. Na segunda-feira, cerca de 50 pessoas fizeram uma manifestação diante do tribunal de Haia pedindo a condenação de Belgrado.
- Uma sentença de que a Sérvia cometeu genocídio na Bósnia significa tudo para mim - disse Hedija Krdizc, 34 anos, que perdeu marido, pai e avô em Srebrenica. - Sem tal sentença, temo que um dia o massacre seja esquecido - emendou.
O processo da Bósnia contra a então Iugoslávia começou há 14 anos, mas foi várias vezes interrompido devido a contestações sobre o foro da ação.
A guerra da Bósnia começou quando, seguindo o exemplo de Eslovênia e Croácia, os muçulmanos e croatas da Bósnia decidiram se separar da Iugoslávia. Com apoio do Exército iugoslavo, os sérvios da Bósnia capturaram dois terços do país e cercaram a capital, Sarajevo. Dezenas de milhares de não-sérvios foram mortos, e centenas de milhares tiveram de fugir das suas casas.