O Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) afirmou nesta segunda-feira (4) que continua a tratar o relatório da investigação sobre a incursão de Israel em 2009 contra a Faixa de Gaza como um documento de trabalho, apesar de Richard Goldstone, principal autor do registro, ter voltado atrás em algumas das acusações mais fortes contra Israel.
Israel pediu que o relatório fosse desconsiderado depois que Goldstone, ex-juiz sul-africano e promotor de crimes de guerra da ONU, ter dito num artigo que reconsiderava a conclusão do documento, segundo o qual Israel deliberadamente atacou civis durante a ofensiva de três semanas contra o grupo militante palestino Hamas.
Um porta-voz do Conselho de Direitos Humanos disse que para o relatório ser desconsiderado, Goldstone teria de apresentar um pedido formal ao organismo, o que ele não fez. "Relatórios da ONU não são cancelados tendo como base um artigo de jornal", disse o porta-voz Cedric Sapey à Associated Press. Se fosse assim, várias resoluções aprovadas pelo organismo, sediado em Genebra (Suíça), e pela Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, também teriam de ser revogadas, disse.
No mês passado, a maioria dos 47 membros do Conselho de Direitos Humanos votou pela aprovação do relatório na Assembleia Geral, recomendando que fosse pedido ao Conselho de Segurança que submetesse o relatório ao Tribunal Criminal Internacional. A medida não deve ser aprovada no Conselho de Segurança, onde o mais forte aliado de Israel, os Estados Unidos, têm direito a veto. Mas a simples sugestão de acusar Israel por crimes de guerra irritou o governo do país.
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, disse que o artigo de Goldstone, publicado pelo The Washington Post no dia 1º de abril, foi uma rara ocasião "na qual aqueles que disseminam calúnias se retratam por suas calúnias". "Isso nos leva a pedir o imediato cancelamento do relatório Goldstone", afirmou.
O porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, Mark Toner, saudou o artigo de Goldstone. "Nós deixamos claro, desde quando o relatório Goldstone foi apresentado, que não víamos provas de que o governo israelense havia intencionalmente atacado civis ou cometido qualquer crime de guerra", disse Toner aos jornalistas em Washington.
A decisão de Goldstone de reconsiderar as conclusões do relatório foi uma surpresa para pelo menos um outro integrante do painel, formado por quatro pessoas, que assinou o documento. "Eu não esperava ver os comentários que ele fez, honestamente", disse Desmond Travers à AP em entrevista por telefone, acrescentando que não foi consultado antes da publicação.
Travers, ex-oficial das Forças Armadas da Irlanda e especialista em investigações criminais internacionais, disse que não viu os relatórios investigativos de Israel que fizeram com que Goldstone voltasse atrás de partes de suas conclusões, embora reconheça que possa ser válido tomar tal medida. "Mas o conteúdo do relatório em seus elementos, em minha opinião, se mantém", disse Travers.
No artigo, Goldstone reclama do fato de que o Hamas não realizou qualquer tipo de investigação sobre as acusações feitas contra o grupo, embora reconheça que a maioria das realizadas pelo governo de Israel não tenha sido concluída.
O relatório Goldstone, divulgado em setembro de 2009, concluiu que tanto Israel quanto o Hamas cometeram potenciais crimes de guerra e possíveis crimes contra a humanidade. Israel atacou a Faixa de Gaza numa ofensiva conhecida como "Operação Chumbo Fundido", sob o pretexto de ser uma resposta a anos de disparos de foguete quase diários a partir da Faixa de Gaza contra o sul do território israelense. Cerca de 1.400 palestinos, dentre eles centenas de civis, e 13 israelenses morreram durante a campanha. As informações são da Associated Press.
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