Efeito dominó
No Iêmen, milhares de pessoas pedem saída do presidente
Folhapress, em São Paulo
Dezenas de milhares de pessoas convocadas pelos principais partidos da oposição iemenita se concentraram ontem em quatro pontos da capital Sanaa para pedir que o presidente do país, Ali Abdullah Saleh, desista de nova reeleição. Abdullah Saleh está no poder no Iêmen desde 1990.
"Não à reeleição, não à sucessão", cantavam os cerca de dez mil participantes de uma das quatro concentrações, realizada perto da Universidade do Iêmen, no centro da capital. Os manifestantes foram convocados pelo comitê conjunto da oposição, que reúne seis formações lideradas pelo Partido da Reforma Islâmica e que engloba também vários partidos laicos, como o Partido Socialista e o Partido Baath.
Além disso, as pessoas concentradas gritavam palavras de ordem como "quem supera o limite marcado pela constituição chega a Jidá", em uma referência ao presidente derrubado na Tunísia, Ben Ali, que fugiu para a cidade saudita após um mês de protestos.
Entre as concentrações, que a oposição assegurou que serão pacíficas, destacou-se também a realizada junto à casa do falecido líder do Partido da Reforma Islâmica Abdullah Bin Hussein Al-Ahmar, situada no centro da cidade, nas proximidades da sede do Ministério do Interior.
Os protestos de rua no Egito levaram a oposição ao ditador Hosni Mubarak, de 82 anos, historicamente frágil e dividida, a se articular pela primeira vez. Grupos seculares e islâmicos planejam para hoje protestos contra seu governo, com a expectativa de superar os realizados na última terça. Isso apesar da proibição de manifestações públicas.
A ação dos oposicionistas foi reforçada pelo retorno ao país de Mohamed ElBaradei, ex-chefe da agência nuclear das Nações Unidas (AIEA) e premiado com o Nobel da Paz em 2005.
ElBaradei, que prometeu participar da manifestação, afirmou que Mubarak "já serviu o Egito por 30 anos" e, agora, tem de se afastar do poder. Ele também se disse pronto para liderar a transição para um novo regime, "se o povo quiser assim".
Banida pelo governo egípcio, a Irmandade Muçulmana, maior grupo oposicionista do país, também deu seu apoio aos atos de hoje. Em seu site na internet, o movimento pediu que os protestos sejam pacíficos e reivindicou a suspensão de leis de emergência vigentes desde a ascensão do ditador ao poder.
Dia sagrado
Às sextas, milhões de pessoas em todo o Egito vão às mesquitas para fazer orações, e a intenção da oposição é aproveitar esse contingente para engrossar os protestos.
O Partido Nacional Democrático, sigla de Mubarak, tentou minimizar as demonstrações de desagrado com o governo classificando os manifestantes como "minoria".
Na primeira entrevista coletiva de um governista desde terça, o secretário-geral do partido, Safwat El-Sherif, disse estar "pronto para o diálogo". Segundo ele, no entanto, "a democracia tem suas regras e seu processo, e a minoria não pode forçar sua vontade sobre a maioria".
Mubarak, que não foi visto em público nesta semana, ainda não disse se pretende concorrer em 2011 a mais um mandato de seis anos as eleições no país são notoriamente vistas como fraudadas. Ele nunca indicou um substituto, e há rumores de que esteja preparando seu filho Gamal para a sucessão.
De acordo com despachos diplomáticos dos EUA que foram vazados para o site WikiLeaks, a ideia de transmissão hereditária do poder não é vista com bons olhos pela elite militar egípcia.
Ontem novamente foram registrados episódios de violência fora da capital, Cairo. Em Suez, um quartel dos bombeiros foi depredado e incendiado; houve também ataques a postos policiais e prédios do governo.
No país todo, cerca de mil pessoas foram detidas desde terça em razão dos protestos.
Moderação
Nos EUA, apesar da pressão crescente contra o apoio polêmico a ditadores que enfrentam protestos na região, algumas declarações oficiais indicaram que a posição não mudou.
A Casa Branca disse claramente que Hosni Mubarak é um aliado valioso, um dia depois que o porta-voz da Presidência, Robert Gibbs, se recusou a citar a aliança com o ditador egípcio.
Em entrevista à imprensa estrangeira, o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, Mike Hammer, evitou relacionar os conflitos na Tunísia, que resultaram na queda do governo, e a agitação no Egito.
"Temos que ver as coisas separadamente", disse. "Na Tunísia, apoiamos o movimento e vamos estar ao lado do novo governo, que já está dando sinais positivos para mais liberdade."
Ele lembrou o famoso discurso de Barack Obama no Cairo, no qual defendeu a liberdade de expressão e de os povos terem participação na forma como são governados.