Entrevista
"Influência da Síria e disputa interna motivaram atentado"
Fadi Ahmar, professor da Universidade Saint-Joseph, de Beirute.
Para o cientista político Fadi Ahmar, da Universidade Saint-Joseph, de Beirute, o atentado que matou Wissam al-Hassan, chefe da inteligência libanesa, tem um viés duplo. Ele conversou com a Agência O Globo.
Qual a importância da morte de Wissam al-Hassan?
Ele era sunita e ligado à oposição anti-Síria, e esteve à frente de importantes investigações sobre crimes cujos autores, suspeita-se, sejam grupos pró-Síria. Era também a única figura da oposição sunita no comando de uma das agências de inteligência libanesa, lideradas hoje, sobretudo, por gente do xiita Hezbollah. É um crime tão grave quanto o assassinato do ex-premier Rafiq Hariri; uma enorme perda para a oposição sunita do bloco 14 de Março.
Por quê?
Hassan era uma figura querida. Muitos políticos sunitas contavam com ele para garantir sua segurança.
Qual o impacto sobre o governo?
Este ataque deixa numa situação muito delicada o premier Najib Mikati, que é sunita. Ele enfrentará a fúria dos sunitas anti-Síria, mas é parte de uma coalizão predominantemente xiita, pró-Síria. No Líbano, tudo tem de ser observado por dois prismas: o da religião e o da posição quanto à velha influência da Síria.
E qual a motivação do ataque?
Há um viés duplo. De um lado, a influência externa síria. Temos desde 2005 uma aliança pró-Síria no Líbano querendo eliminar aqueles que se opõem às influências de Damasco. Pode ser uma mensagem síria de que essa campanha está viva, mesmo com o regime de Bashar al-Assad enfraquecido pela guerra civil. E há a questão interna. Esses mesmos grupos pró-Síria e o Hezbollah querem eliminar adversários antes da eleição parlamentar de 2013, quando ambicionam a maioria de um Legislativo que vai, em 2014, eleger um novo presidente.
Sob os acordes da marcha fúnebre de Chopin e protestos contra o governo, milhares de pessoas acompanharam ontem em Beirute o funeral do chefe da inteligência libanesa Wissam al Hassan, assassinado por um carro-bomba na sexta-feira.
Simpatizantes da aliança opositora 14 de Março, à qual Al Hassan era ligado, partiram depois para a sede do governo, exigindo a renúncia do primeiro-ministro, Najib Miqati, que acusam de acobertar o crime.
O protesto levou a confrontos com as forças de segurança, que deram tiros de alerta e dispararam gás lacrimogêneo contra um grupo de manifestantes que atirou pedras e tentou invadir o prédio. A tentativa foi contida e os confrontos não foram adiante, mas o clima de tensão não se dissipou em Beirute.
"O país inteiro será fechado até que Mikati renuncie", disse à tevê Al Jazeera o jovem ativista Ahmad Balaa, filiado à coalizão 14 de Março. "Vamos bloquear estradas e continuar os protestos."
O assassinato de Al Hassan colocou a capital libanesa no mapa das tensões criadas pela guerra civil na Síria. A oposição libanesa acusou o ditador sírio Bashar Assad de estar por trás do carro-bomba que matou Al Hassan e outras sete pessoas em Beirute, numa tentativa de exportar sua guerra para o volátil país vizinho.
O funeral virou a mais explícita manifestação já feita em Beirute em apoio aos rebeldes que tentam derrubar Assad.
O grito anti-Síria acabou se estendendo ao governo libanês e seu mais poderoso integrante, o grupo xiita Hizbollah, um dos principais aliados do regime Assad.
Diante da multidão reunida para o funeral, o ex-primeiro-ministro Fouad Siniora exigiu a renúncia do premiê.
Depois de colocar o cargo à disposição, o premiê Mikati disse que ficaria no cargo a pedido do presidente, Michael Suleiman, para evitar o risco de um vácuo de poder.
Divisão de poder
Seguindo o sistema de divisão sectária do poder no Líbano, o premiê é sunita, o presidente é cristão e o presidente do Parlamento é xiita.
Mas a instável disputa política gera alianças que atravessam essas linhas. Mikati, sunita, está à frente de um governo dominado pelo xiita Hizbollah, que tem também um bloco cristão.
A oposição liderada pelos sunitas tem cristãos maronitas e drusos, que trocaram de lado recentemente, prática comum na política local.
AjudaEstados Unidos ajudarão governo do Líbano a investigar atentado
Agência Estado
Os Estados Unidos irão ajudar o governo do Líbano a investigar o atentado com um carro bomba em Beirute que matou o chefe de segurança interna do país, conhecido por ser um forte crítico ao governo da Síria, informou o Departamento de Segurança.
A secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, falou por telefone ontem com o primeiro-ministro libanês, Najib Mikati, para novamente condenar o ataque de sexta-feira que matou o general Wissam al-Hassan e duas outras pessoas. Clinton e Mikati teriam concordado que os EUA forneça assistência necessária à investigação do ataque a bomba, disse a assessoria de Hillary.
Na sexta-feira, os EUA condenaram a explosão, dizendo que foi um ataque terrorista. Neste domingo, Hillary disse que os EUA seguem firmes no compromisso de ajudar o Líbano a manter a "estabilidade, independência, soberania e segurança".
O ministro francês das Relações Exteriores, Laurent Fabius, afirmou que o presidente da Síria, Bashar Assad, "provavelmente" está por trás da explosão ocorrida em Beirute. "Não sabemos quem está por trás (desse atentado), mas tudo indica que é uma extensão da tragédia na Síria, o que torna a saída de Assad ainda mais necessária".