Juan Guaidó, que se declarou presidente interino da Venezuela, jogou mais lenha na fogueira em seu avanço contra a ditadura de Nicolás Maduro, quando no sábado (23) à noite, declarou via redes sociais que: "os acontecimentos de hoje (sábado) me obrigam a tomar uma decisão: sugerir à comunidade internacional de maneira formal que devemos ter abertas todas as opções para conseguir a libertação desta pátria que luta e seguirá lutando."
Indagado pela Folha de S.Paulo, em entrevista por telefone, neste domingo (24), sobre se estava fazendo referência a uma possível intervenção militar, Guaidó respondeu: "eu quis dizer exatamente isso, que devemos considerar todas as opções. A Constituição venezuelana dá à Assembleia Nacional o direito de solicitar apoio desse tipo. Não é o que buscamos, mas é uma possibilidade que, responsavelmente, não podemos descartar dada a atitude das forças e interesses que sustentam a usurpação na Venezuela."
Recém-chegado a Bogotá, onde participa, nesta segunda-feira (25), da reunião do Grupo de Lima, com chanceleres e representantes dos países membros --pelo Brasil estará presente o vice-presidente Hamilton Mourão -- Guaidó disse não temer como irá voltar à Venezuela.
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Afirmou ter entrado na Colômbia com ajuda de militares que apoiam sua causa e que o número deles vem crescendo, e que não teme como será o retorno. Voltou a elogiar os oficiais que aproveitaram a confusão do último sábado para desertar do Exército venezuelano. Cerca de 60 oficiais ficaram na Colômbia.
"Eles fizeram a coisa certa e queria alentar que outros o seguissem. Me disseram que o fizeram por suas famílias e pelo país e terão anistia". E acrescentou: "Tivemos uma oportunidade única de fazer entrar em nosso país alimentos e remédios de que nossa população tanto precisa, e isso foi impedido, houve feridos e mortos. É uma lástima desperdiçar a oportunidade de um país que precisa dessas coisas. Mas é preciso seguir adiante."
Indagado sobre o papel do Brasil nas tentativas do sábado, Guaidó respondeu: "O governo do Brasil fez tudo o que pôde apoiando a entrada da ajuda humanitária, e o fez corretamente, sem ingressar no território da Venezuela. Estou muito agradecido. Além disso, o Brasil foi testemunha da repressão brutal que as forças que respondem a Maduro cometeram contra a população venezuelana da fronteira, especialmente contra a população indígena dos Pemón ", disse, referindo-se aos mortos e feridos no enfrentamento. "Estes crimes que estão sendo cometidos pela ditadura são terríveis, não podem e não ficarão impunes."
Retirada de blindados
O Ministério da Defesa informou na noite deste domingo (24) que negociou com as forças militares da Venezuela a retirada de veículos blindados da fronteira entre os dois países. Em nota, o governo brasileiro informou que, após conversas com o país vizinho, chegou-se à conclusão que a presença do aparato militar na barreira montada pelos venezuelanos é inconveniente.
Neste domingo (24), foram registrados novos confrontos na cidade de Pacaraima (RR), na fronteira com a Venezuela. Um grupo de venezuelanos arremessou pedras e colocou fogo em pneus na tentativa de cruzar para o Brasil. Os militares venezuelanos responderam com gás lacrimogêneo e balas de borracha, aproximando-se da linha da fronteira. As bombas atingiram os manifestantes e jornalistas que estavam na região.
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O Exército brasileiro retirou manifestantes do local e montou um cordão de isolamento para evitar novos distúrbios. "O Ministério da Defesa intercedeu para que novos incidentes não voltem a se repetir", registrou a nota oficial.
O governo de Jair Bolsonaro disse ainda que, agora à noite, a situação é de normalidade na faixa de fronteira e que as viaturas que transportariam alimentos e remédios para o país vizinho aguardam em Pacaraima até que seja autorizado o acesso.
Para muitos, só resta a luta armada
Para muitos venezuelanos, a luta armada é a única alternativa para tirar o ditador Nicolás Maduro, que está no poder desde 2013, quando Hugo Chávez morreu.
"Sem armas não vamos conseguir. Nem máscaras nós temos, precisamos de equipamento para conseguir abrir passagem para a ajuda humanitária", disse Javier, que estava no meio dos embates entre as tropas venezuelanas e manifestantes contra Maduro na ponte Francisco de Paula Santander, que liga as cidades de Cúcuta (Colômbia) e Ureña (Venezuela).
Os colegas, concordaram e fizeram eco à demanda do cadeirante que diz ter tomado um tiro em Caracas há dois anos. "Precisamos ter algo para lutar, só com pedras não conseguiremos", dizia Alejandro, um jovem rapaz de 17 anos que se dizia disposto a dar a vida para derrubar Maduro.
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Javier e Alejandro fazem parte de um grupo de algumas centenas de venezuelanos que cruzaram a fronteira na sexta-feira para assistir ao concerto organizado por Richard Branson. Eles acreditavam que conseguiriam retornar à Venezuela com os caminhões carregados com comida, remédios e itens de primeira necessidade que os Estados Unidos enviaram para cá como estratégia para pressionar o ditador Nicolás Maduro. Esperavam genuinamente ser recebidos de braços abertos pelos soldados.
"Imaginamos que Guaidó havia feito um acordo com os generais, que seria o fim de Maduro", disse Carlos Rodríguez, um comerciante de San Cristóbal, uma cidade a poucos quilômetros da fronteira.
Ele, como muitos dos que estão aqui, acreditam que Maduro foi mais inteligente e trocou os soldados por integrantes dos temidos Colectivos, os grupos paramilitares organizados pelo ex-presidente Hugo Chávez, há mais de uma década. "Não temos medo dos soldados, eles sofrem como nós. Temos medo dos Colectivos, eles são homens maus, são eles que não deixam os caminhões passar", diz o jovem Alejandro.
As teorias criadas nas rodas de venezuelanos que estão impedidos de retornar para suas casas e agora dormem pelas praças e ruas próximas às pontes que unem os dois países reforçam a ideia de que a solução para essa crise é por meio da violência.
Os grupos que enfrentam os soldados e os Colectivos dizem ser essa a única maneira de conseguir tirar Maduro do poder. "Eles reconhecem Guaidó como presidente mas não fazem nada. Aqui precisa acontecer o que aconteceu no Panamá, precisamos de uma intervenção", dizia um jovem que não quis dar seu nome, sobre a Ponte de Urenãs. "Se não eles não têm coragem de enfrentar Maduro que nos deem as armas então, porque não temos medo dele".
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No lado venezuelano, no entanto, o medo parece ter sido a tônica do domingo. Após a dura repressão do regime contra aqueles que tentaram abrir passagem para o comboio com as cargas enviadas pelos Estados Unidos, pouca gente saiu de casa. Homens armados e com máscaras rodavam pelas cidades fronteiriças em motocicletas. Uma espécie de toque de recolher informal foi observado em toda a região.
Michele Garcia, uma jovem de 22 anos que agora não sabe como voltar para casa, observava seus compatriotas se preparando para um novo embate contra os soldados da Guarda Nacional e repetia para si mesma: "Temos que ter fé, temos que ter fé, um dia conseguiremos tirar Maduro".
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