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AMÉRICA LATINA

Os escândalos não param no Peru: denúncias contra juízes ameaçam presidente que assumiu em março

Manifestantes protestam contra escândalos de corrupção na Justiça do Peru | Guillermo Gutierrez/Bloomberg
Manifestantes protestam contra escândalos de corrupção na Justiça do Peru (Foto: Guillermo Gutierrez/Bloomberg)

Mal entrou no governo, depois de seu antecessor, Pedro Pablo Kuczynski, ter renunciado por tentar comprar votos para evitar um impeachment, o presidente peruano, Martin Vizcarra enfrenta uma série de escândalos na Justiça do país. Mais de três dúzias de gravações secretas foram publicadas, principalmente pelo site de notícias investigativas IDL-Reporteros. As conversas apontam para uma rede ilegal que procurou influenciar as nomeações dentro da Justiça e do Ministério Público para proteger aliados de processo e prisão. 

"O envolvimento de instituições públicas parece ser muito mais extenso do que se imaginava", disse Samuel Rotta, diretor executivo da Proetica, a divisão peruana da Transparência Internacional. 

O caos se seguiu às denúncias.. Cinco membros do Supremo Tribunal foram suspensos. O presidente, Duberlí Rodríguez, renunciou. Uma das gravações mostra um de seus assessores com um juiz suspeito. O ministro da Justiça, Salvador Heresi, também pediu a conta. Um juiz foi preso e outro foi proibido de sair do país. Quatro dos sete membros do Conselho Nacional de Magistrados, que controla a nomeação de juízes e promotores, também pediram para sair do cargo. 

Vizcarra, ex-vice-presidente de Kuczynski, prometeu reagir e embarcar em uma profunda reforma do sistema judiciário. "Não vamos permitir a decomposição das instituições do Peru", disse ele em um discurso em 17 de julho. 

Mas não é só o Judiciário que está com sérios problemas. Cinco ex-presidentes foram acusados de corrupção. E, volta e meia, o Congresso se vê envolvido em denúncias de tráfico de influência. O meio que essas denúncias chegam à tona, há quase 20 anos, é o mesmo: gravações de vídeo. 

O governo de Alberto Fujimori implodiu em 2000 depois que gravações de vídeo mostraram seu chefe de inteligência entregando pilhas de notas a parlamentares, juízes e militares. Três meses atrás, um legislador usou uma câmera de pulso para filmar aliados do então presidente Pedro Pablo Kuczynski, aparentando negociar votos para evitar seu impeachment. Kuczynski renunciou no dia seguinte. 

Administração em perigo 

Agora, as gravações vazadas em uma investigação sobre tráfico de drogas pegaram juízes que negociavam sentenças e comparecimentos em tribunais e trocavam favores. O último escândalo põe em perigo a administração do sucessor de Kuczynski, Martin Vizcarra, e ameaça o que muitos consideram ser a melhor chance de escapar de uma era disfuncional e estabelecer uma economia de US $ 215 bilhões em bases firmes. 

Durante quase duas décadas, o Peru priorizou políticas que galvanizaram o crescimento, reduziram a pobreza e tornaram-na uma queridinha de investidores globais. Mas seus sistemas políticos e judiciais eram fracos e presas fáceis para o crime organizado e funcionários corruptos. Em 2016, Kuczynski, um veterano de Wall Street, chegou ao poder, mas seu plano de modernizar as leis eleitorais e mudar a forma como os juízes são escolhidos atolados no congresso, controlado pelo partido Força Popular, de Keiko Fujimori, filha de Alberto Fujimori. Desde a renúncia de Kuczynski, a nação andina foi retrocedendo em intrigas bizantinas. 

"Esses tipos de problemas estruturais são como uma bigorna ligada à perna, segurando você", disse Aldo Ferrini, diretor executivo da AFP Integra, maior gestora de fundos de pensão do Peru. "É preciso um escândalo como esse para que as pessoas realmente comecem a exigir mudanças drásticas, para ter um país com futuro". 

Depois de lidar com a hiperinflação e com uma insurgência da guerrilha maoísta nas décadas de 1980 e 1990, o Peru liberalizou sua economia, reduziu a dívida pública e utilizou recursos do de commodities de uma década para estradas, aeroportos e linhas de energia. A BHP Billiton e a Glencore construíram minas que transformaram o país no segundo maior produtor de cobre do mundo, atrás do Chile. 

Kuczynski tentou atrair mais investimentos estrangeiros, aumentar os gastos com infraestrutura e reduzir a regulamentação. E, de fato, o Fundo Monetário Internacional espera que o Peru registre o maior crescimento entre as principais economias da América Latina neste ano e no próximo, com crescimento de 3,7% e 4%, respectivamente. A dívida pública é a mais baixa da região depois do Chile. 

A corrupção, no entanto, ameaça a crescente prosperidade: é o fator mais problemático para fazer negócios no Peru, de acordo com o índice de competitividade global 2017-2018 do Fórum Econômico Mundial. A nação ocupa o 116º lugar entre 137 países pela qualidade de suas instituições. 

Defesa das reformas 

Mais de duas dúzias de grupos industriais informaram, na sexta-feira, que estão prontos para apoiar uma reforma integral que abranja tudo, desde o escritório do procurador-geral até o instituto penitenciário. 

Reunir aliados por trás de um expurgo de juízes corruptos pode reforçar a liderança de Vizcarra. O engenheiro civil era pouco conhecido quando assumiu o cargo em março e, embora, recentemente, tenha passado algum tempo viajando pelo país e inaugurando obras públicas, sua popularidade já diminuiu. 

"Ele precisa se arriscar, porque se ele não demonstrar que tem força para governar e seguir em frente, sua popularidade continuará em declínio”, disse Hernan Chaparro, diretor nacional da consultoria de pesquisa de mercado GfK SE. 

Seus planos provavelmente exigirão pressão das ruas, disse Rotta. Os peruanos ainda estão se recuperando de uma investigação sobre subornos pagos pela gigante brasileira Odebrecht. Fujimori e os três últimos presidentes do Peru estão sob investigação por receber doações de campanha da Odebrecht. A última erupção causou fúria popular. 

Dezenas de milhares de peruanos marcharam na quinta-feira para protestar contra a corrupção. "O sistema judiciário e todo o estado peruano estão podres, na minha opinião. Não podemos mais aguentar isso", disse Nina Vasquez, uma contadora de 31 anos de Lima, enquanto observava um protesto em frente à sede do judiciário. 

Jo Marie Burt, que leciona na Schar School of Policy & Government da George Mason University em Arlington, Virgínia, disse que o controle do Judiciário tem sido a chave histórica para a nação. “Eles têm procurado encobrir a corrupção, o tráfico de drogas, a lavagem de dinheiro, mas também controlam o poder político", disse ela.

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