Os esforços da primeira-ministra britânica Theresa May para tirar sua nação da União Europeia estiveram em estado de caos nesta terça-feira (19), enquanto ela lutava para contornar um regulamento parlamentar - do século 17 - que pode forçá-la a implorar aos líderes europeus por uma grande prorrogação do prazo para saída.
May se reuniu com seus assessores durante horas para tentar elaborar uma nova estratégia para conseguir que os legisladores assinem o acordo de divórcio antes da data marcada para a saída do Reino Unido, 29 de março. Seu antigo plano – não que ele fosse popular o suficiente para ter sucesso – foi derrubado na segunda-feira (18) pelo presidente da Câmara dos Comuns, John Bercow, que disse que não permitiria uma terceira votação sobre um acordo de divórcio que os legisladores britânicos já rejeitaram duas vezes.
Os principais assistentes de May reconheceram publicamente que o inesperado anúncio de Bercow significa que ela provavelmente irá de mãos vazias para uma cúpula crucial com a União Europeia, que começa na quinta-feira, onde os 27 líderes da UE vão refletir sobre quanto tempo mais deixarão o Reino Unido ficar no clube além deste mês. May pode propor um novo prazo: um plano que estava sendo comentado na imprensa britânica era o de um longo atraso de pelo menos nove meses, a menos que ela consiga aprovar o atual acordo de saída antes de julho, quando o Parlamento Europeu será renovado.
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“Para meus colegas do Brexit, acho que eles podem ver que há um risco crescente de não haver Brexit”, disse o secretário do Brexit, Stephen Barclay, à BBC. Ele disse que May ainda pode tentar realizar outra votação antes do prazo final do Brexit, mas notou que, de qualquer forma, ela terá que buscar um adiamento com os líderes da UE.
Regra antiga
Na segunda-feira, Bercow invocou uma convenção parlamentar datada de 1604 que, segundo ele, proíbe a votação de uma medida no Parlamento se ela já foi rejeitada na mesma sessão da legislatura. May esperava que os legisladores que apoiam o Brexit ficassem assustados com a perspectiva de ficar presos na UE e aprovassem seu plano na terceira tentativa.
Uma maneira de contornar a liminar de Bercow seria “reacender as luzes” no Parlamento, declarando o fim da sessão atual e iniciando uma nova, disseram especialistas legais. Mas isso exigiria a convocação da rainha Elizabeth II para algumas cerimônias, um passo que o secretário Barclay disse que os líderes não a fariam aceitar. (Ela faz 93 anos no mês que vem, afinal.)
Os acontecimentos em Londres deixaram os líderes europeus incrédulos sobre um processo que muitos deles já achavam que tinha atingido o fundo do poço.
“Vou lutar até a última hora do dia 29 de março para que ainda consigamos fazer uma saída ordenada”, disse a chanceler alemã, Angela Merkel, a repórteres em Berlim. “Eu admito que não estava familiarizada com as regras do Parlamento Britânico do século 17”.
Os líderes franceses pareciam estar em um clima mais tenso, adotando a técnica de policial bom / policial mau que o país desenvolveu em conjunto com a Alemanha para os assuntos do Brexit nos últimos meses.
Os britânicos “disseram ‘não’ a uma saída sem acordo, e disseram ‘não’ a um acordo realista. Agora eles têm que mudar de ideia em um dos dois casos”, disse a ministra francesa para Assuntos Europeus, Nathalie Loiseau, a repórteres em Bruxelas.
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Loiseau recentemente escreveu em sua página privada no Facebook que ela havia dado ao seu gato o nome de Brexit porque ele não se decide se quer estar do lado de dentro ou de fora, de acordo com o semanal francês Journal du Dimanche.
Perguntada sobre seu gato na terça-feira, ela disse: “Eu acho que preciso ter um certo senso de humor para lidar com o Brexit”.
Líderes europeus não estavam descartando a possibilidade de uma saída do Reino Unido caótica e sem rede de proteção em dez dias – um passo que poderia azedar o comércio entre o Reino Unido e o resto do mundo e desencadear um terremoto econômico.
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Mas mesmo supondo que eles concedam algum tipo de extensão do prazo, que a maioria dos líderes europeus parece favorecer, eles enfrentarão um emaranhado de problemas práticos sobre quanto tempo dar. O maior desafio está ligado às eleições para o Parlamento Europeu que estão programadas para o final de maio. Se o Reino Unido decidir não participar, o prazo mais longo que a maioria dos líderes europeus está disposta a conceder é até o final de junho.
Mais tempo do que isso, e o novo parlamento estará em sessão. Se o Reino Unido ainda for um membro da UE sem legisladores em seu parlamento, isso seria uma violação dos tratados da UE, e as ações do parlamento poderiam estar sujeitas a contestação legal.
Os membros britânicos do Parlamento Europeu já estão arrumando suas malas para partir. Mas mesmo que o Reino Unido ganhe uma prorrogação e organize suas eleições para o órgão de Bruxelas em maio, os formuladores de políticas da UE temem que isso possa ter o papel de estragar as discussões do bloco. Enquanto o Reino Unido permanecer no clube, ele tem voz na tomada de decisões – uma esquisitice que significa que May também assinará uma série de políticas da UE não relacionadas ao Brexit na cúpula desta semana.