A Otan classificou neste domingo (27) de incidente "trágico" o ataque aéreo que matou 24 soldados paquistaneses e gerou uma crise entre Estados Unidos e Paquistão, que afirma ter a intenção de revisar sua cooperação com Washington na luta antiterrorista.
É o erro mais grave no Paquistão da coalizão liderada pelo exército americano no outro lado da fronteira desde que Islamabad se aliou, no fim de 2001, a Washington em sua "guerra contra o terrorismo". E reativa a crise bilateral provocada por um ataque americano em território paquistanês que causou a morte de Osama Bin Laden no dia 2 de maio.
No sábado, antes do amanhecer, vários helicópteros e aviões bombardearam dois postos do exército no lado paquistanês da fronteira.
A Força Internacional da Otan (Isaf) afirma que seus militares mobilizados no lado afegão solicitaram apoio aéreo, e este teria "muito provavelmente" causado as baixas paquistanesas.
Washington reagiu imediatamente expressando no sábado seus "mais profundos pêsames" e prometeu apoiar "uma investigação imediata da Otan".
Mas o secretário-geral da Otan, Anders Fogh Rasmussen, demorou mais de 36 horas para reagir. É um "incidente trágico" e "involuntário", disse.
"Vamos determinar o que ocorreu e tirar as lições adequadas", afirmou Rasmussen.
Não é a primeira vez que aeronaves da Otan matam soldados paquistaneses durante bombardeios contra talibãs afegãos em zonas montanhosas, onde se torna difícil localizar a fronteira, mas o balanço de vítimas nunca foi tão alto.
Os investigadores deverão determinar se, como afirma Islamabad, não houve "nenhuma agressão" por parte de seus soldados, ou se os militares estrangeiros - em território afegão, como afirma a Isaf, ou talvez no Paquistão - solicitaram um ataque aéreo em resposta aos disparos procedentes do Paquistão.
"Ataques como estes são completamente inaceitáveis, demonstram uma indiferença total pelo direito internacional e pela vida de seres humanos", declarou neste domingo a ministra das Relações Exteriores paquistanesa, Hina Rabani Khar, durante uma conversa por telefone com a secretária americana de Estado, Hillary Clinton.
O Paquistão interrompeu no sábado o tráfego de comboios de abastecimento da Isaf, dos quais a imensa maioria transita por seu território, exigiu que militares americanos abandonem em até 15 dias uma base no sudoeste do país e ameaçou revisar sua cooperação na luta antiterrorista.
Na noite de sábado, o governo e a hierarquia militar paquistanesa se reuniram e anunciaram que Islamabad "reconsiderará completamente todos os seus programas, atividades e acordos de cooperação com os Estados Unidos, a Otan e a Isaf, incluindo os diplomatas, políticos, militares e de inteligência".
A Isaf e os Estados Unidos se apressaram no sábado em transmitir seus "mais sinceros pêsames", prometeram uma "investigação rigorosa" e ressaltaram a importância das relações com Islamabad, mas isto não foi suficiente para diminuir a tensão.
Os bombardeios "são uma violação absoluta da soberania do Paquistão, que afeta negativamente os progressos realizados pelos dois países para restaurar suas relações e obriga o Paquistão a revisar os termos de seu compromisso" na luta contra o terrorismo, repetiu neste domingo Rabani Khar a Hillary.
A ministra expressou "o sentimento profundo de raiva que se sente em todo o Paquistão" e confirmou a decisão de bloquear a estrada aos comboios de abastecimento da Otan.
Desde que Islamabad se aliou a Washington, em 2001, suas zonas tribais fronteiriças com o Afeganistão se tornaram o principal santuário da Al-Qaeda no mundo e o esconderijo de talibãs afegãos. Washington incentiva frequentemente o exército paquistanês, a quem financia com bilhões de dólares há uma década, a atacar os insurgentes islamitas.
Mas a República Islâmica do Paquistão, potência nuclear militar com uma opinião pública muito antiamericana, também enfrenta uma onda de atentados realizados por talibãs paquistaneses aliados da Al-Qaeda, que rejeitam sua aliança com os Estados Unidos.