Mark Garren não comunga quando vai à igreja. Às vezes, caminha até o padre e cruza os braços sobre o peito, tocando os ombros, num sinal de que está pedindo uma bênção. Mais frequentemente Garren, 64, permanece sentado, ciente de que se divorciou há alguns anos, enquanto os outros fiéis se dirigem ao altar.
Pamela Crawford, 46, da Virgínia, não passa por isso. Duas vezes divorciada, ela se sente julgada por sua Igreja, mas, quando vai à missa, acompanha o resto dos paroquianos. "Se Deus tem algum problema no fato de eu comungar, vamos resolver isso", disse ela.
Havendo milhões de católicos divorciados, muitos dos quais ressentidos com o seu status perante a Igreja, o Vaticano iniciou uma reavaliação notável do tratamento que dispensa a fiéis que tiveram casamentos desfeitos.
O papa Francisco começou um debate nos altos escalões eclesiásticos sobre se e como a Igreja deveria alterar sua posição em relação aos divorciados, mas sem invalidar o caráter permanente e indissolúvel do casamento.
As linhas de combate são claras: algumas autoridades eclesiásticas, com destaque para a conferência episcopal alemã, querem que a Igreja relaxe suas regras, permitindo que os católicos divorciados retornem de forma plena à vida religiosa especificamente ao receber a comunhão, mesmo que tenham se casado novamente.
Os tradicionalistas reagem, argumentando que a indissolubilidade do matrimônio é ordenada por Deus e, portanto, inegociável.
Em outubro passado, bispos de todo o mundo discutiram o divórcio, entre outros temas, num sínodo relativo a questões familiares.
No próximo mês de outubro, um grupo maior de bispos se reunirá para um segundo sínodo no Vaticano, ocasião em que decidirão se recomendam ou não mudanças nas regras. Qualquer decisão sobre isso caberá ao papa.
Estima-se que, entre todos os católicos americanos que já se casaram, 28% se divorciaram, ou cerca de 11 milhões de pessoas.
Para muitos católicos divorciados, a atitude da Igreja levanta uma questão existencial, segundo Helen Alvaré, professora de direito da Universidade George Mason: "Qual é o meu lugar na Igreja; sinto uma boa acolhida?".
Alvaré, ex-porta-voz da conferência episcopal dos EUA, disse que a indissolubilidade do matrimônio é um fundamento católico essencial, "a chave da cosmologia católica apostólica romana a nossa compreensão do mundo, de Deus, a nossa relação com Ele e nossa relação uns com os outros".
Mas, acrescentou ela, o questionamento sobre o lugar de fiéis divorciados se enquadra num contexto maior de incerteza para aqueles que não vivem totalmente de acordo com os ideais da Igreja.
"Há muitos católicos divorciados, e será que não deixamos essas ovelhas vagarem sem ir até elas? Jesus quer que tomemos conta de todas as ovelhas."
A Igreja oferece uma solução para alguns: solicitar uma anulação, a declaração de que o casamento nunca foi realmente válido.
Os párocos determinam isso com base nas leis eclesiásticas que permitem anulações por motivos como doença mental ou "defeito grave de discrição do juízo acerca dos direitos e deveres essenciais do matrimônio".
Vários católicos divorciados elogiaram esse processo. A escritora Katherine Metres, 42, de Washington, conta que "os padres disseram: 'Queremos ajudá-los a dar um desfecho ao casamento'".
Mas o noivo dela tem dificuldades para anular o casamento anterior, e o novo casal está frustrado.
Muitos descreveram o processo como caro e intrusivo. O papa Francisco tratou recentemente dessas preocupações, quando disse a juízes da Igreja: "Eu gostaria que todos os processos de casamento fossem gratuitos".
Em seguida, numa conferência sobre anulações, ele disse que os procedimentos "muitas vezes são vistos pelos cônjuges como longos e cansativos". As mulheres em particular manifestaram descontentamento por serem interrogadas em tribunais eclesiásticos.
"Você está lidando com um marido abusivo que é homem, e então precisa ir até um homem para obter a anulação, e um bando de homens se senta a uma mesa e decide se a sua decisão foi correta", disse Denise Stookesberry, 58, de Saint Louis (Missouri).
Andrea Webb, 47, de Palm Harbor (Flórida), deixou de frequentar a igreja após concluir que só conseguiria anular seu casamento se criticasse o ex-marido de forma inverídica. "Qualquer um poderia dizer: 'Se não gosta desse sabor de refrigerante, vá atrás de outro', mas eu não quero ser metodista nem luterana", disse ela.
Para muitos outros, a Igreja faz exigências demais para reaceitar os divorciados. "Eu fui casada entrei nessa com as ideias certas, e dizer algo diferente seria uma mentira", disse Carol Trankle, 72, de Rapid City (Dakota do Sul).
Ela deixou a Igreja há 40 anos. "Eu me considero católica até hoje. Só não posso participar."