Dezessete novos cardeais foram ordenados neste sábado (19) pelo papa Francisco, que progressivamente modela a sua imagem o colégio cardinalício, agora menos europeu e mais comprometido com a justiça social.
O consistório (assembleia de cardeais) para um novo colégio cardinalício foi celebrado na basílica de São Pedro. Cada novo “príncipe da Igreja” se ajoelhou de forma ritual diante do pontífice para receber seu barrete púrpura, uma cobertura eclesiástica que se ajusta à cabeça e que tem forma quadrangular, assim como o anelo de cardeal. “Amem, façam o bem, abençoem e rezem”, afirmou o papa, antes de lamentar que o “desconhecido ou o imigrante ou o refugiado” se transformem às vezes para nós em um “inimigo”.
“Viemos de países distantes (...) com idiomas, cores e costumes diferentes (...) pensando de forma diferente e celebrando a fé com ritos diferentes. E nada disto nos converte em inimigos”, declarou Francisco em uma homilia. O novo colégio está integrado por 228 membros, que podem auxiliar o papa em sua atividade diária. Mas apenas 121 deles têm menos de 80 anos e podem participar no famoso conclave que elege um novo papa e que, potencialmente, podem suceder o argentino Francisco. O pontífice, de 79 anos, que ordenou cardeais pela terceira vez desde sua eleição em 2013, nomeou pessoalmente mais de um terço dos cardeais eleitores.
Ao revelar os nomes dos escolhidos, o papa disse que a sua escolha reflete mais uma vez a “universalidade da Igreja”, em oposição a uma tradição mais centrada no passado, na Europa, ou até mesmo na Itália. De fato, 13 homens de todos os continentes se convertem neste sábado em cardeais eleitores: três europeus, três americanos, um mexicano, dois sul-americanos - incluindo o arcebispo de Brasília, Sérgio da Rocha -, dois africanos, um asiático e um da Oceania.
Todos eles são arcebispos ou bispos, com exceção de um simples padre albanês, Ernest Simoni, de 88 anos, perseguido durante a ditadura comunista do tirano Enver Hoxha. Condenado à morte por ter celebrado uma missão em memória do presidente americano John Kennedy, Simoni cumpriu 18 anos de trabalhos forçados, na prisão e em uma mina. Ao visitar a Albânia em 2014, Francisco ficou impressionado e emocionado com a história de vida deste resistente católico.
Outra opção original é a de um “núncio apostólico” (embaixador do papa) na Síria, país “mártir” e incessantemente presente nas orações de Francisco. O monsenhor Mario Zenari não aceitou abandonar o posto que ocupa há oito anos em Damasco, onde tenta dialogar com as diferentes partes do conflito.
Além disso, o monsenhor Dieudonné Nzapalainga, envolvido em uma plataforma inter-religiosa para a paz em seu devastado país, se tornou o primeiro cardeal da história da República Centro-Africana. Aos 49 anos, ele é o mais jovem dos novos cardeais. O novo conclave terá agora 45% de eleitores da Velha Europa (contra 52% quando o papa Francisco foi eleito em março de 2013), 14% da América do Norte, 12% da África, 12% da Ásia, 11% da América do Sul, 3% da América Central e 3% da Oceania.
Brasileiro
O arcebispo de Brasília, dom Sérgio Rocha, de 57 anos, e junta-se aos quatro cardeais eleitores do Brasil - d. Raymundo Damasceno Assis (de Aparecida), d. Odilo Scherer (de São Paulo), d. Orani Tempesta (do Rio de Janeiro) e d. João Braz de Aviz, prefeito da Congregação para os Religiosos no Vaticano - participaram do consistório. Os outros seis cardeais brasileiros, não eleitores, são d. Paulo Evaristo Arns e d Cláudio Hummes (São Paulo), d. José Freire Falcão (Brasília), d. Serafim Fernandes de Araújo (Belo Horizonte), d. Eusébio Scheid (Rio de Janeiro) e d. Geraldo Majella Agnelo (Salvador). O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, chefiou a delegação do Brasil enviada a Roma.
As insígnias entregues pelo papa aos novos cardeais têm significado especial: o anel de Pedro representa a união com o papa e o barrete vermelho significa a disposição de servir à Igreja até, se necessário, o derramamento do sangue. Francisco lembrou esses significados, em sua homilia, ao falar das dificuldades enfrentadas pelos cristãos atualmente, em várias partes do mundo. “A nossa época é caracterizada por problemáticas e interrogativos fortes em escala mundial. Vivemos em um tempo em que ressurgem, como uma epidemia nas sociedades, a polarização e a exclusão, como única forma de se resolver os conflitos”, disse Francisco. Ele citou a tragédia dos refugiados que fogem de regiões em guerra e de perseguições.
Quanto à sua elevação a cardeal, dom Sérgio observou: “Entendo que este seu gesto é acima de tudo um modo de ele (o papa Francisco) valorizar e expressar o seu amor pela Igreja no Brasil. Eu já disse a ele que o Brasil, o episcopado brasileiro, o povo brasileiro, se sentem animados por este gesto dele de nomear um cardeal brasileiro”. Dom Sérgio Rocha é o presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).