A Mesa de Unidade Democrática, partido de oposição mais votado na história recente da Venezuela, foi reabilitada pelo CNE (Conselho Nacional Eleitoral) e poderá participar das eleições municipais e estaduais marcadas para 21 de novembro deste ano. A notícia é boa, mas em se tratando do chavismo, todas as decisões devem ser observadas com desconfiança.
A coalizão que venceu as eleições legislativas da Venezuela em 2015 reuniu os principais partidos de oposição na época: Acción Democrática (partido de Henry Ramos Allup), Primero Justicia (partido de Julio Borges), Voluntad Popular (partido de Juan Guaidó e Leopoldo López) e Un Nuevo Tiempo, entre outras legendas opositoras como o Vente Venezuela, de Maria Corina Machado. Porém, a MUD foi inabilitada pelo Tribunal Supremo de Justiça chavista – por ir contra a proibição de "dupla militância", ou seja que não se tratava de um partido e sim de uma coalizão – e posteriormente foi cancelada pelo CNE. Naquele ano, a MUD foi dissolvida e a oposição decidiu não participar das eleições presidenciais por considerá-las fraudulentas. Agora, o CNE devolveu a legenda para o secretário-geral José Luis Cartaya.
“Hoje, por unanimidade, aprovamos um total de 20 novas denominações de organizações com fins políticos, que entrarão em vigor para participar das próximas eleições em 21 de novembro”, afirmou Pedro Calzadilla, presidente do CNE, um órgão reformado recentemente, mas que ainda tem maioria chavista. Ele disse também que cerca de 106 organizações políticas vão participar do pleito.
“Espero que esta reabilitação do MUD funcione como uma espécie de estímulo para que a oposição venezuelana reconstitua uma aliança que se assemelhe à que conquistou em 2015. E isto não se trata apenas de siglas, é uma questão de quais são as características funcionais dessa aliança. A aliança de 2015 tinha uma estratégia democrática compartilhada, um porta-voz em comum e uma liderança coletiva; essas três coisas a oposição não tem desde outubro de 2016”, disse Jesus Torrealba, que fez parte da MUD entre 2015 e 2017, ao jornal venezuelano Efecto Cocuyo.
Analistas apontam que uma união como a que ocorreu em 2015 é difícil de ser replicada porque há setores da oposição, como o movimento liderado por Maria Corina Machado, que não concordam com uma transição de poder negociada com o regime devido à desconfiança – com razão – em relação a Nicolás Maduro. Contudo, há uma possibilidade de entendimento entre algumas lideranças importantes como Guaidó e Henrique Capriles.
A união das forças democráticas dentro do país é considerada fundamental, levando em conta as opções limitadas de articulação da oposição em uma Venezuela onde as instituições foram totalmente dominadas pelo chavismo.
O outro lado
O que Maduro ganharia ao fazer essa concessão? No atual processo de diálogo entre o regime e a oposição – o sexto desde que o chavismo assumiu o poder na Venezuela –, o ditador busca dar pequenos sinais de que está disposto a ceder para barganhar um alívio nas sanções internacionais contra o país. Contudo, William Clavijo, representante da embaixada venezuelana no Rio de Janeiro e membro do Voluntad Popular, alerta: “Nenhuma concessão feita até agora chega perto de ameaçar o controle que eles exercem sobre as instituições venezuelanas”.
A nova composição do CNE é um exemplo. Em maio, o chavismo permitiu que dois nomes indicados pela oposição fizessem parte do órgão, mas, ainda assim, os outros três membros têm fortes relações com a ditadura. Ou seja, o controle sobre o CNE se mantém. A notícia ainda causou atrito entre setores da oposição, que se dividiram entre os céticos e os que comemoraram a decisão como um avanço no processo de redemocratização das instituições venezuelanas.
O analista político venezuelana Piero Trepiccione, coordenador do centro de pesquisa Gumilla, acredita que a reabilitação da MUD também pode ser incluída na lista de ações do regime direcionadas a dividir a oposição. “Maduro procura dividir tanto quanto pode o diversificado mundo da oposição. Sua estratégia é cristalina”, escreveu no Twitter. “A reabilitação da extinta legenda da MUD é um exemplo claro disso. A MUD como tal não existe e uma disputa potencial por ela agora está aberta”, continuou.
Por outro lado, Trepiccione acredita que oportunidades de união entre a oposição ainda existem, com a possibilidade de que surjam novas lideranças no processo. “Maduro claramente aspira manter o controle e abrir mão de alguns espaços em troca de expandir sua margem financeira com menos sanções. A oposição, que também aspira ao poder, deve compreender o que pode alcançar e até onde. E saber reorientar o foco para concentrar forças”.
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