A inflação interanual americana (Índice de Preços ao Consumidor - CPI, na sigla em inglês), que está em 8,2%, supera a inflação brasileira (Índice de Preços ao Consumidor - IPCA), atualmente em 7,17%, de acordo com o Trading Economics e o Austin Rating. Especialistas apontam que um dos principais motivos para essa ultrapassagem econômica histórica foi a antecipação do Banco Central do Brasil ao fenômeno inflacionário mundial, decorrente da pandemia de Covid-19 e da guerra na Ucrânia, enquanto o banco central dos Estados Unidos (Sistema de Reserva Federal - Fed, na sigla em inglês) relutou em elevar os juros para controlar a inflação.
Além disso, enquanto o Brasil controlou os gastos, mesmo fazendo o pagamento do auxílio emergencial, os Estados Unidos passaram do ponto ao injetar mais dinheiro na economia. Agora, a conta chegou: é a maior inflação em 40 anos.
Nelson Souza Neto, professor de direito tributário no UniCuritiba e mestre em direito econômico, comparou as medidas tomadas pelos dois países. “Do lado dos EUA, o excesso de estímulos monetários - os cheques semanais enviados pelo correio às famílias americanas, o aumento extraordinário do agregado monetário M2, que é fruto da impressão descontrolada de dinheiro pelo Fed, e a relutância do Fed em iniciar o processo de aumento de taxa de juros resultaram no inevitável processo inflacionário que se vê hoje”, descreveu o professor.
Por outro lado, o BC do Brasil elevou a taxa básica de juros da economia antes do fenômeno inflacionário global, contendo a disparada de preços. “Os preços subiram, mas bem menos do que no resto do mundo”, analisou Neto.
Guilherme Moura, professor de economia da Universidade Positivo e doutor em desenvolvimento econômico, destacou que esse é “o resultado da escolha econômica e social dos americanos”. Especialmente, da grande injeção de dinheiro para manter a economia girando, mas que passou do ponto.
Os períodos de lockdown durante a pandemia levaram a uma diminuição da produção e o consequente aumento da demanda, que resultou na alta dos preços. A escolha expansionista do governo americano acabou agravando essa alta dos preços, gerando pressão inflacionária. Ela fez com que o Fed lançasse mão, enfim, após longa resistência, de ajustes na taxa básica de juros. “Os Estados Unidos e a Europa chegaram um pouco atrasados nesse aumento de juros, mas agora estão usando a resposta padrão”, apontou Moura.
O aperto monetário do Fed foi uma elevação de suas taxas de zero, em março, para mais de 3% em setembro. Essa mudança ainda não produziu grandes efeitos na alta dos preços.
Insistência da inflação e risco de recessão
“Existe hoje, nos Estados Unidos, uma insistência da inflação, apesar de agora estar um pouco menor do que em junho, por exemplo, quando atingiu 9,1% de aumento anual”, analisou Alan da Fonseca, diretor de operações do Grupo Integrado de Campo Mourão e mestre em administração e finanças corporativas.
Ele destacou a alta dos preços na alimentação, que apresentaram no mês passado um crescimento de 0,8%, além de um aumento nos custos de acomodação, cuidados médicos, gás natural e eletricidade.
Para Jason Furman, economista de Harvard e ex-assessor econômico de Barack Obama, o pico da inflação pode ter sido atingido neste mês. Ele lembrou que o caminho é longo para encontrar a taxa ideal para o Fed nessa tentativa de controle da inflação. “Há muitos números abaixo de 7%, mas ainda acima de 2% ou 3%”, tuitou Furman.
Ainda não é o pior cenário: o banco central americano está tentando recuperar o atraso e planeja aumentar as taxas para 4,25% até dezembro. Como o desempenho da economia foi negativo nos dois primeiros trimestres, a preocupação agora é o risco de recessão. O impacto será global.
"Destruir empregos e esmagar os salários de milhões de trabalhadores é imprudente e perigoso. A recessão não é a solução para a inflação", avaliou o alto representante da União Europeia para as Relações Exteriores, Josep Borrell. "Todos são forçados a fazer o mesmo ou a moeda fica desvalorizada. Todo mundo está correndo para aumentar as taxas de juros, e isso levará a uma recessão global", alertou o líder internacional.
Aumento das aposentadorias vai pesar no bolso do trabalhador
Para acompanhar a alta dos preços, o governo de Joe Biden anunciou na quinta-feira (13) que aposentados americanos se beneficiarão em 2023 do maior aumento nominal na aposentadoria por repartição desde 1982: um crescimento de 8,7%, ou US$ 145 (quase R$ 766) por mês, após um crescimento de 5,9% em 2022. “Isso ajuda os idosos a terem um pouco mais de liberdade para lidar com a inflação”, disse o presidente americano.
Os cerca de 70 milhões de aposentados americanos receberão, em média, US$ 1.814 (R$ 9.581) por mês no próximo ano, em comparação com US$ 1.669 (R$ 8.815) em 2022.
Existe uma pensão de repartição nos Estados Unidos, criada em 1935, como parte do New Deal, por Franklin Delano Roosevelt, e administrada pela Previdência Social. Financiada por um imposto de 12,4% sobre os salários, representa cerca de metade dos rendimentos dos pensionistas e está indexada ao custo de vida desde 1975.
Em resumo, os empregados é que vão pagar a conta. No último ano, eles tiveram um aumento nominal em seus salários semanais de 4,1%, mas uma queda real de 3,8%. Uma situação que dificilmente será revertida em breve.
Cenário econômico desfavorável a Biden
Poucas semanas antes das eleições de meio de mandato no país, o cenário não é favorável a Biden e aos democratas. Investidores estão vendo o enfraquecimento da bolsa, as famílias estão experimentando o dobro das taxas de hipoteca e se preparando para um crash imobiliário; Wall Street está em alerta para um possível choque financeiro, com a inadimplência de investidores privados superendividados, e, por fim, parceiros dos Estados Unidos, como o Reino Unido, sofrem com a alta do dólar e não conseguem mais financiamento.
Nesse contexto, o campo republicano dispara contra a gestão do presidente. "O pesadelo da inflação de Biden destrói a sua poupança para a aposentadoria", acusou na sexta-feira (14), em sua newsletter matinal, Sean Hannity, apresentador da Fox News.
O presidente dos Estados Unidos, no entanto, não demonstra constrangimento. “Os americanos estão preocupados com o custo de vida: isso é verdade há anos, e eles não precisavam do relatório de hoje para saber disso", tuitou o presidente na sexta-feira. "É fundamental trabalhar para dar às famílias de classe média um respiro para que possam pagar suas despesas”, concluiu o presidente.
Em seguida, Biden citou a inflação como um fenômeno global e enalteceu "o excelente desempenho do mercado".
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