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Ecossistema

Pererecas ajudam a achar "fábricas de espécies" da mata atlântica

As espécies estudadas pelos pesquisadores: as pererecas Hypsiboas semilineatus | Ana Carnaval/Divulgação
As espécies estudadas pelos pesquisadores: as pererecas Hypsiboas semilineatus (Foto: Ana Carnaval/Divulgação)
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Hypsiboas albomarginatus

e Hypsiboas faber |

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e Hypsiboas faber

Graças às pistas deixadas por três espécies de pererecas, biólogos brasileiros e americanos conseguiram determinar quais as áreas da mata atlântica que precisam ser estudadas e salvas a todo custo, as regiões mas importantes para a diversidade da vida nesse ecossistema riquíssimo. A má notícia é que esse "refúgio", como os cientistas o chamam, fica principalmente na Bahia e em pedaços de Minas, Espírito Santo e Rio de Janeiro - justamente algumas das regiões mais ameaçadas da floresta.

O refúgio em questão, aliás, não apenas é o mais ameaçado como também é a fatia da mata que, por enquanto, recebeu menos recursos financeiros e menos atenção dos cientistas. O trabalho coordenado pela brasileira Ana Carolina Carnaval, da Universidade da Califórnia em Berkeley, pode ser um empurrão importante para reverter esse quadro, até porque ele acaba de ser publicado na americana "Science", uma das principais revistas científicas do mundo.

Para localizar essa área-chave no mapa da mata atlântica, Carnaval e seus colegas, como Célio Haddad, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro e Miguel Trefaut Rodrigues, da USP, usaram um raciocínio engenhoso. Há indícios de que a mata atlântica andou espichando e encolhendo nas últimas dezenas de milhares de anos, em flutuações ligadas ao auge do Pleistoceno, a Era do Gelo (evento há cerca de 20 mil anos), quando o clima se tornou muito seco, e à fase mais úmida depois da glaciação, há cerca de 6.000 anos. Esses extremos corresponderiam à mínima e à máxima extensão da mata.

Ora, mesmo durante esses momentos opostos, algumas regiões permaneceram o tempo todo cobertas com mata atlântica (e não transformadas em campos ou cerrado, por exemplo). A ideia é que justamente essas regiões são mais ricas em espécies e diversidade genética dentro das espécies, porque elas funcionavam de refúgio para os bichos que não conseguiam viver em outros locais quando a mata encolhia. Os animais nas áreas que não fazem parte do refúgio deveriam ser, portanto, quase "colonos" ou "imigrantes". E o padrão esperado seria muita diversidade genética dentro dos refúgios e pouca fora deles, simplesmente porque não houve tempo de os "imigrantes" se diferenciarem muito da população ancestral.

Na mosca

Foi exatamente esse padrão que emergiu do estudo das pererecas do gênero Hypsiboas. Após obter delas o DNA mitocondrial, ou mtDNA (presente nas mitocôndrias, as usinas de energia das células), os pesquisadores viram que o padrão de diversidade genética casa justamente com a ideia dos refúgios. Como estamos falando de três espécies diferentes, a confiabilidade dos dados aumenta, disse Carnaval ao G1. Segundo ela, também há pistas do mesmo fenômeno com lagartos, aves e mamíferos.

O trabalho pode até reabilitar em parte a chamada teoria dos refúgios, que via fenômenos parecidos no surgimento da diversidade da Amazônia, por exemplo, e andava desacreditada. "O que os nossos resultados estão mostranto é que grande parte da diversidade nos animais que estudamos originou-se antes do Pleistoceno. Entretanto, e essa é a mensagem-chave, as mudanças climáticas que ocorreram durante o Pleistoceno tiveram consequências muito importantes no tocante à distribuição dessa diversidade. Elas ajudam a gente a entender como e onde está distribuída grande parte da diversidade genética atual das nossas espécies", explica ela.

Se o método mostrou, com pouca margem para dúvida, as áreas prioritárias para conservação da mata atlântica, também pode se tornar uma ferramenta valiosa para outros locais, diz a bióloga. "Acho que o método é relativamente simples de ser implementado e baseia-se no sequenciamento de DNA mitocondrial, que é muito mais simples, fácil e barato em relação ao sequenciamento de genes nucleares [do núcleo da célula], por exemplo. Assim como ele está ajudando no entendimento dos processos responsáveis pela distribuição da biodiversidade brasileira, acredito que possa auxiliar e ser implementado como ferramenta para a identificação de áreas prioritárias para pesquisa e conservação em outras áreas tropicais altamente impactadas e relativamente pouco estudadas", conclui ela.

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