A Europa tem consciência de que, a qualquer momento, a Rússia pode cortar o gás que envia aos países do continente. Essa será, provavelmente, mais uma resposta do presidente russo, Vladimir Putin, às sanções feitas pelo Ocidente depois da invasão à Ucrânia.
Prevendo um inverno rigoroso e com energia em falta, os principais países europeus se organizam para elencar quais são os setores da indústria que não poderão parar e aqueles que precisarão ser suspensos temporariamente.
“A Rússia usa energia como arma. E, assim, em qualquer situação, seja um corte parcial e importante do gás russo ou um corte completo, a Europa deve estar pronta”, disse, em julho, Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia.
Nem todos os países da Europa, no entanto, concordam com as propostas de controle do gasto de energia. Existem divergências entre a possibilidade e a disponibilidade de reduzir o consumo. Os que insistem em medidas radicais são aqueles que já estão sofrendo com a redução do envio de gás russo.
Setores prioritários e setores que poderão parar
Os Estados membros tentaram traçar, juntos, quais setores são prioritários e deverão continuar funcionando mesmo em caso de um corte maior da Rússia. Além de começarem a listar as áreas que poderão parar temporariamente.
A saúde e o setor farmacêutico, segurança, alimentação, refinarias, fertilizantes e a produção de eletricidade devem continuar a funcionar normalmente em caso de escassez, segundo o executivo europeu.
Partes da indústria química que abastecem os sistemas alimentares e de saúde, e setores da indústria têxtil necessários à produção de cuidados de saúde e defesa também entram na lista prioritária.
Por outro lado, para Phuc-Vinh Nguyen, pesquisador do Instituto Jacques Delors, o setor de luxo e o do automóvel serão os primeiros a parar.
"A produção de carros, que consome muita energia, provavelmente não será considerada como uma prioridade no caso de uma onda de frio neste inverno. Isso terá um impacto em particular na indústria alemã, que domina o mercado europeu”, explicou Nguyen ao periódico Le Figaro.
Ele ainda apontou que, no ramo alimentício, fábricas que preparam arroz ou macarrão, por exemplo, entram na lista de prioridade, mas a produção de bombons e produtos não essenciais poderá ser suspensa.
Já Ricardo Fernandes, analista de riscos da ARP Digital, acredita que os setores que mais sofrerão com as represálias russas serão de petroquímica, química e fertilizantes, apesar deste último ter sido listado como prioritário pelo comando da União Europeia. “Algumas fábricas de fertilizantes já estão fechando na Europa pela falta de gás e isso deve continuar acontecendo”, analisou.
E se o setor automobilístico alemão parar?
Para Fernandes, o principal problema relacionado a um possível corte de gás russo é a desestruturação de sistemas altamente dependentes da exportação russa, como a Alemanha. Importar gás de outros países encareceria e inviabilizaria o sistema comercial alemão e não existe, por enquanto, preparação para trocar toda a fonte de energia. Essa situação coloca o país que tem a maior economia do euro à beira da recessão.
Nos últimos meses, as remessas do gasoduto Nord Stream, que transporta o gás russo diretamente para a Alemanha através do mar Báltico, caíram 60%. Pela primeira vez desde 1991, o país registrou déficit no comércio exterior em maio. Enquanto o preço dos hidrocarbonetos está subindo, a crise energética coloca em evidência todas as suas escolhas questionáveis, como o fechamento de usinas nucleares.
A indústria automobilística alemã é responsável por 13% do PIB do país, mas o setor está de mal a pior desde o início da pandemia de Covid-19 e foi ainda mais atingido pela invasão russa à Ucrânia. As exportações também estão sofrendo com novas dificuldades de fornecimento. Volkswagen, Porsche e BMW estão muito expostas à escassez de sistemas de fiação elétrica que são importados da Ucrânia.
Se o setor paralisar, sendo tão importante para o equilíbrio econômico alemão, todo o sistema estará ainda mais comprometido, com demissões em massa e redução de consumo, atingindo também outros setores do país.
Um relatório divulgado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) em julho estimou que o PIB alemão cairia cerca de 3% no caso de um corte total de gás russo. Em países menos dependentes do combustível da Rússia, como a Espanha e a França, o efeito seria menor, e a queda do PIB seria de cerca de 1%.
De acordo com o FMI, os países mais atingidos seriam, nesta ordem: Hungria, Eslováquia, República Tcheca, Itália, Alemanha, Áustria, Romênia, Eslovênia, Croácia, Polônia e Holanda.
Cortes russos
Os russos forneceram aos europeus cerca de 150 bilhões de metros cúbicos de gás em 2021, o que representa 40% das importações da União Europeia.
A Rússia reduziu a exportação para a Europa a menos de um terço do que enviava no começo do ano, disparando os preços. Doze Estados membros estão parcial ou totalmente isolados do gás russo.
Apesar de nem todos os países terem como modelo de negócio a importação de gás russo, a necessidade de economia de energia entrou em pauta nas principais reuniões da UE, em uma preparação para o próximo inverno, quando a demanda por energia aumentará e o combustível poderá faltar.
Países como Portugal e Espanha, por exemplo, que não têm uma economia dependente da energia russa, ficaram contra o que foi proposto pela Comissão Europeia, de redução do consumo em 15%.
Os europeus têm até o final de setembro para apresentar, separadamente, quais planos podem ser tomados em cada país para evitar um colapso no próximo inverno, que começa em dezembro no hemisfério norte.
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