Sebastián Piñera teve uma semana atribulada. No último domingo, o empresário de centro-direita venceu as eleições presidenciais do Chile, encerrando uma hegemonia de duas décadas da coalizão de centro-esquerda da Concertação. No dia seguinte, recebeu em sua casa a presidente Michelle Bachelet, quando tomaram um cordial café da manhã, seguindo as tradições do país. No meio da semana, porém, Piñera já recebia duras críticas pela demora em se desfazer de milionários investimentos, que aliás valorizaram bastante durante a campanha e após sua eleição. Segundo analistas chilenos, a suposta confusão entre as esferas pública e privada pode ser uma fonte de críticas ao líder eleito.
A fortuna de Piñera, de 60 anos, foi estimada em US$ 1 bilhão pela revista Forbes, em um ranking divulgado em novembro passado. Economista com doutorado em Harvard, ele foi um pioneiro do setor de cartões de crédito no país, é dono do mais popular time de futebol chileno, o Colo-Colo, de uma rede de tevê e ainda tem uma fatia de 26% da companhia aérea LAN.
O fato de ele não ter deixado o controle de seus negócios antes das eleições, porém, tem resultado em fortes críticas. O ministro da Fazenda, Andrés Velasco, atacou a situação, após o valor dos papéis de Piñera na Bolsa de Santiago subir mais de 130% desde as eleições (na campanha, já haviam ganhado outros 30%). O grupo de Piñera rebateu, garantindo que o líder eleito se desfará da maior parte de seus investimentos, inclusive da fatia na LAN, o mais breve possível.
A direita chilena está longe do poder há 20 anos, durante os quais a Concertação governou, desde o fim da ditadura do general Augusto Pinochet (1973-1990). Mais do que isso, desde 1958 a direita não ganhava uma eleição presidencial no país.
"O fantasma maior para Piñera não é Pinochet, mas sim ser comparado a Berlusconi", afirma o cientista político Patricio Navia, referindo-se ao primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi, várias vezes acusado de se valer da política para consolidar sua fortuna. Professor da Universidade de Nova York, Navia defende que o presidente eleito se livre logo de seus negócios, mas lembra que já houve acusações no passado de que Piñera teve problemas para separar as duas esferas.
Moderação
Piñera venceu no domingo passado o segundo turno das eleições chilenas, batendo o ex-presidente Eduardo Frei (1994-2000). Mesmo com aprovação na casa dos 80%, Bachelet não conseguiu fazer seu sucessor.
Os analistas ouvidos esperam um início de governo cauteloso, após Piñera assumir em 11 de março. A expectativa é a de que não haja mudanças radicais. "Trata-se da mesma rota, mas com um piloto diferente", compara Navia. "A mudança será muito mais de ênfase que de profundidade."
Morales também prevê cautela. "Não imagino grandes reformas no primeiro ano", diz. Segundo ele, o esforço inicial deve se concentrar em um dos principais temas da campanha: o combate à violência e à corrupção. Além disso, Piñera prometeu manter o sistema de proteção social no país. Para mudanças mais profundas, porém, terá que negociar com o Congresso, onde não possui maioria.