Em junho, a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, fez um anúncio no Conselho Municipal que dividiu opiniões entre os políticos da cidade: a criação de um comitê para avaliar a possibilidade de a população parisiense (continuar a) conviver com os mais de 6 milhões de ratos espalhados pelas ruas e comércios da capital francesa.
A decisão foi tomada após os constantes apelos de organizações de proteção aos animais e de partidos de esquerda envolvidos com a causa, que defendem alternativas mais amenas, que não o extermínio dos roedores.
Entre as opções apresentadas, estão o uso de contraceptivos orais, para reduzir a fertilidade da praga, e a adoção de mais lixeiras fechadas pela cidade, que hoje mantém apenas cerca de 10% delas tampadas, de acordo com a própria prefeitura.
A vice-prefeita, Anne Souyris, membro do Partido Ecologista Francês e responsável pela saúde pública, será a líder do comitê, que deve identificar soluções para o impasse. Segundo afirmou durante a reunião no órgão municipal, ela pretende “descobrir como os moradores podem ‘coabitar’ com os ratos, sem que a população seja mais afetada por isso”.
O anúncio da socialista causou alvoroço no Conselho de Paris. Partidos de oposição acusam a prefeita de não dar a devida atenção a um problema de saúde pública.
O subprefeito de um dos distritos da capital, Geoffroy Boulard, é um defensor do extermínio dos ratos. Para ele, a decisão é apenas uma maneira de mascarar a falta de investimento na saúde pública parisiense.
Os milhões de roedores espalhados pela capital francesa são um problema antigo, sendo encontrados nos metrôs, em pontos turísticos como a Torre Eiffel, em parques abertos e em restaurantes, onde conseguem achar alimento fácil, com o alto fluxo de pessoas.
De acordo com dados recentes da Academia Nacional de Medicina, Paris possui, hoje,1,5 rato para cada habitante, ou seja, há mais roedores do que pessoas na cidade.
Organizações de proteção aos animais comemoraram a decisão como uma luta de anos. Para a cofundadora da ONG Animaux Zoopolis, Amandine Salvisens, que participou da reunião no conselho, investir no extermínio dos ratos é “ineficaz e cruel”, como projetos políticos anteriores teriam demonstrado.
Problema histórico
Paris, assim como outros grandes centros urbanos, tem um histórico de problemas com roedores. No ano em que assumiu a prefeitura, em 2014, Hidalgo prometeu um plano de “desratização” de Paris, com investimentos de 1,5 milhão de euros.
No entanto, após nove anos de sua gestão, a situação não mostrou melhora, com episódios de fechamento de parques e jardins na capital francesa devido à infestação de roedores em 2016.
Em março deste ano, uma greve dos garis na cidade contribuiu, mais uma vez, para o agravamento do problema, uma vez que alimentos ficaram expostos nas lixeiras e nas ruas por mais tempo.
Segundo o jornal francês Le Figaro, o tipo de rato que vive nas ruas de Paris não é o mesmo que transmite a peste bubônica, mas é transmissor da leptospirose e toxoplasmose.
Um comunicado da Academia Nacional de Medicina explicou que esses roedores são uma espécie mais perigosa por causa de sua adaptabilidade ao ambiente, da rápida reprodução e das doenças que são capazes de transmitir, por vírus, bactérias ou parasitas.
Mesmo assim, alguns partidos levam a questão para o lado ideológico, inclusive com petições contra o combate dos ratos.
Em 2016, após a socialista anunciar um novo plano de controle da praga, um abaixo-assinado com 17 mil assinaturas foi enviado à prefeitura, contrariando a política de “genocídio dos roedores”.
Prefeita apoiadora de Lula
A socialista Anne Hidalgo é uma admiradora do presidente Lula. Em outubro de 2019, concedeu a ele o título de cidadão honorário da capital francesa, ocasião na qual o petista, condenado em segunda instância por corrupção pela Operação Lava Jato, ainda estava preso, em Curitiba.
Após ser solto, ele recebeu a honraria em mãos durante uma visita a Paris, viagem feita ao lado de Dilma Rousseff e Fernando Haddad.
O petista foi homenageado durante uma sessão do Conselho de Paris por seu “engajamento na redução de desigualdades sociais e econômicas” no Brasil.