O prelado católico que liderou a campanha para canonizar o falecido papa João Paulo 2º isentou o pontífice nesta terça-feira (22) das acusações de que ele fez vista grossa a um dos maiores escândalos de abuso sexual da Igreja.
As vítimas de abuso sexual criticaram de imediato a defesa de João Paulo 2º, que morreu em 2005 e será canonizado em uma cerimônia neste final de semana, assim como o papa João 23, que liderou o Vaticano entre 1958 e 1963.
Embora o falecido papa polonês seja quase universalmente saudado por ter auxiliado na derrocada do comunismo, seus críticos dizem que ele demorou para entender a seriedade da crise de abusos sexuais que emergiu perto do final de seu pontificado.
Mais especificamente, seus críticos vêm pressionando o Vaticano a respeito do que o papa sabia sobre os abusos do padre Marcial Maciel, o mexicano fundador de uma ordem religiosa católica caída em desgraça, os Legionários de Cristo.
Durante anos, Maciel viveu uma vida dupla como pedófilo, abusador de mulheres e viciado em drogas enquanto comandava a ordem que criou, e era tido como o exemplo de um líder religioso notável. A ordem tinha muitos benfeitores ricos e conservadores que a viam como um bastião contra o liberalismo na igreja.
"Não há sinal de envolvimento pessoal do Santo Padre nesta questão", disse o monsenhor Slawomir Oder quando indagado se o papa sabia das más ações de Maciel.
Oder, também polonês e o grande porta-estandarte da canonização de João Paulo 2º, afirmou que documentos estudados durante a investigação de santidade deram "uma resposta muito clara" isentando o papa de culpa pessoal no caso Maciel.
Durante anos, a ordem mundial desfrutou do apoio do papa, e o Vaticano descartou acusações de seminaristas de que Maciel os abusou sexualmente, alguns deles quando tinham 12 anos.
João Paulo 2º apoiou Maciel firmemente, mesmo quando as críticas ao padre cresciam.
O que o papa sabia?
Os defensores de João Paulo 2º vêm dizendo que, embora seus auxiliares possam ter sabido que as alegações eram verdadeiras, ocultaram muitas informações do pontífice, que acreditava serem parte de um complô contra a Igreja, semelhante àquelas das autoridades comunistas de sua Polônia nativa durante a Guerra Fria.
Os críticos do papa contestam essa versão.
"Os papas não podem deter grande poder e se eximir da responsabilidade por grandes equívocos só porque seus auxiliares podem tê-lo protegido cuidadosamente dos detalhes sórdidos", afirmou a entidade Rede de Sobreviventes de Vítimas de Abusos de Padres (Snap, na sigla em inglês), sediada nos Estados Unidos, em um comunicado.
Em 2006, um ano após a morte de João Paulo 2º, uma nova investigação do Vaticano concluiu que as acusações de molestações - anteriormente negadas - eram verdadeiras. O papa Bento 16 ordenou que Maciel se recolhesse para uma vida de "oração e penitência".
Maciel morreu em 2008, e depois de sua morte investigações revelaram que ele também foi pai de várias crianças com pelo menos duas mulheres diferentes, visitava-as regularmente e lhes enviava dinheiro. Ele ainda molestou seus próprios filhos.
"O Vaticano está se esquivando. O homem está se tornando um santo, então por que esconder a verdade?", disse Jason Berry, co-autor do livro Votos de Silêncio, de 2004, que expôs o histórico de abusos de Maciel.