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O príncipe Charles, futuro rei dos britânicos, aceitou uma doação de um milhão de libras esterlinas (mais de seis milhões de reais na cotação atual) da rica família saudita de Osama bin Laden, segundo o jornal The Sunday Times. A família hoje é chefiada pelo patriarca Bakr bin Laden, meio-irmão de Osama — que planejou os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 às torres gêmeas do World Trade Center e foi morto por forças especiais americanas em 2011 no Paquistão.
Outro meio-irmão de Osama, Shafiq, também estaria envolvido na doação. O pai dos três sauditas era Mohammed bin Awad bin Laden, um bilionário da construção nascido no Iêmen e morto num acidente de avião em 1967. Não há indicativos de que Bakr e Shafiq tenham financiado ou participado de atos terroristas, como fez Osama.
A transação teria acontecido na Clarence House, uma residência da família real no bairro de Westminster em Londres, no ano de 2013. Charles, príncipe de Gales, hoje com 73 anos, se encontrou na época com Bakr secretamente, que então transferiu o dinheiro para a Fundação de Caridade do Príncipe de Gales (PWCF).
Citando fontes anônimas, o jornal alega que muitos dos assessores do príncipe o teriam aconselhado contra aceitar o dinheiro e alguns imploraram para devolvê-lo, mas foram ignorados pelo membro da realeza. As fontes anônimas alegam que Charles sentia que seria muito constrangedor devolver o dinheiro. Bate-bocas a respeito da questão teriam acontecido, encerrados a grito pelo príncipe.
A administração da Clarence House rebate as alegações das fontes do jornal e nega que houve bate-boca. Não nega a doação, mas diz que foram membros do conselho da fundação, não o príncipe em pessoa, que a aceitaram. O presidente atual da PWCF, Sir Ian Cheshire, disse ao Sunday Times que a doação foi aprovada por unanimidade pelos cinco conselheiros na época. Somente um teria levantado dúvidas a respeito, mas seguiu os outros ao aprová-la. Cheshire lamenta que 40 anos de contas limpas da PWCF, envolvendo mais de 70 milhões de libras aplicadas em diferentes causas, sejam eclipsados por “sugestões infundadas”.
Não é a primeira vez que Charles enfrenta críticas na imprensa britânica por sua proximidade com dinheiro de bilionários do Oriente Médio. No mês passado, o mesmo jornal noticiou que o príncipe aceitou um milhão de euros em dinheiro vivo em uma mala do ex-premiê do Catar Hamad bin Jassim bin Jaber Al Thani, conhecido como HBJ. Há denúncia em tribunal britânico que o escritório de HBJ teria sido intermediário de dinheiro repassado para célula do grupo terrorista Al-Qaeda, fundado por Osama, na Síria. HBJ tem várias propriedades em Londres e é dono do time de futebol Paris Saint-Germain.
Um ano antes, Charles concedeu uma honraria, a Excelentíssima Ordem do Império Britânico, a outro magnata saudita de nome Mahfouz Marei Mubarak em uma cerimônia privada no Palácio de Buckingham. A honraria teria sido comprada com doações. A questão está sendo investigada pela Polícia Metropolitana de Londres.
Ser meio-irmão de Osama Bin Laden não é algo tão raro na Arábia Saudita quanto pode parecer à primeira vista. Seu pai Mohammed, falecido quando Osama tinha 10 anos, teve 22 esposas e 52 filhos. O atual patriarca Bakr é responsabilizado por 100 mortes, mas não por terrorismo: houve um acidente em 2015 em um de seus projetos de construção. Ele passou pouco mais de um ano na cadeia, incluindo todo o ano de 2018, acusado de corrupção pelo governo saudita. Foi libertado em janeiro de 2019, em meio à pressão internacional sobre o príncipe saudita Mohammed bin Salman por causa do assassinato e esquartejamento do jornalista Jamal Khashoggi no consulado da Arábia em Istambul por 15 agentes sauditas. Charles e Bakr já estiveram no centro das polêmicas da coroa antes. Eles se encontraram duas semanas após o ataque terrorista de 2001 para conversar sobre a fé muçulmana. Conheceram-se no ano 2000 por causa do Centro de Estudos Islâmicos em Oxford, apresentados um ao outro por um príncipe saudita. A família Bin Laden distanciou-se de Osama há décadas.