A eleição presidencial de novembro nos Estados Unidos ganhou um novo ingrediente nesta terça-feira (11), quando um júri em Delaware considerou Hunter Biden, filho do presidente Joe Biden, culpado de acusações de que teria comprado e mantido em sua posse uma arma de fogo quando era viciado em drogas, um crime federal. A sentença, que será anunciada posteriormente, pode chegar a 25 anos de prisão.
Hunter Biden será julgado ainda este ano em outro processo, na Califórnia, onde foi acusado de não pagar US$ 1,4 milhão em impostos entre 2016 e 2019. O julgamento foi marcado para setembro.
Joe Biden tem tentado se desvincular dos problemas judiciais do filho, ao afirmar que não lhe concederá perdão presidencial. Entretanto, a dúvida permanece: qual será o impacto político da condenação (ou condenações) de Hunter na eleição de novembro?
Em setembro do ano passado, quando ele foi indiciado no caso da arma, numa pesquisa da Universidade de Monmouth, 2% dos eleitores que apoiavam Joe Biden disseram que os problemas judiciais do filho poderiam fazê-los deixar de votar no presidente democrata.
“É um percentual pequeno, mas numa eleição tão acirrada, num país tão dividido quanto os Estados Unidos, qualquer pequena alteração pode fazer uma diferença”, afirmou Ricardo Bruno Boff, professor de relações internacionais da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), em entrevista à Gazeta do Povo.
Outra questão indefinida é se a campanha de Donald Trump, adversário de Biden em novembro, vai explorar politicamente os problemas judiciais de Hunter.
Na terça-feira, sua direção de campanha afirmou em comunicado que o julgamento em Delaware “nada mais foi do que uma distração dos crimes reais da Família do Crime Biden, que obteve dezenas de milhões de dólares da China, Rússia e Ucrânia”, numa referência aos negócios de Hunter Biden no exterior quando seu pai era vice-presidente (2009-2017).
Boff acredita que o republicano terá cautela em utilizar os atuais processos contra o filho de Biden como arma eleitoral, porque ambos não estão relacionados diretamente à atuação política do presidente.
Porém, na visão do analista, tudo muda de figura se a investigação sobre os negócios de Hunter Biden no exterior que está sendo realizada pelos republicanos na Câmara evoluir para um processo criminal e uma condenação.
“Se houver uma condenação ligada a tráfico de influência [os republicanos acusam Hunter de ter se beneficiado da posição do pai como vice-presidente em seus negócios], aí fica um ponto de desequilíbrio a favor do Trump, porque seria uma condenação ligada à gestão do Biden [como vice-presidente], aí, sim, os republicanos explorariam com mais força”, explicou Boff.
“E se o Hunter vier a ser absolvido nesse caso, o Trump pode explorar também e falar que ele [Trump] foi condenado e que há perseguição, a Justiça é favorável aos Biden”, acrescentou o analista.
Porém, há duas dificuldades para os republicanos nesse caso. A primeira é que, a menos de cinco meses da eleição, dificilmente haverá tempo para que a investigação vire um processo e o caso vá a julgamento antes da votação.
A segunda é que a investigação dos republicanos perdeu força em fevereiro deste ano, quando foi revelado que um informante, indiciado por supostamente mentir ao FBI em 2020 ao dizer que Joe Biden recebeu US$ 5 milhões de propina de uma empresa da Ucrânia devido aos negócios do filho, teria espalhado “desinformação” sob orientação da Rússia.
Qualquer que seja o cenário, a eleição deste ano tem componentes inéditos na história política dos Estados Unidos: nunca o filho de um presidente americano em exercício havia sido condenado criminalmente, e nunca um ex-presidente do país havia sido considerado culpado num processo criminal.
Boff acredita que essa judicialização da política, independentemente do mérito dos casos em questão, deve mobilizar eleitores engajados nos dois polos do espectro político, mas pode afastar o eleitor mais ao centro e/ou indeciso, que é o que costuma decidir o pleito presidencial americano.
“Pode haver uma decepção entre os eleitores mais centristas, mais cautelosos, mais nostálgicos ou defensores de uma posição dos Estados Unidos menos polarizados, que viam até alguns anos atrás uma conduta muito parecida entre republicanos e democratas em vários aspectos, inclusive na política externa, e que ao ver uma cisão desse tamanho, começam a se apavorar com os perigos desse país, não de entrar numa guerra civil, que é algo meio exagerado, mas num nível de divisão social e política de tal proporção que acabe prejudicando a liderança dos Estados Unidos no mundo, que já vem decaindo”, destacou.