Dezenas de milhares de porto-riquenhos foram às ruas da capital San Juan para exigir a renúncia do governador Ricardo Rosselló em meio a alegações de corrupção e após a revelação de mensagens trocadas entre Rosselló e seu círculo próximo em um grupo de Telegram - o escândalo está sendo chamado de "Ricky Leaks". Os protestos, cada vez mais intensos, são uma consequência da indignação generalizada que tem desafiado a já frágil credibilidade do seu governo.
A mobilização contra Rosselló, um político de 40 anos que se recusou a deixar a mansão do governador, conhecida como "La Fortaleza", é uma das maiores demonstrações de repúdio público da história do governo de Porto Rico, um território dos Estados Unidos no Mar do Caribe. Artistas porto-riquenhos têm se juntado aos protestos. O cantor Ricky Martin condenou comentários vulgares feitos sobre ele pelos oficiais nas mensagens vazadas e apoiou o apelo da população pela saída do governador, e o músico de reggaeston Bad Bunny interrompeu uma turnê na Europa para participar das manifestações.
A frustração vem crescendo há anos. Décadas de incompetência fiscal e estagnação econômica levaram ao aumento da dívida pública e à falência do território. Entenda as causas dos protestos:
As consequências devastadoras do Furacão Maria
Em setembro de 2017, o Furacão Maria atingiu toda a ilha de Porto Rico, causando falta de eletricidade durante meses, destruindo a frágil estrutura do estado e fazendo com que habitantes procurassem refúgio em outros estados americanos. A resposta lenta das autoridades locais e federais agravou a falta de água potável, medicamentos e alimentos. Estima-se que 3 mil pessoas tenham morrido em consequência do forte ciclone tropical.
Calcula-se também que 4% da população deixou Porto Rico em 2018. Desde 2008, a população do território diminuiu 15%.
O Congresso americano alocou cerca de US$ 42,5 bilhões em ajuda humanitária, mas Porto Rico recebeu apenas US$ 13,6 bilhões, segundo o governo federal americano.
Crises políticas
Nas últimas semanas, Rosselló tem enfrentado uma série de crises políticas provocadas por investigações de corrupção do FBI e acusações públicas de um ex-secretário de gabinete de que o governo de Rosselló é uma "máfia institucional" que vende influência por meio de extorsão, suborno e fraude.
No dia 10 de julho, dois ex-oficiais do governo de Rosselló e outras quatro pessoas foram presos em uma investigação sobre corrupção, acusados de roubo, lavagem de dinheiro e fraude eletrônica. Os ex-funcionários do governo são acusados de desviar dinheiro federal para empreiteiros no valor de US$ 15,5 milhões entre 2017 e 2019.
O pai de Ricardo Rosselló, Pedro Rosselló, atuou como governador de 1993 a 2001 e seu mandato também foi marcado por uma série de escândalos e prisões.
O conteúdo das mensagens vazadas
Na semana passada, o Centro de Jornalismo Investigativo de Porto Rico publicou cerca de 900 páginas de comentários feitos por Rosselló e seus assessores mais próximos em um grupo privado do aplicativo Telegram, de mensagens por telefone celular. O grupo de 12 homens ridicularizou mulheres políticas, celebridades e jornalistas com insultos sexistas e homofóbicos. O comentário considerado mais ofensivo pelos manifestantes foi uma piada sobre corpos se empilhando nos necrotérios após a passagem do furacão.
Os membros do grupo falavam abertamente sobre manipulação de cobertura da mídia, como sacanear seus adversários nas mídias sociais e a organização de retaliações políticas, que alguns especialistas dizem que exigem uma investigação criminal.
O conteúdo depreciativo das mensagens foi a gota d'água para os porto-riquenhos.
Como os protestos se tornaram violentos
Porto-riquenhos se reuniram em protestos pacíficos em Nova York, Orlando, Barcelona e outras cidades. Mas os protestos na ilha se tornaram caóticos e violentos nesta semana. Milhares de manifestantes foram para as ruas estreitas da cidade antiga de San Juan, colando cartazes que diziam "Ricky Renuncia!" em prédios do governo.
Policiais da tropa de choque atiraram bombas de gás lacrimogêneo para dispersar as multidões de jovens mascarados na praça do centro da cidade, onde eles tentavam ajudar a tratar os que foram atingidos por balas de borracha.
Resposta do governador
Rosselló perdeu quase todo o seu apoio público. Congressistas democratas, os líderes de Porto Rico na Câmara e no Senado, grupos religiosos e praticamente todas as figuras importantes de seu partido no estado o encorajaram a renunciar.
Em uma coletiva de imprensa na terça-feira, Rosselló resistiu aos pedidos de renúncia e disse que as acusações de corrupção na sua administração são uma praga que afeta todas as sociedades. Ele não disse se tentaria a reeleição em 2020.
O governador afirmou em um comunicado nesta quinta-feira que respeita os protestos como um exercício democrático mas condena aqueles que têm usado "métodos incorretos e violência". Mas ele deixou clara a sua intenção de permanecer no poder.
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