O presidente Vladimir Putin afirmou que está suspendendo sua participação no acordo que limita o arsenal nuclear estratégico da Rússia e dos Estados Unidos em 1.550 ogivas de pronto emprego. Ele fez na manhã desta terça-feira (21) seu mais importante discurso desde 2021. Em tom populista, anunciou uma série de reformas para tornar a economia e a sociedade russa mais fechada e militarizada.
O New Start é o último acordo entre Washington e Moscou para reduzir o arsenal nuclear global. O controle do número de ogivas nucleares ativas colocadas em mísseis intercontinentais, submarinos e aviões bombardeiros, visa reduzir a possibilidade de que Rússia e Estados Unidos travem uma guerra nuclear.
Ou seja, esse número específico de ogivas ativas torna impossível que um dos dois países lance um ataque nuclear decisivo sem sofrer uma retaliação também nuclear de grande escala. O objetivo é dissuadir as duas potências de lançar mão de armas nucleares estratégicas.
O presidente russo disse que não está cancelando o acordo, mas sim suspendendo a participação russa. Ele argumentou que não sabe o que a França e o Reino Unido estão produzindo, e acusou os Estados Unidos de estarem desenvolvendo armas nucleares de novos tipos. Na prática, Moscou já vinha impedindo inspeções de instalações militares que estavam previstas no acordo.
Na prática, a suspensão do acordo eleva o risco de guerra nuclear em meio a um ambiente geopolítico de competição entre os Estados Unidos e seus aliados de um lado e Rússia e China de outro - que vem sendo apelidado de Guerra Fria 2.0.
Moscou quer conquistar mais territórios na Ucrânia
Putin também deu a entender que a Rússia pretende conquistar mais território da Ucrânia em breve. Ele justificou a decisão com base na ajuda militar e financeira que os países da Otan (aliança militar ocidental) estão enviando para a Ucrânia.
"Quanto mais armas de longa distância chegam [à Ucrânia], mais teremos que afastar a ameaça das nossas fronteiras”, disse Putin.
O discurso de “Estado da Nação” é realizado anualmente, mas não tem uma data fixa. Ele aconteceria em dezembro do ano passado, mas foi cancelado devido a diversas derrotas em batalha sofridas pela Rússia desde setembro do ano passado. El foi reagendado para esta terça-feira, semana em que a guerra na Ucrânia completa um ano e período em que o Kremlin tem obtido vitórias limitadas no front leste ucraniano.
Putin faz interpretação distorcida da história
Putin falou por quase duas horas e culpou o Ocidente, especialmente os Estados Unidos, pela guerra na Ucrânia. A distorção dos fatos foi prontamente classificada como “absurda” pelo conselheiro de Segurança Nacional do presidente Joe Biden, nos Estados Unidos. Putin disse que trilhões de dólares estão e jogo e que os EUA estariam lucrando. O líder russo disse também que Washington está tentando destruir o sistema de relações internacionais estabelecido após o fim da Segunda Guerra.
Visando seu público interno, o presidente russo fez alegações falsas de que a Ucrânia seria governada por um regime neonazista. Ele afirmou que os cidadãos da Ucrânia seriam reféns desse regime e que a Rússia quer libertá-los. Nesse ponto, ele não se referiu ao país vizinho pelo nome de Ucrânia, mas sim de “Nova Rússia”, em uma referência histórica distorcida da relação entre as duas nações.
Ele também citou sua interpretação pessoal da história de que a Ucrânia teria começado a ser separada da Rússia pela Polônia e pelo império Austro-Hungaro, no século 19. Essa visão já havia surgido em um artigo de Putin datado de 2021 e posteriormente usado para tentar legitimar a guerra contra a Ucrânia.
Economia deve ficar mais fechada e voltada para a guerra
Entre os anúncios feitos por Putin também estão um sistema de seguridade social para famílias que perderam homens na guerra e um sistema de financiamento habitacional para quem se juntar ao serviço militar. Ele também disse que as Forças Armadas russas passarão por um profunda reestruturação com base nas lições aprendidas na guerra da Ucrânia.
Também houve o anúncio de programas para investimentos em infraestrutura de transporte, incentivos a pequenas e médias empresas, por meio de juros mais baixos, e isenção de impostos para investimentos em inteligência artificial.
O presidente russo também disse que a Rússia errou ao adotar o modelo econômico ocidental liberal após o fim da União Soviética nos anos de 1990. Putin afirmou ainda que avançará nas medidas para facilitar o comércio global por meio de moedas nacionais, sem a dependência do dólar.
Ele arrancou aplausos da plateia ao dizer que os negócios da Rússia não devem ser dependentes de países não amigáveis. Apesar do país ter absorvido o impacto econômico de diversas sanções ocidentais deflagradas pela guerra, a falta de acesso a componentes tecnológicos tem feito a ciência na Rússia definhar.
O presidente russo também anunciou uma reformulação do sistema educacional do país. Ele passará a ser direcionado principalmente à formação técnica, como uma tentativa de desenvolver internamente tecnologias modernas que até então a Rússia importava do Ocidente.
Em paralelo, Putin também quer reformular a cultura do país para consolidar sua própria visão da história. Segundo analistas, Putin defende uma Rússia imperialista que tentaria reaver hoje território e poder perdidos no século passado. Essas ações de mudança cultural devem ser concentradas especialmente na região ocupada de Donbas, na Ucrânia.
O discurso na Assembleia Federal russa ocorreu um dia após o presidente americano Joe Biden fazer uma visita surpresa à capital ucraniana. O gesto visava assegurar o apoio ocidental ao país, mas foi interpretado pela Rússia como uma forma de tentar eclipsar o discurso de Putin. Biden deve discursar ainda nesta terça-feira na Polônia.
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