Na última quarta-feira (10), entrou em vigor na União Europeia a proibição das importações de carvão da Rússia, medida que integra o quinto pacote de sanções do bloco contra Moscou devido à invasão da Ucrânia, ocorrida em fevereiro.
Embora a UE propagandeie que o veto representará uma perda de cerca de 8 bilhões de euros por ano aos russos, os 27 países do bloco também sofrerão com a medida. A Rússia respondia por cerca de 45% das importações de carvão da UE (Alemanha, Polônia e Holanda eram os maiores compradores), segundo números da Comissão Europeia.
O carvão representa um desafio em especial para a UE porque, além do nível de consumo do combustível que os países do bloco já tinham antes da guerra na Ucrânia, também é visto como uma alternativa para as reduções e eventual interrupção total de fornecimento de gás pela Rússia.
O Parlamento da Alemanha, país que planejava eliminar a utilização do carvão até 2030, aprovou em julho a reativação de usinas a carvão que estavam sem uso.
Kerstin Andreae, presidente da Associação Alemã de Indústrias de Energia e Água, disse à emissora pública ARD que as chamadas usinas de reserva que utilizam lignito (que tem cerca de 70% de carbono) poderiam ser colocadas em funcionamento em “um período de tempo relativamente curto” com produção de minas do leste da Alemanha, mas as que usam carvão para geração de eletricidade precisariam de importações.
Segundo reportagem da DW, a Alemanha fechou sua última mina de carvão em 2018 e desde então importava da Rússia metade do seu consumo do combustível. A Associação de Importadores de Carvão estimou em junho que o carvão russo poderia ser completamente substituído “em poucos meses” por fornecedores como Estados Unidos, Colômbia e África do Sul.
Segundo dados do serviço de análise de mercados de commodities DBX, no primeiro semestre de 2022 a Austrália foi o maior exportador de carvão térmico e coque para portos da Holanda (que tem dois dos cinco maiores terminais portuários da Europa, Roterdã e Amsterdã), com 8,9 milhões de toneladas até junho, mais do que as 7,7 milhões de toneladas da Rússia no mesmo período.
O volume vendido pelos australianos já se aproxima do total que o país da Oceania exportou para portos da Holanda em todo o ano passado, 7,7 milhões de toneladas, ano em que os russos exportaram mais de 13 milhões de toneladas desses produtos para terminais holandeses.
No primeiro semestre, volumes expressivos dos Estados Unidos e da Colômbia também chegaram aos portos holandeses, indicando a perspectiva de uma substituição dos produtos da Rússia.
Na Polônia, onde o uso de carvão russo era mais barato devido aos custos para extrair o produto polonês (localizado em grandes profundezas), não há perspectiva de uma produção própria expressiva tão cedo, e por isso o país busca aumentar importações da Colômbia, Austrália, África do Sul e Indonésia.
O think tank polonês Forum Energii apontou que a Polônia consome 87% de todo o carvão utilizado em residências na UE, e por isso o governo planeja oferecer subsídios e usar suas estatais carboníferas para cofinanciar o produto para famílias carentes.
Entretanto, com maior demanda por carvão, o receio é de mais inflação – o preço do produto já sofre forte alta, salientou Eduardo Fayet, professor de relações institucionais e governamentais na Universidade Presbiteriana Mackenzie.
“O preço da tonelada aumentou de US$ 40 para em torno de US$ 400. Além da busca de alternativas, como Colômbia, que tem nas exportações de carvão 13% do seu PIB, Austrália e Estados Unidos, aumentou também a produção do lignito”, descreveu Fayet. “E está havendo um adiamento do fechamento das usinas à base de carvão por uma questão de segurança energética, alguns países tinham metas de até 2023, 2025, e isso está sendo revisto.”
“Entre as fontes energéticas, o carvão é a última opção. Os países estão se mexendo nessa diversificação do fornecimento, fazendo estoque de insumos. Como o fornecimento de gás natural pela Rússia está sendo também impactado, os países estão tendo que reestruturar os seus estoques também com base em carvão”, disse Fayet – dessa forma, a participação do carvão na matriz energética da UE, hoje em torno de 5%, deve aumentar.
“Agora, haverá uma piora nas emissões de carbono, exatamente pela utilização do carvão, então em 2022 provavelmente teremos novo recorde, mas as perspectivas de mais longo prazo são melhores porque a Europa acelerou o processo de conversão para energias renováveis”, explicou Fayet.
“A Europa soltou um plano para reduzir a zero a dependência energética da Rússia e lançou um programa para 17 projetos estratégicos de energia renovável, tecnologia e inovação, pelo Fundo de Inovações europeu, em várias áreas, como hidrogênio verde, energias eólica, solar e geotérmica”, destacou.
Até que essas estratégias deem resultados significativos, entretanto, a União Europeia terá alguns (longos) invernos pela frente.