O mundo reagiu com cautela às notícias de que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, enfrentaria um processo de impeachment.
A presidente da Câmara dos Representantes dos EUA, a democrata Nancy Pelosi, iniciou uma investigação de impeachment contra Trump na terça-feira (24), depois que o republicano reconheceu que instou o presidente da Ucrânia,Volodymyr Zelenskyy, a investigar o ex-vice-presidente Joe Biden, candidato à indicação presidencial democrata para 2020.
Com os EUA passando por um momento de muita divisão partidária e as relações do governo Trump com aliados e adversários atoladas em desconfiança, especialistas dizem que o processo de impeachment teria um impacto imediato mínimo em todo o mundo.
O presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, não demonstrou preocupação. Ao comentar a abertura do processo de impeachment com jornalistas em Nova York, o brasileiro disse que Trump "será reeleito no ano que vem".
Ainda assim, os acontecimentos pesaram nos mercados financeiros, já atingidos por preocupações sobre a fraqueza econômica global e o impacto da disputa comercial EUA-China. As ações caíram na Ásia e na Europa, mas o dólar recuperou perdas anteriores.
Veja como analistas ao redor do mundo avaliaram o mais recente tiroteio político dos EUA, que Trump ridicularizou como uma "caça às bruxas" e "assédio" pelos democratas da Câmara.
China
Os processos de impeachment provavelmente levarão muito tempo, portanto terão muito pouco impacto, se houver, nas negociações comerciais com a China, disse Yao Xinchao, professor de comércio da Universidade de Negócios Internacionais e Economia de Pequim.
"As chances de Trump ser impugnado até o final de 2019 são muito pequenas", disse Yao. "É claro que Trump ser reeleito diminuiria ainda mais as perspectivas para as relações China-EUA. Isso reforçaria sua convicção de que adotar uma linha dura contra a China compensa e permitiria que ele rejeitasse seus poucos receios de tomar decisões irresponsáveis".
Ainda assim, Pequim quer um fim rápido da guerra comercial e não gostaria de um período prolongado de incerteza, disse ele.
Mas a China agradeceria qualquer esforço para derrubar Trump, disse Wu Qiang, um cientista político que foi forçado a renunciar da Universidade de Tsinghua por causa de sua posição crítica ao governo.
"Xi quer Trump fora e tem tentado conseguir isso através de muita propaganda, intervenção política intermediada e até secreta", disse Wu, referindo-se ao presidente chinês Xi Jinping e à frustração com a disputa comercial.
"Dito isto, não acho que um presidente democrata ou outras alternativas trariam mudanças radicais na política chinesa em relação a Washington. O vento se voltou contra Pequim e permanecerá assim por muito mais tempo", acrescentou Wu.
O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Geng Shuang, se recusou a responder às notícias do impeachment, dizendo a repórteres que era "um assunto interno para os Estados Unidos".
Alemanha e França
Depois de mais de dois anos, muitos europeus se cansaram de falar em impeachment de Trump, mesmo que possam apoiá-lo.
Apesar dos riscos para os democratas e dos desafios que qualquer ação de impeachment enfrentaria no Senado, o jornal conservador Frankfurter Allgemeine Zeitung argumentou que a decisão de anunciar uma investigação era necessária. "O que significaria para a democracia se a maioria na Câmara dos Deputados se abstivesse de tentar agir?" escreveu o antigo correspondente dos EUA, Andreas Ross.
Havia um ceticismo generalizado sobre a probabilidade de sucesso de uma investigação de impeachment. "Certamente é muito cedo para se despedir", comentou a revista alemã Der Spiegel em seu site.
Na França, o tom da cobertura representou principalmente a incerteza dos procedimentos nesta fase inicial. "Os Estados Unidos estão envolvidos no desconhecido", escreveu o proeminente diário francês Le Monde sobre o inquérito de impeachment.
Na Europa continental, poucos sentiriam falta de Trump como presidente. "Todos os partidos, exceto o AfD (de extrema-direita), ficariam felizes se a presidência de Trump terminasse", disse Stephan Bierling, professor de política internacional da Universidade de Regensburg, na Alemanha. "Quanto mais rápido, melhor".
Mas Bierling também reconheceu que algumas das razões da posição acolhedora da Europa continental em relação a possíveis processos de impeachment eram discutíveis. Algumas das críticas de Trump à Europa - incluindo seus ataques à Alemanha por seus baixos gastos com defesa - foram apoiadas por analistas. Os líderes alemães podem esperar que, depois de Trump, se torne mais fácil "se esquivar novamente", disse Bierling.