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Eleições

Quando as urnas perdem para o impasse

Curitiba – As contestações de resultados de eleições têm sido uma prática comum nos últimos tempos. México e Itália, por exemplo, enfrentaram recentemente fortes críticas internas sobre a contagem manual de votos e seus respectivos sistemas eleitorais. Em geral, em meio a disputas apertadíssimas é normal que o perdedor do pleito questione a contagem de votos. Em casos extremos, quem acaba sendo colocada em jogo é a democracia, além da possibilidade de dar espaço a impasses políticos. Os motivos que levam a esses revezes eleitorais, segundo os especialistas, vão desde a falta de tradição democrática, a reação do candidato diante de uma perda por estreita margem de votos e ainda o sistema de contagem manual, que dependendo do modo como for operado abre brecha à dúvidas.

Em eleições muito disputadas é natural que o perdedor conteste o resultado final, sendo um ato recorrente na democracia, inclusive nas consolidadas, como foi o recente caso na Itália (veja quadro), considera Emerson Cervi, doutorando em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj) e professor da UniBrasil. "Com concorrência acirrada é normal haver queixas, mas isso não necessariamente aponta falhas nos sistemas eleitorais. Em alguns casos, as contestações de resultados eleitorais não têm haver com regras e sim como a cultura local." O modo como se opera é que fica sob suspeita e não o sistema eleitoral em si, argumenta Cervi.

O grau de polarização e competitividade em uma eleição é um fator que propicia a contestação de resultados independente do sistema eleitoral, analisa Luís Gustavo Grohmann, do Núcleo de Estudos Legislativos, da Universidade Federal de Santa Maria. Se além da disputa acirrada não houver aceitação das regras eleitorais por parte dos atores políticos, o problema se agrava, diz. "Quando as regras são aceitas até fraudes são admitidas. Nenhuma força contesta a lei. Como foram as eleições nos EUA em 2000 e 2004, com casos de irregularidades nos estados da Flórida e Ohio, respectivamente."

No México, a amostragem preliminar é um prato cheio para problemas, diz o especialista. "Se a primeira contagem fosse mais lenta poderia ser mais correta e certeira." O que fica claro é que enquanto os EUA sacrificam a representação em benefício da estabilidade, o México faz valer a representação em detrimento da estabilidade, explica Grohmann.

Manual x eletrônica

Para Marcos Figueiredo, professor do Iuperj, a disputa acirrada e o processo de contagem manual dão margem à fraude e a dúvidas. "A experiência brasileira com o sistema de urnas eletrônicas mostra que caiu drasticamente o número de contestações de resultados. É um sistema mais seguro." No caso da contagem manual, qualquer descuido ou falha humana na soma dos votos pode provocar erros, diz.

As eleições presidenciais dos EUA em 2000 só foram resolvidas depois de uma decisão controversa da Suprema Corte dando a vitória a Bush, lembra Figueiredo. "A Flórida que foi o estado onde mais houve contestação de resultado e lá se adota o sistema de contagem manual."

René Ariel Dotti, jurista e professor de Direito Processual Penal da Universidade Federal do Paraná, atribui à contagem manual dos votos a dificuldade em conter possíveis dúvidas sobre o resultado do pleito. "A passagem manual dos dados para atas e depois para mapas pode causar questionamentos futuros. O ideal é o aprimoramento do uso das urnas eletrônicas e que mais países passem a adotá-las."

Já Grohmann considera que uso da urna eletrônica não garante que o pleito será justo em todos os países. "Mas no caso brasileiro, não temos polarização aguda na condução das campanhas e a urna eletrônica trouxe mais rapidez e controle no processo eleitoral. Além disso, temos um setor judiciário especializado na área, o que garante a aceitação do resultado. A força institucional ganha mais peso."

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