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Abrigos temporários são construídos para os descendentes de japoneses moradores de Pomona | Clem AlbersDepartment of the Interior. War Relocation Authority
Abrigos temporários são construídos para os descendentes de japoneses moradores de Pomona| Foto: Clem AlbersDepartment of the Interior. War Relocation Authority

Em agosto de 1942 – 75 anos atrás – as forças armadas dos EUA retiraram moradores de Pomona, Califórnia, a leste do centro de Los Angeles (L.A.).

Durante 16 dias, soldados fizeram mulheres, homens e crianças inocentes passarem por arames farpados e baionetas, forçando-os a embarcar em um trem da Southern Pacific para uma viagem ao noroeste de Wyoming, onde eles foram presos novamente. Quando o último trem saiu da estação, mais de cinco mil nipo-americanos desapareceram na Califórnia. 

Então, décadas depois, eles desapareceram de novo, apagados da memória dos seus vizinhos. Eu sei disso porque cresci em Los Angeles e sofri dessa amnésia histórica. Apesar de ter vivido a uma curta distância de Pomona, eu não fazia ideia que esse era um dos cinco locais principais em que nipo-americanos foram presos em L.A. durante a Segunda Guerra Mundial. 

Quando eu pensava em Pomona, achava que era a localização da L.A. County Fair (Feira do Condado de Los Angeles). Os outros lugares tinham associações similares: Santa Anita era uma pista de corrida; San Pedro era um ponto litorâneo; Griffith Park abrigava o zoológico de L.A.; e eu nunca havia ouvido falar em Tuna Canyon. Mas em 1942, o governo dos EUA usou esses cinco locais para prender nipo-americanos. Locais de detenção similares se espalhavam pela costa oeste americana, permitindo que o governo removesse nipo-americanos das suas vizinhanças com rapidez e eficiência. 

Em 1942, nipo-americanos desapareceram das suas vizinhanças; depois, com o passar de décadas, eles desapareceram da memória dos seus vizinhos. Ambos os desaparecimentos foram escolhas: americanos comuns, apoiados pelo poder do governo dos EUA, decidiram apagar essas pessoas das suas vizinhanças e esses eventos das suas memórias. 

Esse apagamento nos relembra que aquilo que nós lembramos da história não é uma coincidência, não permanece simplesmente nas nossas memórias. Pelo contrário, é uma série de escolhas: porque os eventos que fundamentam a história não mudam, mas as partes da história que escolhemos lembrar mudam. 

Apagamentos

Acima de tudo, esses apagamentos são um exercício de poder. Quando os nipo-americanos desapareceram, foi uma política dos EUA para fazê-los desaparecer, e os primeiros desaparecidos foram homens nascidos no Japão. Depois de Pearl Harbor, agentes do FBI tiraram famílias nipo-americanas das suas camas no meio da noite e prenderam milhares de homens adultos sem cidadania americana como “estrangeiros inimigos”, encarcerando-os em Griffith Park, San Pedro ou Tuna Canyon. Kiku Hori Funabiki, nascido nos EUA, relembra.

“Naquele momento, quando eu olhei desamparado o meu pai ser levado algemado por três agentes federais, eu ganhei uma ferida muito profunda que nunca foi curada... Eu era americano ou não?” 

A partir de março de 1942, outros nipo-americanos começaram a desaparecer da costa oeste dos EUA, forçados a ir para “Centros de Reunião”, como os de Pomona e Santa Anita. É assustador ver os mapas que os militares fizeram para planejar a sua limpeza, transformando bairros em áreas de “exclusão”.

Em 9 de maio de 1942, por exemplo, a Ordem de Exclusão Nº 55 determinou que 1.150 nipo-americanos fechassem os seus negócios, trancassem as suas casas e desaparecessem, tudo em uma semana. Juntamente com os residentes de seis outras áreas de exclusão, eles foram forçados a um campo de concentração temporário construído pouco tempo antes na localização da feira do condado de L.A.: o Centro de Reunião de Pomona. 

Prisão

O Centro de Reunião de Pomona era uma cidade real: 300 barracões de papel e madeira rodeados de lanchonetes, centros médicos, templos religiosos e até mesmo um centro esportivo. E também era uma prisão. As luzes dos guardas seguiam os presos até o banheiro durante a noite. Toques de recolher e censura restringiam as liberdades básicas. E uma torre de vigilância e uma cerca de arame farpado criavam uma fronteira, separando os nipo-americanos do resto da América. 

Em agosto de 1942, depois de quase três meses de muito calor e tédio, os moradores do Centro de Reunião de Pomona ficaram sabendo que desapareceriam novamente – para Heart Mountain, no estado de Wyoming. Eles se juntaram a uma migração forçada maior, que transferiu nipo-americanos de 15 Centros de Reunião temporários e 10 campos de prisão permanente.

Com isso, o exército planejou o desaparecimento quase completo dos nipo-americanos da costa oeste dos EUA até o final de 1942, um exílio forçado que durou até o final da guerra, em 1945. (E continuou após a guerra: muitos nipo-americanos não foram bem recebidos de volta para casa e foram forçados a tentar um recomeço em outro lugar.) 

Lado obscuro

Então, em 2016, eu os vi desaparecerem de novo – dessa vez, quando comecei a lecionar na Cal Poly Pomona University, no condado de L.A. Para marcar o 75º aniversário da prisão de nipo-americanos, eu comecei a trabalhar com colegas para conectar o nosso campus a esse ponto local de injustiça. Mas eu descobri rapidamente que o Centro de Reunião de Pomona havia desaparecido da memória de muitos estudantes, professores e funcionários. 

Como pudemos apagar algo tão permanente? Eu encontrei uma explicação em um conjunto de fotos armazenadas na Biblioteca do Congresso, reunidas originalmente pelo exército para ilustrar um relatório oficial dos Centros de Reunião em 1943. 

O “Sumário Ilustrado” do relatório com 149 fotos contém cenas de grupos de escoteiros e times de basquete, servindo como prova visual do tratamento digno do exército aos presos. Apesar de quatro dessas fotos publicadas serem de Pomona, mais de vinte outras imagens de Pomona foram guardadas pelo exército mas não foram publicadas, escondendo-as do público. 

Algumas das fotos não publicadas provavelmente foram separadas porque não eram dignas de nota, mas muitas outras fotos contam uma história que o governo não quis divulgar. Essas fotos continham legendas que diziam “NÃO UTILIZAR PARA REPUBLICAÇÃO” – prova de que foram confiscadas pelo governo por mostrar o lado mais obscuro do programa de encarceramento. 

As fotos foram tiradas por um fotógrafo do governo em um dos dias de “Êxodo” em agosto de 1942, quando um grupo de presos foi levado de Pomona para o Wyoming. E apesar das cenas pareceram calmas – talvez até mesmo animadas, às vezes, quando se leva em conta a presença de alguns sorrisos – arames farpados dividem as fotos em duas. 

Censores sabiam que as fotos da vida atrás de arames farpados eram perigosas: o que os outros americanos pensariam se eles mesmos vissem o que a moradora de Pomona, Shizuko Horiuchi, viu todos os dias? “A vida aqui não pode ser explicada”, ela escreveu do Centro em maio de 1942. “Às vezes nos resignamos, mas quando vemos as cercas de arame farpado e a torre de vigilância com seus holofotes, nos dá uma sensação de que somos prisioneiros em um ‘campo de concentração’”. 

Seria fácil culpar os censores do governo pelo fato de os meus estudantes, meus colegas e eu nos lembrarmos de tão pouco de Pomona, mas isso tira a nossa responsabilidade muito facilmente. O desaparecimento de mais de cinco mil pessoas não foi escondido. Aconteceu à vista de todos. 

As pessoas se reuniram nas ruas de L.A. para assistir os seus vizinhos nipo-americanos serem sequestrados para Pomona. Trabalhadores da construção civil construíram o campo, arame farpado por arame farpado. Amigos, membros do clero e até mesmo ativistas de direitos trabalhistas visitaram Pomona e viram a prisão. Em cidades entre a Califórnia e o Wyoming, pessoas viram os presos a cada parada de trem. Todo mundo viu eles desapareceram; a maioria optou por não ver as provas de injustiça na sua frente. 

Sem escolha

Escolher o que você vê – ou imaginar que você não enxerga o que está vendo – é um privilégio de poder. Os presos e suas famílias não tiveram essa escolha; eles foram obrigados a ver o mundo através do arame farpado que emoldurava a sua remoção de mais um lar. Mas muitos outros americanos tiveram a escolha de reconhecer a injustiça praticada contra os nipo-americanos ou ignorá-la. 

Hoje enfrentamos essa escolha novamente quando falamos sobre o passado da América. As histórias que contamos sobre a América são criadas por escolhas: o que honramos ou ignoramos, o que lembramos ou esquecemos. Certamente, quando contamos histórias sobre quem somos hoje, escrevemos a nossa história através dessas escolhas. 

O passado pode ser imutável, mas como nós olhamos para o passado não é. Então neste ano, quando marcamos o 75º aniversário do apagamento de 15 Centros de Reunião, de Puyallup a Pomona, e no esforçamos para reconhecer as injustiças ao nosso redor, podemos nos lembrar: você faz cinco mil pessoas desapareceram quando escolhe não ver o que está na sua frente.

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