Curitiba Mais de 100 mil monges budistas levaram ao ápice nesta semana uma onda de protestos pacíficos contra a junta militar que comanda Mianmar, na Ásia, há mais de 20 anos. O estopim foi uma medida tomada pelo regime há um mês ao dobrar o preço dos combustíveis em um país que figura na lista dos 20 mais pobres do mundo. Para se ter uma idéia do nível de pobreza, mais de 90% da população vive com apenas US$ 1 por dia.
Como o governo mantém o monopólio sobre a venda de combustíveis, o óleo diesel aumentou em 100% e o gás natural em 500%. A população sentiu os reflexos na hora de comprar frango, ovos e óleo de cozinha. Esses produtos aumentaram em média 35%.Mas monges e civis não se uniram apenas para pedir a redução de preços, as reivindicações vão além num país governado sob rígidas regras do regime militar. A população de Mianmar pede pela abertura de negociações entre o governo e a Liga Nacional pela Democracia, da líder democrática e Prêmio Nobel Aung San Suu Kyi que é mantida em prisão domiciliar (leia mais no quadro ao lado). Os protestos também pediam por sua libertação e o fim dos 45 anos de ditadura.
Os milhares de monges reunidos pelas ruas da capital Yangun, em seus trajes cor açafrão, ganharam a atenção da comunidade internacional. Não só a atenção, mas também preocupação. Entre quinta e sexta-feira pelo menos dez pessoas foram mortas nas manifestações ao ser reprimidas por forças militares. Estima-se que mil pessoas foram detidas.
Na sexta, militares teriam invadido monastérios budistas e cortado o acesso à internet. Em Mianmar, são mais de 400 mil monges budistas, um grupo influente no país.
Sanções
Os Estados Unidos anunciaram embargo econômico contra Mianmar e vários países europeus contestaram a repressão no país. Nos próximos dias, o Conselho de Direitos Humanos da ONU deve realizar uma sessão de urgência para discutir a onda de protestos e violência em Mianmar.
Para alguns analistas este episódio pode ser apenas o início de um movimento pró-democracia que pode se expandir para outras regiões asiáticas, que vivem um impasse "parecido", como Sri Lanka, Tibete e outros. A professora de geopolítica do curso pré-vestibular Positivo, Luciana Worms, considera esse cenário possível no longo prazo.
"Mianmar mantém a ditadura porque ainda conta com respaldo da China. O momento parece ideal para uma queda do regime, já que os Estados Unidos poderiam usá-la como bandeira pacifista, desviando as atenções sobre a Guerra no Iraque", disse.
Leonardo Arquimimo de Carvalho, professor da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, considera que as sanções impostas por EUA ou até mesmo países europeus teriam pouco impacto, uma vez que Mianmar faz parte do eixo de influência da China."Em algumas regiões da Ásia é difícil para o Ocidente definir uma postura política."
Especialistas dizem que a China não teria interesse, nesse momento, em ver um "banho de sangue" em Mianmar diante da proximidade dos Jogos Olímpicos de Pequim, em 2008.
Arquimimo lembra que a China possui uma relação de "imperialismo tardio de periferia" desde os anos 40 e sua capacidade de influência sobre os vizinhos vai além das vias diplomáticas.