O que acontece no país
A sequência de eventos que desembocou nos conflitos violentos de ontem.
Mubarak renuncia - Na sequência dos movimentos da Primavera Árabe, iniciada na Tunísia em dezembro de 2010, o presidente egípcio Hosni Mubarak renuncia em fevereiro de 2011, após três décadas no poder.
Mursi no poder - Uma junta militar assume o poder e, em junho de 2012, o islamita Mohamed Mursi, com apoio da poderosa Irmandade Muçulmana, é eleito presidente.
Crise - Em julho deste ano, o regime é novamente alvo de protestos por parte da população que quer menos influência religiosa no governo.
Mursi cai - É deposto pelas Forças Armadas e preso, acusado de envolvimento em atos violentos durante a revolta contra Mubarak e de aliança ilegal com o grupo palestino Hamas.
Prisões - Vários dirigentes da Irmandade Muçulmana também são presos. A comunidade internacional critica o golpe.
Manifestações - Simpatizantes da Irmandade, que não reconhece o governo interino, e de Mursi iniciam manifestações e montam acampamentos nas praças Rabaa al-Adawiya e Nahda, no Cairo. Irmandade Muçulmana recusa convite para participar de governo de transição.
Ontem - De madrugada, com o apoio de tratores, tropas policiais e militares começam a tirar as pessoas dos dois acampamentos. Confrontos se espalham pelo país e deixam centenas de mortos, segundo o governo.
Fonte: Folhapress
Renúncia
Conflitos levam ElBaradei a deixar a Vice-Presidência
O ganhador do Prêmio Nobel da Paz Mohamed ElBaradei apresentou ontem sua renúncia ao cargo de vice-presidente do Egito. A saída de um dos líderes da retirada do presidente Mohamed Mursi, em julho, acontece após a violência durante a operação que desmontou acampamentos de islamitas.
A Irmandade Muçulmana, à qual Mursi era ligado, chamou a ação de golpe e se recusou a negociar com as Forças Armadas, que montaram um governo interino, com a participação e respaldo de ElBaradei.
Em carta-renúncia enviada ao presidente interino, Adly Mansur, ElBaradei disse que "os beneficiários do que aconteceu hoje [ontem] são aqueles que pedem por violência, terrorismo e os grupos mais extremistas. Como você sabe, eu acreditava que havia maneiras pacíficas de encerrar este confronto na sociedade, havia soluções propostas e aceitáveis que nos levariam ao consenso nacional", escreveu.
"Ficou difícil para mim continuar a ter responsabilidade por decisões com as quais não concordo e cujas consequências eu temo. Não posso carregar a responsabilidade por um derramamento de sangue", disse ElBaradei.
Líder
ElBaradei assumiu o cargo em 14 de julho, após convite do chefe militar Abdel Fattah al-Sisi. Um dos principais líderes da Frente de Salvação Nacional, foi opositor do presidente Mohamed Mursi. Ele ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 2005, por seu período como chefe da Agência Internacional de Energia Atômica.
Folhapress
Testemunhas contam que a movimentação de soldados e policiais na capital egípcia começou em silêncio, ainda na madrugada de ontem. Por volta das 7 h (1 h de Brasília), as forças de segurança do governo partiram para o desmonte violento de dois acampamentos de partidários do presidente deposto Mohamed Mursi e da Irmandade Muçulmana provocando o que os islamitas chamaram de massacre.
Soldados do Exército se encarregaram de cercar os alvos enquanto grupos de policiais, uniformizados e à paisana, davam início à operação com bombas de gás lacrimogêneo. Rapidamente, sob as nuvens de fumaça tóxica, gritaria e corre-corre, ouviram-se disparos de rifles automáticos e pistolas. Em todo o país, os números oficiais falam em pelo menos 278 mortos entre eles, 43 policiais e 1.400 feridos.
"Helicópteros sobrevoavam e tratores destruíam a parede e as janelas. Polícia e soldados jogaram bombas de gás nas crianças. Continuaram atirando mesmo quando imploramos para que parassem", disse o professor Saleh Abdulaziz, de 39 anos, exibindo um ferimento na cabeça.
Abdulaziz era uma das centenas de islamitas que protestavam pela restituição do presidente Mohamed Mursi ao poder no acampamento erguido há seis semanas junto à mesquita Rabaa al-Adawiya, transformada em epicentro da luta contra o golpe militar no bairro de Cidade Nasser. Atiradores posicionados em prédios vizinhos abriam fogo contra quem tentava escapar e contra os que ousavam atirar pedras contra os invasores.
Feridos eram atendidos no chão, ao lado de cadáveres que eram enfileirados para serem recolhidos. Homens, mulheres e crianças choravam sobre corpos ensanguentados.
Há seis semanas, milhares de simpatizantes de Mursi, contrariando as ordens do governo para deixar os protestos, transformaram Cidade Nasser numa espécie de campo de refugiados. Famílias passavam dias e noites por ali, em barracas que tinham luz, tevê e até pequenas lojas. Ontem, não havia eletricidade, apesar do intenso calor.
"Eles atiraram na cabeça dos manifestantes", disse o médico Mohamed Taha, voluntário no hospital, que afirmou ter visto rostos inteiros desfigurados por balas.
Homens armados com bastões e capacetes atiravam pedras contra policiais e armavam barricadas e fogueiras com pneus. A fumaça preta e espessa era vista à distância. Nas ruas, voluntários distribuíam máscaras cirúrgicas e esguichavam vinagre e refrigerante nos rostos de pedestres para aliviar os efeitos de gás lacrimogêneo. Lojas fecharam, e os moradores, que há semanas expressavam oposição ao protesto, assistiam pelas sacadas. O chefe das Forças Armadas, general Abdel Fattah al-Sissi, era chamado de traidor.
Mortos
O cinegrafista Mick Deane, 61 anos, da emissora britânica SkyNews, e a jornalista Habiba Ahmed Abd Elaziz, 26 anos, da emissora Gulf News, morreram nos conflitos do Egito ontem. O repórter egípcio Ahmed Abdel Gawad, do jornal estatal Al Akhbar, também foi morto perto da Mesquita Rabaa al-Adawiya.
Interior
Os incidentes graves ocorreram no interior do Egito: ao menos três igrejas foram incendiadas por ativistas islamitas em Sohag, Fayoum e Minya. Os prédios foram atacados com bombas caseiras. A União da Juventude de Maspero, grupo que luta pelos direitos dos cristãos coptas no Egito 10% da população acusa a Irmandade Muçulmana de promover uma retaliação contra essa comunidade minoritária.